Mtg Lore

Compêndio da Lore de Magic the Gathering

PREPARAÇÃO

“Não existe uma luta justa.”

A artífice estivera trabalhando por trinta horas sem parar, e estava exausta. Este não era o maior período que ficara trabalhando direto em um projeto, nem a metade disso. Mas esses projetos tinham sido movidos pela musa, por amor, ou por inspiração. Esses tinham sido trabalhos prazerosos. O júbilo preenchia a alma em tempos como aqueles. Não havia júbilo neste trabalho. Uma dúzia de relógios diferentes de tamanhos variados marcavam as horas, fazendo a contagem regressiva para sua execução.

Ela não tinha o poder necessário para um feitiço como esse, então teria que trapacear. O primeiro passo era o círculo de amplificação: cinco pés de diâmetro, filigrana de prata gravada em mármore negro e fresco. Mais de seiscentas runas singulares no círculo externo, depois sete círculos rúnicos menores, perfeitamente concêntricos, detalhando precisamente a hora, localização e nível de energia do feitiço que teria o círculo como alvo. Ele tinha que ser perfeito. Se funcionasse, permitiria que ela realizasse uma façanha mágica que mesmo seu mentor teria hesitado em tentar. Caso contrário, o feitiço falharia em uma de infinitas formas espetaculares possíveis. Quase nenhuma dessas formas envolvia ela escapar.

Um pequeno constructo insetiforme trouxe-lhe um novo cinzel, novas placas de prata entalhada, e um copo de água gelada. Ela pegou um lenço, secou suas mãos e sua testa, e afastou de seus olhos um cacho de cabelo castanho avermelhado. Ela tinha sete horas antes de ter que estar de volta em sua cela, mas não estava nem perto de terminar.

A artífice encarou o círculo de magia. Ela apertou os olhos. Eles estavam queimando, secos de tanto trabalharem com detalhes e sem nem de longe um tempo suficiente de sono. Ela não via erros, mas valia a pena verificar uma segunda vez. E uma terceira. Ela assentiu com satisfação antes de voltar à sua bancada.

Lá jazia uma pequena esfera de cristal com uma luz laranja rodopiando em seu interior. Ela respirou fundo e pegou-a muito cuidadosamente. Com passos lentos e deliberados, ela passou sobre o círculo de magia e a abaixou muito devagar. A esfera fez um leve som de “tink” quando ela a soltou, e a artífice estremeceu… um longo segundo se passou, e ela expirou lentamente. Ela se afastou da esfera e secou a testa novamente. Com um sorriso travesso, pegou um pedaço de papel de sua mesa, rabiscou uma rápida nota nele, e então o colocou ao lado da esfera. Duas etapas prontas. Agora a parte difícil.

Canalizar esse tanto de energia dói. O aposento foi preenchido com uma luz azul sobrenatural – a artífice tinha conjurado um domo mágico e opaco de força, quase tão alto quanto ela, e que cobria completamente o círculo de magia. Seu rosto estava paralisado em uma careta de dor, seus dentes rangendo com o esforço, enquanto ela colocava tudo o que tinha na criação de uma barreira perfeita. A artífice não tinha nenhum atalho para essa parte do feitiço; ela simplesmente despejou no domo tudo o que havia em sua mente e em seu coração e em sua alma, e não segurou absolutamente nada. Ela queria parar. Ela precisava parar. Mas a parte dela que tinha sido forjada em aço por décadas de trabalho incansável sabia algo mais – ela sabia que precisava manter o feitiço por mais alguns poucos segundos. Segundos que escoavam como horas. Que se arrastavam como dias. Agora ela estava gritando, mas não podia ouvir a si mesma.

O feitiço terminou com uma explosão. Ela fez a artífice voar para o outro lado do aposento, passando por cima de sua bancada bagunçada e acabando esmagada contra uma estante de livros. Incontáveis geringonças e projetos pela metade despencaram, dúzias de béqueres se partiram e maços de papel foram lançados ao ar. O círculo de magia, e tudo o que ele continha, tinha sido completamente aniquilado pelo dispositivo.

Conforme os papéis rodopiavam até o chão, o aposento foi preenchido com o eco de uma jovem mulher, caída de costas, ferida e dolorida, rindo a plenos pulmões.

A artífice foi acordada pela sacudida de um de seus companheiros de viagem – um mercador que tinha sido capturado com ela uma semana antes. Diferentemente dela, ele não tinha a sorte de ser capaz de transportar a si mesmo para um lugar seguro. Então, quando ela descobriu que aqueles bárbaros planejavam matá-la e a seus companheiros como parte de algum ritual louco de solstício, ela considerou brevemente se teleportar para longe e deixar os outros à própria sorte. Brevemente. Mas então ela soube que teria permissão para lutar, campeão contra campeão, como parte da cerimônia. Isso parecia divertido, já abandonar essas pobres pessoas para a morte, não.

Um homem coberto com pinturas rituais e vestindo peles, com braços tão grossos quanto a cintura da artífice, olhava fixamente para ela do outro lado das barras da cela. Ele sabia que ela era uma maga, mas ela tinha tido o cuidado de não conjurar nenhum feitiço que pudesse chamar a atenção durante seu suposto “cativeiro”. Ela havia se transportado para seu laboratório com certa liberdade à noite, mas, se eles tinham notado, não deram sinal disso.

O homem grunhiu, abriu a porta da cela e fez um gesto para que a artífice o seguisse. O acampamento estava claramente preparado para um dia de celebração. Todas as tendas rústicas tinham algum tipo de faixa ou outra decoração, e um círculo de barricadas fora montado para a luta. Se ela não soubesse que o motivo disso tudo era um combate ritual sangrento, seguido por uma série de sacrifícios humanos para um deus-sol, teria achado a arrumação bastante festiva. O sol estava brilhante em um céu perfeitamente limpo. Ela não poderia ter desejado um dia mais belo. A artífice foi guiada até uma baia no canto da arena. O guarda grunhiu e fez um gesto para que ela esperasse. Ela esperou.

A tribo começou a se reunir ao redor da arena, e o campeão bárbaro já estava sendo preparado pelo xamã da tribo e seus acólitos. Mesmo do outro lado do campo, a artífice podia sentir o imenso poder que eles estavam manipulando. Seja aprendido na academia ou em uma cabana de barro fedorenta, poder era poder. Muitos da academia pensavam que quando se vincula o poder a um livro, ganha-se o monopólio sobre ele. Poucos deles sobreviveram para lamentar essa linha de pensamento.

A multidão reunida começou a aclamar o nome de seu campeão, um jovem guerreiro que parecia no auge de sua vida – alto, esguio, musculoso e sem cicatrizes, com uma densa cabeleira negra em uma trança solta nas costas.

“GRELL! GRELL! GRELL! GRELL!”

Os xamãs concluíram seu ritual e ergueram os braços pedindo silêncio. Foi um tanto alarmante quão rápido a tribo ficou perfeitamente quieta. Para os ouvidos da artífice, o xamã soou como qualquer outro pregador charlatão – uma voz crescente e profunda com uma ponta de ameaça em seu tom para manter a multidão na linha.

“OUÇAM-ME! Nós, os filhos da luz que nos aquece, nós, os filhos das planícies do verão! Nós damos graças ao mais grandioso, o maior dos dias, quando aquele que arde no alto é o mais poderoso de todos!”

Um rugido ergueu-se da multidão, dada a deixa, e rapidamente foi silenciado.

“Em sua honra, nós oferecemos uma mostra de nossa força! Em sua honra, nós oferecemos uma mostra de nossa devoção! Em sua honra, nós oferecemos o sangue de nossos inimigos!”

Outro grito da multidão.

“Nós demos ao nosso campeão todas as bênçãos do sol! Nós demos a ele todo o nosso poder!”

Nesse momento, dois homens entraram na arena, um com o que parecia ser um pequeno tronco de árvore, e o outro com um balde de metal.

“Neste dia, nossa força pode resistir a qualquer golpe!” O homem com o tronco de árvore balançou-o como um porrete e ele partiu-se em pedaços quando atingiu Grell. A multidão rugiu.

“Neste dia, nossa vontade pode resistir a qualquer chama!” O homem com o balde jogou seu conteúdo sobre Grell – óleo – que irrompeu em chamas. Grell manteve-se parado, coberto pelo fogo, incólume. A multidão arfou, e então gritou com admirada aprovação.

“Filho da tribo, enquanto a luz do dia mais longo brilhar sobre sua pele, você é INVENCÍVEL!”

A artífice engoliu em seco. Ela tinha se preparado para tudo isso, pesquisou sobre tudo assim que entendeu o que fora planejado para os cativos, mas enfrentar um inimigo invencível era perturbador, apesar de suas precauções. O xamã virou seus olhos para ela.

“Você, desafiadora das terras distantes. Me disseram que você é uma grande guerreira entre seu povo!”

Uma risada percorreu a multidão.

“Eu consigo lutar,” ela disse.

“E uma grande maga também! Isso é o que seus companheiros falam de você! Você é uma grande maga, campeã?”

“Nem de longe tão grande quanto alguns.” Havia uma nota de tristeza em sua voz.

“E você voluntariamente coloca os destinos dos forasteiros sob sua proteção? Seu destino deverá ser o mesmo deles?”

“Vamos acabar logo com isso.”

Uma variedade de armas foi trazida à frente para que ela escolhesse. Ela pegou uma pequena adaga do suporte e caminhou para o meio da arena. A Grell foi dado um par de pequenos machados de pedra. Tambores rufaram e a multidão os acompanhou.

Grell exibia um sorriso maníaco. A artífice não tinha ideia de quanta energia estava sendo canalizada pelo homem, mas era muita, e provavelmente ele estava se sentindo ótimo. Com um gesto bem praticado, ela lançou duas bolas de fogo em sua direção e, em uma chuva de brasas, elas banharam seu peito. Ele saiu ileso, é claro. Grell ergueu seus braços em triunfo para a multidão. A artífice rangeu os dentes.

Ela correu na direção dele, a adaga em uma posição reversa. Lançou um golpe contra seu rosto, e Grell pulou para trás. O instinto de se esquivar do caminho da lâmina ainda estava lá, mesmo que ele soubesse que ela não poderia machucá-lo. Ele pulou na direção dela, com movimentos meticulosos e poderosos dos machados, mas a artífice rolou habilmente para fora do caminho.

Enquanto ela rolava pela poeira, pegou um pequeno objeto de seu cinto. Quando ele se lançou contra ela novamente, a artífice jogou o objeto nele – um constructo minúsculo, em forma de formiga, com um reservatório em seu abdômen contendo um brilhante líquido ciano. Ele ganhou vida e prendeu-se na tanga de Grell sem ser notado, fornecendo um ponto de ancoragem para o próximo feitiço da artífice.

Ela conseguiu se esquivar do ataque seguinte de Grell, mas na volta seu antebraço enorme a atingiu no tórax – sua força ergueu-a do chão. Ela atingiu o solo com força, e ergueu-se em um joelho. Grell levantou novamente os braços em triunfo, recebendo a adulação da multidão antes de dar seu golpe fatal, e então a artífice sussurrou a palavra de poder que desencadeou toda a magia que havia preparado.

“Vamos ver se funcionou.”

Houve um leve estalo, e Grell desapareceu.

Grell piscou. O ar era frio aqui, e tinha o sabor errado. Ele viu-se preso dentro de um domo mágico e opaco de força, cintilando com espirais azuis de energia arcana. No chão estava uma pequena esfera reluzente e uma nota escrita à mão. Ele socou a barreira com os punhos, mas ela absorveu seus golpes sem emitir um único som. A esfera reluzente tornou-se mais brilhante, e a luz laranja dentro dela parecia cada vez mais… instável. Ela passou a emitir um som agudo e começou a tremer. Inquieto, ele olhou para a nota.

O solstício é amanhã. Eu venci.
-Jhoira

Jhoira de Ghitu - Arte de Kev Walker

Traduzido por Alysteran

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