Mtg Lore

Compêndio da Lore de Magic the Gathering

ORIGEM DE KAITO: UM TESTE DE LEALDADE & O CAMINHO A SEGUIR

UM TESTE DE LEALDADE

A rua estava cheia de kamis esta noite. O Festival das Lanternas era o favorito de muitos espíritos amantes da noite habitantes de Towashi. Em qualquer outro dia, Kaito teria apreciado a camuflagem extra. Parte do seu trabalho exigia a habilidade de se mover pelas ruas sem ser visto — e hordas de kamis eram a solução ideal, mas ele estava ficando sem tempo. Se ele não terminasse o trabalho logo, perderia o pagamento para outro Vingador¹.
Arte de Nils Hamm

Não demorou muito para Kaito encontrar seu alvo. Os apostadores eram notoriamente ruins em guardar segredos, e este tinha um histórico de dívidas e amizades azedas. Se Kaito se movesse cedo demais, arriscaria assustá-lo. Em uma noite como essa, com muita gente e uma abundância de fogos de artifício, havia mil lugares para um estranho se esconder.

Um grupo de crianças passou correndo por Kaito com velas de faísca na mão, gritando de alegria. Ele se assustou com o som.

Fazia apenas um ano desde que a Imperatriz havia desaparecido. Doze meses desde que Kaito expulsou o misterioso estranho do templo de Kyodai.

O resto de Kamigawa pode ter prosseguido normalmente, mas quando Kaito viu as lanternas vermelhas brilhantes do festival flutuando no céu, os espetos de bolinhos de arroz embebidos em calda em todas as barracas de rua e o Kami da Festança Exultante brilhando nos telhados em toda a sua glória cintilante, ele não sentiu um pingo de alegria. Só conseguia pensar em sua amiga.

Kaito guardaria sua comemoração para o dia em que a Imperatriz voltasse para casa.

Ele passou por baixo do dossel de sombrinhas de neon que mantinha os vendedores ambulantes abrigados, onde um trio de kamis elétricos brigava perto de um dos aquecedores externos vacilantes. O menor dos três espíritos saltou, e as esferas de metal flutuantes ao redor de seu corpo de estilo industrial brilharam com irritação. Kaito ergueu a mão para proteger os olhos da luz brilhante, piscando várias vezes antes que os kamis se espalhassem pela rua para encontrar outra fonte de energia. Quando sua visão se reajustou, ele estava quase certo de que havia perdido o alvo de vista completamente.

E ele provavelmente teria se não fosse pelo casaco espalhafatoso do homem.

As bordas brilhavam em um amarelo fluorescente, e o resto era estampado com koi holográfico brilhante. Foi uma escolha ousada para um homem que devia dinheiro a Satoru Umezawa.

Mas havia algo nos festivais que induzia as pessoas a baixar a guarda.

Silenciosamente, Kaito se aproximou do homem vestido de amarelo, observando enquanto ele se sentava em uma das finas cadeiras de madeira do lado de fora de uma barraca de curry. Ele se inclinou sobre a mesa, falando em palavras apressadas e soltas para uma mulher com sujeira de farinha na testa e gotas de curry espalhadas no avental.

Os Vingadores Hyozan não querem testemunhas. Kaito precisava ter cuidado.

Ele deslizou entre os clientes que se aproximavam, movendo-se como se não fosse mais do que um fio de fumaça nas sombras. Ele caminhou atrás do homem sem parar, e em um movimento fluido de sua mão, Kaito enfiou a mão no casaco do homem e pegou sua carteira.

O homem não sentiu nada. Kaito se certificou.

Seguindo a multidão em movimento até a beira do mercado, Kaito se distanciou do local. Quando teve certeza de que não tinha sido seguido, Kaito parou na esquina, abriu a carteira e contou as notas translúcidas dentro.

A maioria das pessoas em Kamigawa era mais feliz usando chips de crédito presos ao pulso, mas qualquer pessoa com uma propensão para o jogo não seria tola o suficiente para usar tecnologia vestível. Aqueles que frequentavam os antros de cartas de Towashi tinham um ditado: só arrisque o que você está disposto a perder. Para evitar a tentação de arriscar tudo, os apostadores preferiam dinheiro físico a fichas de crédito.

Felizmente para Kaito, ele adquiriu algumas novas habilidades ao longo dos anos — bater carteiras sendo uma delas.

Ele folheou as notas, contando uma segunda vez só para ter certeza antes de tirar um tablet em miniatura do bolso. Um dia, ele esperava poder comprar tecnologia que não requeria usar as mãos, como as lentes de retina que ele viu alguns dos outros Vingadores usarem, mas por enquanto, a comunicação desatualizada teria que ser suficiente.

O dispositivo escaneou seus olhos e um holograma embaçado se materializou. Kaito acenou com o dedo, percorrendo os detalhes de cada listagem ativa, até que uma imagem pixelizada do rosto do apostador apareceu. Abaixo estava o nome do homem, quanto dinheiro ele devia a Satoru e dicas sobre onde ele poderia estar escondido.

Kaito digitou uma mensagem codificada no dispositivo e clicou em enviar. A lista do alvo passou de azul para vermelho antes de desaparecer. No espaço que deixou para trás estava a palavra “Concluído”.

Do outro lado de Kamigawa, os Vingadores Hyozan receberam o mesmo alerta.

Eles saberiam que Kaito conseguiu outro trabalho e que ele estaria a caminho da toca de Satoru no Submundo para receber a recompensa.

Kaito enfiou o aparelho de volta no bolso, o som dos tambores do festival e fogos de artifício ecoando atrás dele. Era verdade que ele não estava pronto para comemorar — mas isso não significava que ele não estava com fome. Kaito tirou algumas notas extras da carteira do apostador, caminhou até a barraca mais próxima e comprou o maior espeto de bolinho que encontrou. Enquanto se dirigia para a estação de trem, shoyu escorrendo pela mão, Kaito concluiu que, embora trabalhar para Satoru não fosse sua primeira escolha, ser um Vingador tinha suas vantagens.

O Submundo era sombreado por arranha-céus e cerejeiras vibrantes que não conseguiam mascarar o fedor dos esgotos a céu aberto nas proximidades. Kaito estava fazendo trabalhos para os Vingadores Hyozan por quase um ano. Ele se acostumou com as piores partes do ventre de Towashi. Ele até se acostumou com as pessoas, e elas eram muito piores do que qualquer coisa que saísse do esgoto.

Kaito levantou seu pulso até a porta com painéis, e uma luz vermelha escaneou o cartão-chave vestível. A segurança era moderada em comparação com o Palácio Imperial, mas ninguém com bom senso jamais tentaria invadir o território dos Vingadores. Um sistema de segurança era apenas uma formalidade.

A porta se abriu, e Kaito seguiu uma escada de metal até um amplo saguão onde mesas de carteado cobriam a sala e um balcão de neon na parede dos fundos. Os Vingadores estavam empoleirados em cadeiras e em pé nas portas, a maioria de seus rostos parcialmente escondidos por máscaras elaboradamente decoradas com dentes e chifres afiados. Tatuagens coloridas eram visíveis em seus braços. Alguns dos subalternos tinham apenas uma ou duas, mas os superiores tinham tatuagens que se estendiam dos pulsos até os ombros.

Para a maioria dos Vingadores, a tatuagem de lealdade foi a primeira. Se eles traíssem Satoru, a marca de iniciação comeria sua carne, eventualmente levando a uma morte lenta e dolorosa. Kaito não era o subalterno mais jovem entre eles, mas estar à beira dos dezesseis anos o tornava jovem o suficiente para evitar a iniciação.

Ele tentou não pensar em quanto tempo isso iria durar.

Não que Kaito pretendesse ser desleal. Afinal, Satoru lhe dera um emprego, sem falar em um lugar para morar e comida para comer. Se não fosse pelos Hyozan, Kaito ainda estaria vagando por Towashi, sobrevivendo das poucas moedas que ele conseguia pegar nas sarjetas, e talvez mais alguns dos bolsos de estranhos desavisados.

Mas Kaito não se juntou aos Vingadores Hyozan pelo dinheiro. A extensa rede da gangue dava a eles acesso a todas as informações criminais que existiam. Se alguém iria saber sobre um homem com um braço de metal, seriam os espiões de Satoru.

Se isso significasse encontrar o agressor da Imperatriz, Kaito teria uma tatuagem de lealdade e permaneceria no Submundo pelo tempo que fosse necessário. Era um pequeno preço a pagar para trazer sua amiga para casa.

Uma figura corpulenta vestindo uma armadura insetílica esculpida estava no caminho de Kaito, sobrancelhas grossas como lagartas. Ele bufou, respiração azeda e olhos vermelhos. “Você roubou meu alvo.”

Kaito olhou para a katana do homem, suas bordas brilhando em um vermelho impiedoso. A maioria das armas dos Vingadores era cheia de venenos e aprimoramentos ilegais. Tudo que Kaito tinha era uma faca fina que era mais adequada para cortar frutas do que para tirar sangue, mas da última vez que ele foi ao arsenal, a faca era tudo que ele podia pagar. Kaito nunca foi de fugir do confronto, mas ele não podia negar que estavam em desigualdade. Então, ele lutou com suas palavras e esperou que não lhe custasse um nariz quebrado.

“Se um nome está na lista, é jogo justo,” Kaito respondeu friamente. “Não é minha culpa que você foi muito lento para chegar lá antes.”

O Vingador assobiou por entre os dentes tortos. “O apostador só foi marcado como um alvo esta manhã. Como você conseguiu encontrá-lo tão rapidamente?”

“Era um festival,” Kaito comentou. “As pessoas vão onde a comida está.”

“Eu diria que você teve sorte, mas você nem tem sangue nas mãos.” Ele estreitou os olhos. “Se você está ganhando tempo — tentando manter o resto de nós longe dele, só para conseguir uma recompensa…”

Com a sugestão, alguns dos outros Vingadores ergueram os olhos da mesa de jogo próxima. Uma era uma mulher musculosa com luvas de metal até os cotovelos, cada dedo apontado e uma agulha afiada. Kaito já tinha visto o trabalho dela antes, um golpe de sua mão aplicaria um tipo especial de veneno que fazia flores venenosas brotarem das feridas de uma pessoa.

“Eu sei sobre o código,” Kaito disse, e se certificou de que os outros pudessem ouvi-lo também. “E eu não preciso mentir para ganhar um dia de pagamento ou atingir um alvo apenas para me sentir importante.” Ele encolheu os ombros. “A lista dizia que ele devia dinheiro, então eu peguei o dinheiro.”

“Você é arrogante para um subalterno, e muito barriga-mole para um Vingador.” O homem inclinou a cabeça acusadoramente. “Misericórdia é para os imperiais.”

“Não foi misericórdia,” Kaito retrucou. “Só não vejo sentido em perder tempo fazendo alguém sangrar quando há muitos outros trabalhos que eu poderia estar fazendo. Não somos pagos por hora.”

“Não,” a mulher com os dedos de metal entrou na conversa, uma sugestão de tatuagem aparecendo ao longo de sua clavícula. “Mas com certeza é divertido fazê-los implorar.”

Os outros riram em resposta, e o som passou direto pelo núcleo de Kaito como uma adaga gelada. Ele sabia que se não tomasse cuidado, algum dia poderia encontrar o mesmo tipo de adaga em suas costas.

Uma mulher alta com cabelo preto apareceu, e o riso cessou. Kaito sentiu o calafrio penetrar em seus ossos, enchendo-o de uma sensação de vazio. Fios de fumaça preta a rodeavam como serpentes fantasmas. Ao contrário daqueles que canalizam a magia kami através do respeito mútuo, essa mulher adotou uma abordagem diferente para canalizar. Ela permitiu que Azamaki, o Kami da Traição Encarnada, a possuísse, e mais de uma vez. Ela acreditava que isso lhe dava alucinações proféticas e visões do que viria a ser.

Tudo que Kaito podia ver era a cor cinza moribunda de sua pele, e a forma como o preto de seus olhos se derramava sobre o branco, como se o kami não tivesse apenas emprestado uma parte dela, mas sim consumido sua própria alma.

“Satoru deseja falar com você,” ela disse em uma voz oca, apontando a mão em direção a uma das salas dos fundos.

Arte de Anna Pavleeva

Kaito a seguiu sem dizer uma palavra, feliz por deixar os outros para trás, mas sentiu seus nervos saltarem à vida em sua pele. Era raro Satoru convocar alguém. Quando o fazia, as pessoas que entravam em seu escritório geralmente saíam com um dedo a menos, ou vários dentes faltando, se é que saíam vivos.

Kaito sentiu o peso da carteira do estranho. Satoru sabia que ele havia pegado parte do dinheiro para comprar espetos de bolinho de massa? Kaito havia contado o dinheiro várias vezes. Havia mais que o suficiente para cobrir a dívida do alvo. O que Kaito pegou foi extra — não poderia ser visto como um roubo de Satoru.

Ou poderia?

A mulher abriu a porta e Kaito entrou desajeitadamente, os olhos se arregalando quando viu Satoru sentado atrás de sua mesa, tatuagens brilhantes subindo até os lóbulos de suas orelhas. Seu cabelo preto estava preso em um coque apertado e uma expressão áspera cobria todo o seu rosto. A armadura de metal estava presa estrategicamente em seu peito e braços, mas havia aberturas nas regiões dos ombros e do estômago que mostravam marcas coloridas. Uma máscara de gás pendia de seu pescoço, verde neon com redemoinhos azuis pintados, fazendo com que parecesse as mandíbulas de um monstro.

Satoru não fez sinal para Kaito se sentar. Ele não disse uma palavra. Ele simplesmente olhou de uma forma que fez os joelhos de Kaito vacilarem.

“Eu posso explicar,” Kaito disse rapidamente. “Eu sabia que estaria trazendo um lucro sobre dívida para você. E eu estava seguindo o cara desde à tarde, então quando eu senti o cheiro do shoyu-“

Satoru levantou a mão para interromper, e Kaito fechou a boca.

Quando o líder dos Vingadores Hyozan ainda não havia falado, Kaito tirou a carteira do bolso e colocou-a cuidadosamente sobre a mesa entre eles.

Os olhos de Satoru caíram antes de gesticular para a canalizadora. Ela pegou a carteira e se afastou para contar o conteúdo. Depois de um momento, ela simplesmente assentiu.

Satoru pressionou os cotovelos na mesa e juntou as mãos, se curvando. “Estou impressionado com quão bem você consegue achar seus alvos. É a terceira vez nessa semana que você tirou um nome da lista no mesmo dia em que ele apareceu.”

Kaito engoliu em seco, cerrando os punhos como se estivesse protegendo os dedos.

“No entanto,” Satoru disse. “Embora sua eficiência seja digna de elogios, não tenho certeza se você entendeu o que significa deixar uma mensagem.”

A garganta de Kaito queimou. Ele precisava desse emprego, ele precisava estar em algum lugar onde pudesse ajudar a Imperatriz. Ele não podia permitir que Satoru duvidasse dele.

“Há Vingadores que podem enviar uma mensagem, mas eles não limpam tantos nomes de suas listas quanto eu.” Kaito sabia que estava sendo muito ousado, mas era tudo o que podia fazer para esconder as falhas em sua voz. “Eu sou o melhor subalterno que você tem.”

“No entanto, você não tem marca de lealdade.” Satoru apontou para a pele nua de Kaito e depois para a grande tela contra a parede. Os feeds de vigilância do saguão apareciam em retângulos. Ele os estava observando o tempo todo. “Parece que não sou o único que se pergunta se você tem estômago para este trabalho.”

“Estou aqui porque quero.”

“Sim.” Satoru fez uma pausa. “Você morava em Eiganjo antes de vir para nós. Eu vi samurais imperiais deixarem o palácio para um tipo diferente de vida, e de vez em quando, um deles acaba aqui. Mas eles saem porque enxergam um sistema quebrado.” Seus olhos escureceram. “Você não me parece alguém que se preocupa muito com sistemas.”

A memória de sua infância fez as bochechas de Kaito queimarem. Ele ainda se sentia culpado — não por deixar o palácio, mas por deixar Eiko para trás. Não que ela o tivesse seguido além da muralha. Seu coração pertencia ao palácio e tudo o que ele representava.

O coração de Kaito não pertencia a nada realmente. Pelo menos nada que pudesse ser facilmente explicado.

Kaito se endireitou. “Eu fugi porque sabia que as coisas que eu queria da vida não eram coisas que eu iria encontrar em Eiganjo.”

“E o que você quer?”

Kaio deu de ombros. “Dinheiro. Uma espada melhor.” Descobrir o que aconteceu com a Imperatriz e trazê-la para casa.

Com isso, Satoru riu, sobrancelha ainda franzida. “Eu tenho um trabalho para você,” ele disse. “Um que não está na lista.”

“Um trabalho?” Kaito piscou com alívio. Talvez ele conseguiria manter seus dedos, no fim das contas.

Satoru recostou-se na cadeira. “Há um cidadão-da-lua em Otawara — um prodígio futurista, como eles o chamam — que está prototipando uma maneira de conectar tecnologia e kami. Sua pesquisa seria vendida por um preço alto no mercado negro. E é apenas uma questão de tempo antes que nossos rivais ouçam sobre isso e tenham a mesma ideia.” Ele inclinou a cabeça, estudando Kaito cuidadosamente antes de abaixar o queixo. “Eu quero que você me traga os esquemas.”

O pagamento seria bom — negócios no mercado negro sempre foram — mas também seria uma forma de provar sua lealdade a Satoru. Sem ter que deixar nenhuma mensagem.

Kaito deu um aceno curto. “Considere feito.”

“Vou enviar-lhe os detalhes através do seu comunicador.” Satoru acenou com a mão. “Pode sair.”

Kaito saiu da sala, ignorando a forma como a canalizadora o observava com olhos negros e avaliadores, e assim que ele estava na rua sob as sombras de um arranha-céu, ele pegou seu tablet bem a tempo de ver a mensagem privada piscar em sua holotela.

Havia apenas uma foto e um nome.

Tameshi.

Otawara não era como a superfície. Muitos dos prédios eram cobertos de metal e vidro, refletindo o Plano como se estivesse iluminando com um holofote a cada movimento repentino. Havia drones de vigilância em todos os lugares e enormes mechas de origami que rondavam as bordas da cidade flutuante.

Depois que a imperatriz desapareceu, os imperiais culparam os futuristas pelo ataque. Kaito se perguntou se as defesas levantadas pelos futuristas eram uma resposta às acusações ou se seus sistemas de segurança eram menos sobre proteção e mais sobre esconder o que estava acontecendo em seus laboratórios.

Não era segredo que os futuristas gostavam de ultrapassar os limites da tecnologia. Mas talvez eles já tivessem ultrapassado a linha — talvez já tivessem saltado sobre ela completamente.

Kaito estaria mentindo se dissesse que o pensamento não despertou seu interesse.

Quando Kaito finalmente conseguiu rastrear informações sobre o paradeiro de Tameshi, ele descobriu que os cidadãos-da-lua não estavam mais em Otawara. Ele mudou sua pesquisa para o Distrito de Boseiju — a floresta cheia de kamis e lar da Ordem de Jukai.

Seguir um alvo e invadir laboratórios era uma coisa, mas irritar os kamis? Os de Boseiju estavam lá para fugir do resto de Towashi. Eles mal toleravam a Ordem de Jukai. Era parte da razão pela qual Eiganjo treinou tantos diplomatas kami para tentar manter a paz entre os reinos mortal e espiritual.

A floresta não seria território amigo. Não sem alguém para mediar. Então, ele entrou em contato com a única pessoa que poderia ajudá-lo e defender seu caso.

Kaito caminhou sob o arco nos arredores de Boseiju. Pilares de pedra esculpidos nas formas de kami antigos estavam empoleirados em todo o jardim de musgo, suas bocas bem abertas com espaço suficiente para deixar uma oferenda. Alguns deles continham frutas, enquanto outros continham animais de origami rabiscados com mensagens para os espíritos que ainda não haviam entrado no reino mortal. Atrás do templo havia um amplo portão fundido, as cores brilhando ao redor com tons metálicos.

A maioria das pessoas sabia que não devia chegar muito perto. Ninguém sabia exatamente o que aconteceria se um mortal tentasse atravessar o vazio. Mas os kamis ocasionalmente passavam pelos portões, e enquanto os imperiais os construíram para manter as travessias seguras, a Ordem de Jukai construiu os templos para garantir que os kamis se sentissem bem-vindos. Eles acreditavam que os espíritos eram uma parte sagrada da natureza que deveria ser reverenciada.

Kaito nunca viu sentido em tratar os kamis como se fossem deuses. Havia algo em ver um kami tomando banho de sol em um monte de lama que os tornava menos… etéreos.

O som de passos soou próximo, e Kaito levantou a cabeça para encontrar sua irmã parada a vários metros de distância.

Seus ombros relaxaram. “Eiko. Você veio.”

Ela cortou o cabelo desde a última vez que ele a viu. Foi cortado curto e severo, fazendo-a parecer mais velha. A forma como seus lábios estavam franzidos e seus olhos se estreitaram, ela estava estranhamente parecida com uma raposa. Como uma versão humana de Patas-Leves, Kaito pensou, a boca se curvando levemente ao notar a semelhança.

Eiko cruzou os braços. “Não fique tão feliz. Se eu for ajudá-lo, vai ter regras.”

Kaito ergueu as mãos inocentemente. “Eu não teria assumido nada menos.”

“Primeiro de tudo, não estou aqui para roubar nada. Estou aqui para proteger os kamis de quem quer que seja esse Tameshi. Porque se ele está fazendo as coisas que você diz — conectando tecnologia e kami — então ele está infringindo a lei imperial e ameaçando o equilíbrio de ambos os reinos. E caso sua avaliação seja tão ruim quanto eu me lembro, absolutamente sem armas. Não podemos fazer os kamis daqui se sentirem ameaçados de forma alguma.

“Ótimo discurso,” Kaito gorjeou. “Mas se eu precisasse de um companheiro de batalha, eu teria pedido a alguém do Submundo. Você está aqui porque eu preciso de um Imperial para me guiar pela floresta sob o pretexto de diplomacia.”

“Você sabe que eu ainda não sou oficialmente uma diplomata kami, certo?” Eiko pontuou. “Eu não terminei meu treinamento.”

“A Ordem dos Jukai não precisa saber disso. E com alguma sorte, nem os veremos. Você está aqui apenas para garantir que os kamis não nos ataquem ao longo da fronteira da floresta.”

“Não,” Eiko rebateu. “Eu estou aqui para acabar com o seu amigo.”

“Ele é um alvo, não um amigo.”

Houve um momento de silêncio, e quando Eiko falou novamente, sua voz suavizou. “Por que você está fazendo isso, Kaito? Se se juntar aos Vingadores Hyozan é a sua maneira de se vingar de Patas-Leves por não acreditar em você, então—”

“Não é,” Kaito interveio.

A expressão de Eiko se estilhaçou. “Então por que você está trabalhando para criminosos?”

“Estou fazendo isso pela imperatriz,” Kaito respondeu, a voz firme. “Já ouvi rumores de uma organização secreta não alinhada com os futuristas nem com os vingadores. O palácio não me deu ouvidos sobre o homem com o braço de metal, mas eu sei o que vi, e se ele aparecer em Kamigawa, os vingadores saberão.” Ele balançou a cabeça. “Satoru já está questionando minha lealdade. Se eu não conseguir o que ele quer, voltarei para onde estava quando deixei o palácio, sem pistas e ninguém disposto a ajudar.”

Com isso, Eiko não disse nada.

A mandíbula de Kaito ficou tensa. “Tudo que eu preciso é a pesquisa de Tameshi. Depois que eu levar os esquemas para Satoru e garantir meu lugar com os vingadores, você pode dizer aos Imperiais o que quiser.”

Eiko ficou com seus pensamentos por um tempo, a tensão crescendo principalmente em seus ombros. “Tudo bem,” ela disse ao final.

Kaito tentou não parecer muito grato caso ela mudasse de ideia. Ele acenou com a cabeça em direção às árvores. “Devemos ir enquanto ainda há luz. Prefiro evitar encontrar a Kami das Tumbas Vazias no meio da noite.” Ele sorriu como se fosse uma oferta de paz. “Especialmente porque seu plano é entrar desarmada.”

“Ah, eu a conheci. Ela é bastante educada,” observou Eiko, endireitando as braçadeiras de metal ao redor de seus antebraços. “Se eu fosse você, estaria mais preocupado com a Kami das Clareiras Esquecidas. Ela é famosamente territorialista.”

Kaito teve o bom senso de não rir, mesmo quando os olhos de Eiko brilharam com humor, e ele seguiu sua irmã pela floresta.

Eiko estava na frente do Kodama da Árvore do Oeste. Erguia-se sobre ela por quase dez metros, membros largos cobertos de casca e sua boca esticada com fios de seiva dourada. Uma dúzia de flores luminescentes circundava a cabeça do kami, e cascatas de galhos menores desciam por seus ombros como uma coroa de cabelo.
Arte de Daarken

Kaito tamborilava os dedos contra os braços, observando a conversa à distância. Ele não sabia exatamente o que sua irmã estava dizendo, ou o quanto a kami estava descontente ao ver invasores tão perto da fronteira da Floresta Jukai, mas depois de um tempo, Eiko fez uma reverência e voltou para o lado de Kaito.

“Ela diz que podemos passar com segurança, desde que não ultrapassemos o rio,” explicou Eiko cuidadosamente. Ela lançou um olhar por cima do ombro e baixou a voz. “Eu não mencionei Tameshi. Achei que poderia complicar as coisas se eles soubessem que havia uma ameaça na floresta.”

Kaito sorriu. “Mentindo para a kami? Patas-Leves aprovaria isso?”

Eiko fez uma careta. “Não me faça me arrepender disso.”

Caminharam por quase uma hora. Os olhos de Kaito vasculharam as árvores distantes em busca de sinais dos novos campos de pesquisa de Tameshi — terra aplainada, pegadas frescas, metal onde não deveria ter. Mas se Tameshi estava por perto, ele fez um trabalho completo para encobrir sua presença.

Kaito sentiu a rigidez de Eiko ao lado dele e se virou para ela. Seu queixo se projetava e sua boca estava pressionada em uma linha impenetrável. Era o mesmo olhar que ela tinha quando criança quando estava preocupada em ser repreendida, geralmente por causa dos erros de Kaito.

Ela não gostava de mentir para os kamis. Mas Kaito se perguntou se a possibilidade de decepcionar Patas-Leves também estava pesando em seus ombros. Ele não poderia culpá-la se estivesse, ele se lembrava muito bem da sensação. A única diferença era que Eiko queria deixar sua mentora orgulhosa, enquanto Kaito… ele queria que Patas-Leves se orgulhasse da pessoa que ele já era, e não do samurai que ela esperava que ele se tornasse.

O chão estremeceu sem aviso, e Kaito saltou para trás, agarrando uma adaga antes mesmo que seus olhos processassem a ameaça.

Não foi um ataque — apenas um kami de pedra em movimento lento se enterrando mais fundo na terra em busca de sombra.

Kaito relaxou, mas o olhar endurecido de Eiko fez suas bochechas queimarem.

“Eu pensei que havíamos concordado em não ter armas,” ela sussurrou.

Kaito deu de ombros envergonhado em resposta. “Eu mal chamaria isso de uma arma. É mais uma ferramenta de sobrevivência. Dependendo da sua perspectiva, você pode até chamar de um pequeno utensílio de cozinha.”

“Minha perspectiva é que você puxou uma lâmina na primeira vez que viu um kami se mover!” Eiko respondeu concisamente. Ela beliscou a ponta de seu nariz. “Isso é exatamente com o que eu estava preocupada.”

Kaito deslizou a adaga em seu cinto, não se preocupando mais em escondê-la em suas roupas. “Não é nada. Ninguém se machucou.”

“Você não entende o quanto isso é sério? Se você ameaçar o kami, você não está apenas colocando nós dois em perigo, você está colocando tudo pelo que trabalhei em perigo também.”

Kaito se eriçou. “Você não precisava vir.”

“Sim, eu precisava.”

“Não.” Kaito deu um passo mais perto. “Você poderia ter contado aos imperiais sobre Tameshi. Eles teriam enviado um samurai direto para cá, prendido ele e ter certeza de que sua pesquisa fosse destruída. Você conhecia os riscos, e ainda assim escolheu vir. E eu estou muito grato pela sua ajuda, mas você não pode simplesmente—”

“Eu não vim aqui para te ajudar,” Eiko confessou abruptamente.

Kaito se encolheu.

Ela cerrou os punhos. “Eu- eu não estou tentando ferir seus sentimentos. Mas isso não é apenas sobre parar a pesquisa de Tameshi. É para provar o que é a pesquisa dele.”

Kaito franziu a testa. “Do que você está falando?”

“Eu vi algo naquela noite também, Kaito. Na noite em que a Imperatriz desapareceu.”

Kaito sentiu como se toda a floresta tivesse se tornado um maremoto. Ele travou os joelhos, olhos grudados em sua irmã, e esperou que ela explicasse.

Eiko mordeu o lábio, tentando encontrar as palavras certas. “Quando os alarmes soaram, eu… eu tentei encontrar você. Eu estava no meio do jardim estudantil quando vi você correndo em direção ao templo de Kyodai. E foi quando vi algo no telhado.”

O coração de Kaito disparou. “Você viu o homem? Aquele que eu persegui?”

Ela balançou a cabeça. “Não era um homem — era uma luz. Estava brilhando como uma estrela, e então explodiu. Todo mundo estava tão ocupado olhando para a parede, mas eu estava procurando por você. E a luz — ela se transformou em um animal e desapareceu. Quando descobri que a imperatriz estava desaparecida, eu sabia que eles deviam estar conectados de alguma forma. Que talvez os Futuristas tivessem encontrado uma maneira de usar os kamis como armas.

Arte de Dominik Mayer

Kaito passou a mão pelo cabelo, frustrado. “Eu já lhe disse mil vezes — o que aconteceu não teve nada a ver com os Futuristas. Havia um homem no templo naquela noite. Um homem que estava na mesma sala onde a Imperatriz foi vista pela última vez. Ele é responsável pelo desaparecimento da imperatriz, não um animal brilhante.”

Ela estreitou os olhos. “Você disse que a pesquisa de Tameshi envolve a fusão de kamis com tecnologia. E se isso for exatamente o que eu vi no telhado?”

Kaito a encarou, o rosto se transformando em súbita compreensão. “Patas-Leves não acreditou em você.”

Eiko piscou.

“Ela não levou a sério o que você viu, da mesma forma que ela não acreditou em mim.” Kaito reconheceu a ardência em seus olhos. “É por isso que você veio — para provar a ela que você estava certa.”

“Você faz parecer infantil.”

Kaito bufou. “É infantil. E daí se ela não levou você a sério? Ela também não acreditou em mim. Mas pelo menos você teve a aprovação da Patas-Leves desde que éramos crianças.”

A expressão de Eiko vacilou, os olhos ficaram vidrados. “Kaito…”

Kaito desviou o olhar. “Você sempre foi a melhor de nós. Eu nunca esperei que Patas-Leves visse qualquer outra coisa. Mas eu estava no templo naquela noite implorando ao conselho para me ouvir, e nenhum deles o fez.” Ele engoliu o nó na garganta. “Talvez eles não tenham ouvido você na época, mas a diferença entre você e eu é que um dia eles te ouvirão.”

“Eu acredito no que você viu, sabe,” ela disse calmamente.

“Você acredita que ele era um Futurista.” Kaito ergueu os olhos. “E não foi isso que eu vi.”

Eiko assentiu. “Talvez a pesquisa de Tameshi prove que um de nós está certo.” Ela hesitou. “Você ainda pode voltar para casa. Não é tarde demais para continuar seu treinamento.”

“Essa não é a minha vida. Não mais. Mas você?” Kaito abriu um sorriso sincero. “Você vai ser ótima nisso.”

Eiko pegou a mão dele, apertou e voltou para o caminho. Às vezes, as palavras não ditas entre eles eram as mais altas de todas.

Além do próximo leito de rocha havia uma escada de pedra que contornava uma colina. Na cascata da crista havia uma pequena cachoeira, escorrendo sobre as bordas de musgo e formando uma poça abaixo. A terra escalonada criava níveis irregulares sob o rio, fazendo a clareira ecoar com o som da água correndo por todo o coração da floresta.

Kaito sabia que o melhor lugar para se esconder em Towashi era entre as maiores multidões. Talvez na Floresta Jukai, fosse perto das cachoeiras mais barulhentas.

Eiko estendeu a mão para impedir que Kaito se movesse. “Não podemos ir mais longe. Prometi ao Kodama da Árvore do Oeste.”

Kaito apontou para a névoa além das árvores. “Se Tameshi estiver aqui, ele estará perto do rio, onde é barulhento e ele pode esconder seus rastros.” Ele olhou para Eiko. “A única promessa que fiz foi à imperatriz — e não vou sair daqui sem a pesquisa.”

Ignorando as objeções de Eiko, Kaito andou cuidadosamente pelas pedras salientes no riacho, equilibrando-se com cuidado. Quando alcançou a margem lamacenta, ele se esforçou para se equilibrar antes de agarrar um punhado de vegetação espessa e subir a colina rochosa. Ele se virou para ver se sua irmã havia atravessado o rio — mas ela tinha ido embora.

Ele não tinha o direito de se sentir magoado. Ele quebrou a maioria de suas regras, e ambos tinham muito a perder se algo desse errado.

Mas a amargura de ser abandonado apertou seu coração. Talvez seja o que Eiko sentiu quando ele deixou Eiganjo.

Ele imaginou se isso os deixava quites.

Com sua irmã longe, seria apenas uma questão de tempo antes que ela reportasse aos Imperiais. Sentimentos não importavam — Kaito precisava encontrar Tameshi antes que alguém viesse procurá-lo.

Abaixando-se para escapar de um galho baixo, Kaito encontrou um caminho entre as colinas que levava a uma clareira. Ele pressionou um dedo no pulso e seu drone garça de metal ganhou vida, quebrando-se em fragmentos afiados antes de flutuar no ar. Kaito tocou sua têmpora e enviou o drone para o céu, apertando os olhos para a imagem distorcida que estremeceu através do feed da câmera. Ele foi pego em mais do que algumas brigas durante seu tempo com os Vingadores, e seu drone pagou o preço.

Não fazia sentido usar a tecnologia danificada para rastrear alguém na multidão movimentada de Towashi, mas Kaito estava procurando apenas uma pessoa na floresta. Não importa o quão embaçado o feed estivesse, era melhor do que nada.

A garça correu pela floresta, e Kaito seguiu atrás, ficando perto do rio. Quando ele viu metal em sua câmera, ele sabia que estava perto.

A água corrente em todas as direções mascarava completamente o barulho, mas era quase impossível não perceber o laboratório improvisado. Disposta ao lado de uma árvore derrubada havia uma coleção de máquinas estranhas, todas conectadas com fios e luz distorcida. A maior parte da pesquisa era composta de pedaços de metal, incluindo uma grande caixa de aço empoleirada na extremidade.

Kaito deu um passo à frente. A caixa sacudiu em resposta.

Não uma caixa — uma gaiola. E havia algo preso dentro.

Kaito ouviu o estalar de galhos sobre as cachoeiras, mas quando se virou, já era tarde demais. Tameshi tinha a vantagem, e ele usou isso para bater o punho contra a bochecha de Kaito.

Kaito tropeçou, dedos apertando rapidamente em sua adaga, e apontou a lâmina para o cidadão-da-lua. Tameshi tinha a pele lilás pálida e os cabelos presos em um nó alto. Seu corpo esguio e rosto liso denunciavam sua juventude. Ele não podia ser mais do que um ou dois anos mais velho que Kaito.

Tameshi ergueu uma sobrancelha, vestes azuis esvoaçando enquanto ele pairava no ar, e riu. “Eu não sabia que os monges de Jukai eram tão… primitivos.” Ele inclinou a cabeça. “Já vi facas melhores para escamar peixes.”

“Eu não estou com a ordem,” Kaito respondeu, estudando a linguagem corporal de Tameshi para achar uma fraqueza.

“Isso explica as roupas do Submundo. Vingador, eu presumo?” Ele fez uma pausa, calculando. “Eu sabia que a notícia da minha pesquisa acabaria sendo divulgada. Só estou surpreso que os Imperiais não tenham chegado aqui primeiro.”

“O que posso dizer? Fazer as pessoas me subestimarem é uma coisa minha.”

Tameshi acenou para a triste desculpa de arma de Kaito. “Você pode voltar quando estiver mais preparado. Eu odiaria que você passasse os próximos cinco minutos se envergonhando.”

Kaito abriu um sorriso. “Se eu facilitasse demais para você, não seria nada divertido.”

Tameshi deu de ombros. “À vontade.” Ele retirou uma pequena haste de seu cinto e pressionou-a firmemente em um painel em seu peito. Em um instante, a haste se expandiu, remodelando-se como dobras de origami, até se transformar em um bastão de metal com borda serrilhada. Tameshi o girou várias vezes em suas mãos.

“Ok, agora você está apenas se exibindo,” Kaito murmurou, encontrando o tom em sua voz. Ele tinha a sensação de que precisaria.

Tameshi atacou, varrendo seu cajado contra as pernas de Kaito. Kaito saltou, firmou-se e girou com sua adaga presa em seu punho. Tameshi bateu seu cajado novamente, e Kaito rolou para fora do caminho, cortando o ar. Ele não conseguia alcançar Tameshi — não com o cajado bloqueando todos os seus golpes. Ele mal conseguia alcançar suas vestes.

Mas Kaito havia treinado com os melhores professores de Kamigawa. De todas as coisas que ele aprendeu, o mais importante foi que se seu oponente fosse mais forte, então ele precisava ser mais rápido.

A próxima vez que Tameshi golpeou, Kaito não hesitou. Ele espetou sua lâmina contra a borda serrilhada do bastão com força suficiente para mantê-lo no lugar, então pegou a haste com a mão livre e balançou a perna para cima, atingindo a cabeça de Tameshi.

O golpe derrubou Tameshi para o lado, mas o cidadão-da-lua deslizou de volta, pairando no ar e ainda segurando firme sua arma. Kaito se recusou a soltar o cajado e cravou os calcanhares na terra.

Tameshi revidou, caindo rapidamente no chão. Ele jogou o cotovelo em direção ao queixo de Kaito, mas Kaito não vacilou. Ele usou seu peso para girar em torno de Tameshi, mantendo o cajado na frente do peito do cidadão-da-lua, até que conseguiu puxar o bastão contra a garganta de seu oponente.

Tameshi era mais alto e mais forte, mas Kaito nunca foi de desistir de uma luta. E Kaito não podia perder essa — não quando ele precisava dos Vingadores para ajudá-lo a encontrar o homem do telhado. Tudo que Kaito fez foi um esforço para trazer a imperatriz para casa. Ela era a melhor amiga de Kaito e valia a pena todos os riscos, não importando as probabilidades.

Kaito puxou com força, e Tameshi engasgou contra o bastão de metal, empurrando para trás com toda a força. Kaito o ouviu ofegar, mas tudo o que ele podia ver em sua visão era um vermelho desesperado e inflexível.

A voz de Eiko o tirou de seu frenesi. “Kaito, o que você está fazendo? Deixe-o ir!”

Ele piscou os olhos para sua irmã, ainda segurando firme no cajado. “Pensei que tinha ido embora!”

“Eu tive que deixar uma oferenda para a kami. Porque ao contrário do que você pensa, respeitar e seguir regras pode realmente fazer a diferença.” Ela deu vários passos mais perto, palavras afiadas com autoridade. “Pare com isso antes que tire a vida dele. Você esqueceu que ele ainda tem informações que precisamos?”

Kaito cerrou os dentes. “Ele começou!”

“Eu não me importo,” Eiko sussurrou. “Não é assim que lidamos com relações diplomáticas.”

Kaito bufou antes de soltar Tameshi com um empurrão. Ele curvou os dois punhos sobre o cajado.

Tameshi se curvou, tossindo violentamente. Quando o ar voltou para seus pulmões, ele olhou para Eiko. “Então,” ele murmurou, esfregando sua garganta, “eles mandaram os Imperiais afinal.”

Eiko cruzou os braços em resposta.

Kaito vasculhou o céu antes de pressionar sua têmpora para chamar seu drone. Levou apenas alguns segundos para aparecer, e quando ele estendeu o braço, a garça se dobrou como papel e se prendeu confortavelmente em seu pulso.

Os olhos de Tameshi se arregalaram de surpresa. “Onde você conseguiu isso?”

“Foi um presente,” Kaito disse baixinho. “De alguém que conheci há muito tempo.”

“Você conhece Katsumasa?” Tameshi baixou os braços. O fogo em seus olhos retrocedeu, substituído por um estranho reconhecimento.

“Como você conhece esse nome?” Kaito exigiu. Fazia anos desde que ele conheceu o cidadão-da-lua nos jardins imperiais, mas ele ainda podia descrevê-lo. Mais do que isso, ele ainda se lembrava das coisas que Katsumasa falava — sobre o futuro e tecnologia — e como elas fizeram Kaito sentir que havia muito mais que ele queria saber.

“Ele foi meu mentor. O drone que você tem, é um projeto em que trabalhamos juntos.” Uma faísca de orgulho encheu os olhos de Tameshi. “É sobre isso que venho construindo minha pesquisa.”

Eiko fez uma careta, os olhos ardendo de raiva. “Seus experimentos com kamis e tecnologia são uma violação dos próprios fundamentos de Kamigawa.”

Tameshi franziu a testa. “Estou tentando proteger os kamis.”

“É por isso que você está com um deles em uma gaiola?” Eiko marchou em direção ao conjunto de equipamentos. Não havia fechadura no caixote, mas ela puxou a porta com tanta força que Kaito se perguntou se uma fechadura a teria impedido.

Arte de Campbell White

Ela deu um passo para trás, esperando que um kami aparecesse, quando o rosto prateado de um tanuki de metal espiou a cabeça para fora da caixa e soltou vários bipes e um assobio.

Kaito piscou. “O que é aquilo?”

O robô saltou para o chão, membros estalando como se milhares de peças de metal estivessem se encaixando, e virou a cabeça em direção a Kaito. Seus olhos apainelados o examinaram, e por um momento Kaito teve certeza de que era curiosidade de robô.

“Eu te disse,” Tameshi bufou, endireitando-se. “Minha pesquisa é para ajudar os kamis — e o resto de Kamigawa. Sabemos que nossos dois reinos estão se fundindo e que um dia eles existirão como um. Mas ainda sabemos muito pouco sobre o que está além dos portões mesclados, ou como nós seremos afetados quando a fusão for concluída. Se quisermos realmente entender os kamis, precisamos estudá-los de uma maneira segura. Uma maneira de preservar os kamis existentes em Kamigawa. A tecnologia não precisa ser apenas para nós, ela pode ser para os kamis também.” Sua voz era apaixonada, e talvez um pouco rebelde.

Mas Kaito não conseguiu encontrar nada de mal em suas motivações. Ele se virou para Eiko — para ver o que ela pensava — quando percebeu que ela ainda não havia se movido.

Seus olhos permaneceram fixos no tanuki de metal, os lábios entreabertos como se estivesse presa em transe. “Este robô é quase idêntico ao animal que eu vi.” Ela se virou para Kaito. “Aquele que apareceu no flash de luz.”

Kaito franziu a testa, virando-se para Tameshi. “Minha irmã acha que esta sua criação é a razão pela qual a Imperatriz de Kamigawa desapareceu. Quer se defender?”

“O que você está me acusando é impossível. Esta criação não existia até alguns meses atrás.” Os ombros de Tameshi caíram. “Mas estou familiarizado com a criatura de que você fala. Eu também estive procurando por ela.”

“Por que?” Kaito desafiou. “E o que isso tem a ver com a Imperatriz?”

“A luz que você viu era um kami nascendo. Um kami muito raro, e o único de seu tipo. É a própria personificação do relacionamento que a Imperatriz compartilha com Kyodai e o reino espiritual,” Tameshi explicou. “Eu tenho o perseguido por Kamigawa há algum tempo e procurando maneiras de protegê-lo.” Ele apontou para o tanuki de metal. “Foi para isso que construí este protótipo.”

Eiko cruzou os braços. “Existem milhares de kamis ao nosso redor, e nenhum deles jamais precisou de um robô para proteção.”

“Um kami que incorpora uma conexão com o reino espiritual pode ter um efeito radical nos portões mesclados,” Tameshi disse, e Kaito não deixou de perceber o tom de aviso em sua voz. “Há variáveis aqui que não consideramos. Então, sim, quero protegê-lo, mas também quero estudar sua relação entre os dois reinos.” Ele encolheu os ombros. “Criar uma conexão entre os kamis e as máquinas daria a proteção necessária. Pense nisso como um traje de proteção mecânico. Isso nos permitiria rastrear o kami e garantir que ele permaneça seguro. E que nós também permaneçamos seguros.”

“Essa mesma pesquisa pode permitir que alguém o manipule.” Eiko apontou. “Se o kami realmente puder afetar os portões mesclados, você essencialmente estaria dando o mesmo poder a quem detém os controles.”

O coração de Kaito parou. Se Satoru soubesse a verdade, ele nunca venderia os esquemas no mercado negro. Ele manteria o kami para si mesmo. E se o espírito realmente tivesse poder inexplorado sobre os portões mesclados?

Isso faria dos Vingadores Hyozan a célula mais forte da cidade. Talvez até em toda Kamigawa.

Ninguém deveria ter tanto poder.

Antes que alguém pudesse dizer outra palavra, um barulho ecoou do lado de fora do cânion. Um som que Kaito conhecia muito bem. Um grito, uma música e um sussurro, como três vozes sobrepostas.

A voz de Kyodai.

“Não pode ser,” Kaito murmurou. Ele se moveu lentamente pela grama, os olhos examinando a distância em busca de um lampejo do grande kami.

Kyodai nunca deixava o templo. Se ela estivesse aqui, na Floresta Jukai…

Isso significava que a imperatriz…

A imperatriz havia retornado?

Kaito não esperou. A esperança em seu coração era muito poderosa. Muito desesperada. Ignorando os gritos de alerta de Eiko e Tameshi, ele correu na direção do som.

Ele lutou contra galhos e espinheiros, levantando torrões de terra e correndo até o peito queimar. Havia tantas coisas que ele queria dizer a ela novamente.

Mas principalmente ele só queria ver o rosto dela e saber que ela estava bem.

Kaito parou ao pé de uma enorme árvore de cânfora, os galhos se torcendo em espirais e as folhas brilhando em um verde esmeralda.

Mas Kyodai não estava lá, nem a Imperatriz.

Em vez disso, ele viu o kami em forma de tanuki, com olhos brancos brilhantes e pelo translúcido.

E o kami o viu.

O CAMINHO A SEGUIR

Kaito sentia o peito apertado. Ele realmente pensou que a Imperatriz poderia estar na Floresta de Jukai – e que ouvir a voz de Kyodai era um sinal de que ela finalmente havia encontrado o caminho de casa.

Mas o kami tanuki parado na grama não era a amiga que ele havia perdido. E certamente não era o antigo kami do templo.

A criatura emitiu outro sinal intervalado, mais silencioso desta vez.

Com o cajado de Tameshi ainda em suas mãos, Kaito caiu lentamente de joelhos, os olhos ainda concentrados no rosto brilhante do kami. Tameshi disse que era a personificação do vínculo da Imperatriz com Kyodai. Se esse fosse o caso, ainda havia uma parte dela aqui? Será que ela — o kami —reconheceria Kaito?

Ele colocou a arma no chão e pressionou a mão no peito. “Eu não quero te machucar.”

Ele veio para a Floresta Jukai em busca da pesquisa de Tameshi, mas agora que ele sabia o que ela poderia levar, e o que os kami representavam…

Um nó se formou em sua garganta. Ele tinha que manter o kami seguro.

Folhas esvoaçaram atrás dele, e um objeto escuro irrompeu das árvores, corpo de metal brilhando sob o sol. Ele pairou em círculos acima de Kaito antes de fazer uma descida lenta. Quando aterrissou no chão ao lado do kami, eles eram quase idênticos em composição. A diferença era que enquanto um era claramente um robô, o outro era tão ofuscante quanto a luz das estrelas, com vários orbes dourados girando cuidadosamente ao redor de seu corpo. Eram como as esferas que corriam pelas costas de Kyodai, só que bem menores.

O robô apitou. O kami emitiu uma saudação intervalada.

Arte de Rudy Siswanto

Eiko e Tameshi apareceram na colina. Quando seus olhos pararam sobre o kami, o suspiro de Eiko foi audível. Ela caminhou lentamente para o lado de Kaito, a mão agarrada ao material perto de seu pescoço. “Ele disse… disse alguma coisa?”

Kaito balançou a cabeça. “Kyodai falou com a imperatriz telepaticamente. Talvez esse kami funcione da mesma maneira.” Ele encontrou os olhos de Eiko. “Temos que protegê-lo.”

Eiko assentiu como se nem precisasse da sugestão. Quando ela viu o robô tanuki, seu rosto enrugou. Ela respirou fundo antes de se virar para encarar Tameshi. “Eu estava imaginando como você estava rastreando meu irmão tão facilmente. Você não construiu apenas uma armadura – você construiu um drone.”

Tameshi pressionou as mãos contra o ar. “Precisamos ser capazes de localizar os kamis se eles se perderem ou se machucarem.”

“Os drones foram armados com as atualizações adequadas,” Eiko argumentou. “Você tem alguma ideia de quais seriam as repercussões para algo assim?”

Kaito tentou imaginar uma Kamigawa onde os espíritos corriam com armaduras e lâminas como mechs em miniatura. Espíritos que poderiam ser controlados por pessoas como Satoru.

O pensamento foi inquietante.

“Esse não é o objetivo da minha pesquisa,” Tameshi disse, firme. “O design não é sobre controlar os kami – é sobre mantê-los seguros.”

“Seguros contra o quê?” Eiko exigiu.

A mandíbula de Tameshi endureceu. “De qualquer coisa que esteja do outro lado dos portões de integração.”

Kaito e Eiko ficaram em silêncio. Ele não estava tentando apenas estudar os kamis e a fusão; ele queria estudar o que estava do outro lado.

“Você está tentando enviar o kami de volta ao reino espiritual,” Kaito esclareceu.

“Se eu puder encontrar uma maneira de conectar kami e drone, então, eventualmente, sim.” Tameshi suspirou. “Ainda há muito que precisamos aprender. E o conhecimento está lá fora – só precisamos ser corajosos o suficiente para encontrar a chave e abrir a porta.”

“Você não se importa com os kamis. Você está apenas tentando proteger a informação que eles trariam se pudessem se mover entre os reinos.” Eiko cerrou os dentes. “Sua pesquisa ameaça o equilíbrio de Kamigawa. Ela não pode continuar.”

Tameshi estava estóico. “Nós já temos a capacidade de canalizar com os kamis. O que seria diferente?”

“Um canalizador constrói um relacionamento com um kami. Há confiança e respeito mútuo. É para ser uma dádiva.” Eiko parecia exasperada. “O que você quer fazer é capturar o poder deles e entregá-lo a quem der o maior lance.”

“Não, eu-” Tameshi começou, mas Eiko não havia terminado.

“Talvez você não planeja que seja uma arma, mas é. E se a sua pesquisa for divulgada, algum dia alguém a usará para ter vantagem.”

Tameshi desviou o olhar, confuso. “O que estou tentando conquistar não é sobre ganância. É sobre compreensão. Os portões de integração são a prova de que há mais na vida do que nós conhecemos. E ter esse tipo de conhecimento – levantar o véu do desconhecido – pode exigir sacrifícios que alguns não estão dispostos a fazer.”

Eiko balançou a cabeça. “O poder requer equilíbrio. E nas mãos erradas, seu conhecimento pode destruir os portões de integração. Pode destruir Kamigawa.”

O olhar de Tameshi se fechou. “Você diz isso porque é teimosa demais para olhar para o futuro. Sobre o que Kamigawa um dia se tornará e os passos que precisamos tomar para garantir que esse futuro permaneça estável.” Seus olhos se abriram. “Os Imperiais vão falhar com todos se não correrem riscos maiores para estudar a fusão.”

“Estamos protegendo o Plano que temos agora.” A voz de Eiko não vacilou. “Sua pesquisa – ela precisa ser destruída.”

Com isso, os ombros de Tameshi afundaram. “Estou tão perto. Se eu pudesse apenas-”

O pequeno kami uivou novamente, o som mais alto, advertindo. Os instintos de Kaito clamavam em concordância com a angústia do kami. Algo não estava certo. A floresta ficou muito quieta, e havia um vazio no ar, quase como — Kaito endureceu. A última vez que ele se sentiu assim foi no covil de Satoru.

A grama farfalhava nas proximidades, e Kaito girou para encontrar os espiões de Satoru. Cinco Vingadores de Hyozan, seus cintos cheios de lâminas e seus braços gravados em tinta colorida. A que estava na frente era a mulher com luvas com ponta de agulha.

Nari – a Vingadora com experiência em venenos, seu cabelo raspado para trás em uma trança alta. E atrás dela estava o canalizador de Satoru. Nari mostrou os dentes. “Satoru manda lembranças.”

Arte de Rovina Cai
Kaito tentou não reagir quando gavinhas de fumaça preta saíram da pele do canalizador, mordendo o ar como víboras. “Não me lembro de ter pedido uma babá,” ele disse.

Nari farejou, sacudindo suas garras no ar. “Satoru sempre se perguntou se você era um espião. Um ex-samurai é uma coisa, mas uma estudante Imperial?” Ela retrucou. “Difícil acreditar que alguém deixaria muros tão bonitos a menos que fosse ordenado.”

“Desculpe desapontá-la, mas eu não sou um espião.” Os dedos de Kaito dançaram ao seu lado. Sua faca estava enfiada no cinto e o cajado ainda estava na grama; não havia chance de alcançar nenhuma das armas antes que os Vingadores retaliassem. “Satoru sabe disso. Por que você acha que ele me escolheu a dedo para este trabalho?”

Até suas palavras eram impregnadas de veneno. “Provavelmente pela mesma razão que ele nos pediu para ficar de olho em você.”

Eles estavam o observando. Como Kaito não percebeu? Como ele não os sentiu?

Por um momento ele podia ouvir a voz de Patas-Leves em sua cabeça, dizendo que ele era muito insolente e presunçoso, que seu ego estava criando pontos cegos.

Kaito tentou não fazer uma careta. Blefar era a única carta que lhe restava.

“Se você está me seguindo, você sabe que eu vim aqui pelos esquemas,” ele disse com um encolher de ombros.

Mesmo se eles estivessem seguindo Kaito, o que os Vingadores poderiam ter contra ele? Até ficar cara a cara com o kami, ele nunca teve a intenção de trair Satoru. Tudo o que ele tinha feito antes disso foi conseguir a pesquisa de Tameshi.

A canalizadora ergueu o rosto cinza. “Você sabe que eu canalizo Azamaki, Traição Encarnada.” Ela não piscou, mas quando a fumaça se transformou em pinças insetiformes que se expandiram de sua coluna, Kaito deu vários passos para trás. “Você realmente achou que eu não sentiria sua traição?”

Um dos Vingadores se moveu rapidamente, agarrando Eiko e segurando uma espada contra seu pescoço.

Kaito cerrou os punhos, o rosto ficando quente. “Se você machucá-la-”

Nari acenou com a mão. “Você procurou uma Imperial para ajudá-lo. Uma Imperial que você sabia que nos denunciaria.” Ela ergueu uma sobrancelha fina. “É toda a prova que Satoru precisará para ver que você é um espião.”

A mente de Kaito tentou desesperadamente montar um plano. Mas tudo o que ele tinha era uma maneira de ganhar tempo. “Isso foi uma armação desde o início?” ele perguntou, determinado a manter a conversa enquanto pudesse. “Satoru queria mesmo a pesquisa?”

“Claro que sim,” Nari respondeu. “Sua lealdade pode ter sido fingida, mas seus talentos não. Ele esperava que você nos levasse a Tameshi.” Ela mostrou seus caninos. “E você nos trouxe.”

Kaito respirou fundo quando ouviu o kami se mover atrás dele. Ele não tinha certeza se os Vingadores entendiam seu significado, ou se eles sabiam o quão raro ele realmente era, mas Kaito entendeu no momento em que ouviu sua voz.

Ele precisava levar os Vingadores para longe do kami.

Kaito tentou atrair o foco deles. “Os esquemas não estão aqui. Eles estão no acampamento dele.” Ele se virou para o cidadão-da-lua. Se Tameshi realmente quisesse proteger os kamis, essa era a única opção.

Embora o rosto de Tameshi estivesse pálido, ele deu um aceno curto como se entendesse mais do que Kaito. “Posso levá-la até lá,” ele disse para a Hyozan. “Mas só se você deixar os outros irem.”

O que você está fazendo? Kaito queria sussurrar. Tameshi era praticamente um estranho. Ele não devia nada a Kaito. Mas ele estava tentando poupá-los, do jeito que pudesse.

Nari riu. “Você não está em posição de fazer negócios.”

Tameshi fez uma careta. “Você nunca vai entender a pesquisa. Não sem a minha ajuda. Então, ou você os deixa ir, ou eu não vou te dizer nada.”

Nari caminhou em direção a ele e levantou o queixo de Tameshi com uma mão, as unhas perigosamente perto de quebrar a pele. “Vai sim.” Ela inclinou a cabeça e gesticulou para um dos outros espiões. “Nós não precisamos de testemunhas. E não se esqueça do kami.” Ela encontrou o olhar aflito de Kaito. “Algo me diz que podemos precisar dele.”

Kaito rosnou e estava dobrando os joelhos para atacar o espião mais próximo quando Eiko bateu a cabeça para trás contra o rosto de seu captor. Enquanto o Vingador rosnava de dor, Eiko puxou a manga para cima para revelar uma arma escondida. Uma bobina de metal se desenrolou dela, as lâminas em miniatura conectadas por uma luz branca brilhante, até que formaram uma espada. Ela agarrou a empunhadura e acertou o pescoço de outro Vingador com velocidade impecável.

Kaito não teve tempo de ficar boquiaberto – ele se lançou em um dos Vingadores e o prendeu no chão. Lançando vários socos no rosto do homem, Kaito usou a distração para lutar pelo cajado de Tameshi.

Ele o recuperou bem a tempo de bloquear uma lâmina de aço voando em direção ao seu peito. Os Vingadores tornaram-se um furacão de aço e fúria. Kaito caiu para trás, bloqueando de novo, e novamente, desviando o máximo que pôde até chegar a Eiko no campo de batalha.

“O que aconteceu com ‘sem armas’?” Kaito conseguiu gritar enquanto lutavam de costas um para o outro.

Eiko grunhiu, chutando um dos agressores bem no peito. “Isso é diplomacia. Quando as palavras falham, usamos nossas lâminas.” Sua espada encontrou carne, e quando o homem caiu, ela lançou um olhar por cima do ombro. “Eu lhe disse sem armas porque eu sabia que você faria exatamente o oposto.”

A vários metros de distância, Tameshi pousou ao lado do kami. Kaito não podia ouvi-lo por causa do frenesi de armas, mas ele podia dizer pelo jeito que ele estava segurando o robô que ele estava tentando fazer o kami se fundir com ele.

Mas o kami recusou.

Kaito se tensionou sob a espada de Nari. A única coisa que a mantinha afastada era o bastão de metal entre eles. Ele grunhiu, empurrou com força e balançou sua arma para encontrar a dela.

Kaito e sua irmã podem ter sido treinados pelos samurais de elite de Kamigawa, mas estavam claramente em menor número. A cada choque de metal contra metal, o medo de Kaito fluía para a superfície de sua mente.

Se algo acontecesse com sua irmã, ele nunca se perdoaria. Ele sabia que ela cuidaria do kami. Ela garantiria que a pesquisa de Tameshi nunca caísse em mãos erradas. Ela faria o que fosse melhor para Kamigawa e para a Imperatriz. Se apenas um deles fosse sair vivo da luta, ele queria que fosse Eiko.

“Pegue Tameshi e o kami e corra,” Kaito sussurrou.

“Seja lá o que você está planejando, pode esquecer,” Eiko sussurrou de volta. “Eu não vou deixar você para trás.”

Kaito abriu a boca para argumentar quando um rugido atravessou as árvores. Os Vingadores hesitaram por um momento, e quando Kaito olhou para o cume, a esperança se infiltrou de volta em seu peito.

A Ordem de Jukai havia chegado.

Uma mulher com chamas amarelas nas mãos estava na beirada da colina. Sete pedras brilhantes flutuavam ao lado dela, e ela usava um elmo feito de osso. Ao seu redor havia, pelo menos, mais uma dúzia de canalizadores de kami, vestidos com armaduras de couro e prontos para lutar.

Arte de Howard Lyon
Nari soltou um grito gutural, e então – caos.

A Ordem de Jukai encontrou os Vingadores na clareira, e a floresta outrora silenciosa se encheu de gritos de guerra. Era um redemoinho de fumaça preta e chamas amarelas.

Kaito agarrou Eiko pelo braço e puxou. “Nós precisamos ir!”

A respiração de Eiko estava pesada. “Mas a Ordem—”

“—não vai ficar muito feliz conosco se vencer essa luta,” Kaito pontuou. “Não é seguro aqui. Para nenhum de nós.” Ele se virou para olhar para o kami tanuki. O que quer que acontecesse, ele precisava tirar o espírito da floresta.

Tameshi enviou seu drone para se proteger nas nuvens. “Eu tentei explicar, mas ela não vem comigo.”

“Ela?” Kaito repetiu, olhando diretamente nos olhos brilhantes da kami. Ele se ajoelhou para encontrá-la. “Essas pessoas… elas vão te machucar se tiverem a chance. Eu preciso te levar para algum lugar seguro.”

A tanuki olhou de volta.

Kaito respirou fundo e esperou que o silêncio fosse um acordo entre eles. “Por favor, não me morda,” ele murmurou, e pegou a kami em seus braços.

Quando ele correu, Eiko e Tameshi o seguiram.

A floresta era um borrão de musgo e casca de árvore. Kaito sentia sua garganta queimar a cada passo, desesperado para recuperar o fôlego. Havia apenas um lugar que ele sabia que a kami estaria segura, mas ele precisava atravessar a fronteira primeiro, para longe da Floresta Jukai.

Tameshi e Eiko não ficaram muito atrás. Ele podia ouvir os passos de sua irmã e a rajada de ar cada vez que Tameshi voava sob um galho. O cidadão-da-lua poderia tê-los deixado a qualquer momento e voltado para Otawara sem olhar duas vezes. Mas ele não o fez. Ele ficou ao lado deles como se fosse mais amigo do que inimigo.

Kaito decidiu que algum dia – se eles saíssem da floresta inteiros – ele encontraria uma maneira de recompensá-lo.

O chão tremeu, e Kaito congelou em seu caminho. “Por favor, me diga que é outro kami das rochas,” ele disse cautelosamente, observando a terra em busca de movimento. Eiko apareceu à sua esquerda, o rosto sem cor.

Um kami explodiu do rio, e toda a floresta pareceu estremecer em resposta. Com um grito ensurdecedor, o espírito passou pelas árvores, derrubando uma delas com um pedacinho do seu braço que parecia um osso.

Ele se movia em rajadas erráticas, membros longos esticados como se estivesse procurando por contato. Dois orbes de luz verde sobrenatural brilhavam de um rosto de pedra delicado, mas o sorriso esculpido que usava não combinava com a raiva que irradiava de seu núcleo. Frágil como um esqueleto, tinha braços e pernas suficientes para disputar com um inseto, com pesadas teias de aranha negras que caíam de sua forma tortuosa como um véu. Um fio de seda escorria de um de seus dedos ossudos, preso a uma lanterna de papel que balançava na frente de seu peito como um pêndulo.

Tumulume, o Kami das Clareiras Esquecidas.

Arte de Miranda Meeks

“Eu – eu vou tentar falar com ela,” Eiko murmurou, quase baixo demais para Kaito ouvir.

“É muito perigoso,” Kaito começou, mas ela pressionou uma mão contra seu antebraço, e então um dedo em seus lábios. Ela queria que ele ficasse quieto.

A kami piscou em direção a eles, a cabeça girando em ângulos estranhos, procurando o som como se seus olhos brilhantes não pudessem ver nada.

Eiko se ajoelhou, fixando os olhos no chão. “Eu sou Eiko Shizuki do Palácio Imperial, e uma Diplomata Kami.” No momento em que ela falou, a kami bateu na terra na frente dela. O cabelo de Eiko tremeu com o movimento, mas ela não recuou. “Não era nossa intenção perturbá-la, nem pretendemos invadir a floresta por mais tempo. Pedimos passagem segura para retornar a Boseiju.”

Tumulume abriu sua boca de pedra, grande demais para estar perto de um humano, e tudo que Kaito podia ver era um horrível vazio negro.

A kami parou a centímetros do pescoço dobrado de Eiko, sentindo sua postura e sua presença. Quando Tumulume recuou muito rápido, Kaito não sabia se ela iria embora ou atacar.

Ele assumiu o último.

“Não!” Kaito gritou, saindo de seu lugar na grama e derrapando na frente de sua irmã.

A kami gemeu, e Kaito apertou o tanuki perto de seu peito e passou um braço ao redor de Eiko como se ele a estivesse protegendo.

Como se estivesse protegendo os dois.

A Kami das Clareiras Esquecidas rasgou as árvores, dividindo galhos e golpeando a terra, e correu direto para as costas expostas de Kaito. Mas antes que ela aterrissasse seu ataque, o kami tanuki saltou dos braços de Kaito e voou em direção ao espírito maior.

Luz das estrelas explodiu ao redor deles.

Kaito apertou os olhos. Ele não podia ver o que estava acontecendo – era muito brilhante, e ambos os kamis estavam se movendo muito rápido. Mas foi tempo suficiente para colocar Eiko de pé e conduzi-la em direção a Tameshi.

“Vai!” Kaito gritou. “Eu te alcanço!”

Tameshi pegou Eiko pela cintura e a ergueu para fora do caminho da terra rachada e pedras voadoras enquanto Kaito corria de volta para o tanuki.

Ele ergueu uma mão, olhando para o centro da luz em busca da pequena criatura. E ele a viu, piscando para a esquerda e para a direita, tentando distrair Tumulume — exceto que isso parecia só irritá-la.

A Kami das Clareiras Esquecidas jogou um braço para trás, preparando-se para golpear o tanuki com toda sua força, quando Kaito saltou, agarrou o kami menor e rolou para fora do caminho. Com força mortal, o braço atingiu o chão da floresta, sacudindo a floresta ao redor.

Kaito procurou os olhos da tanuki, frenético. Não havia para onde fugir; ele não era rápido o suficiente, e ele nunca em sua vida lutou contra um kami. Ele não foi treinado para isso.

Tudo o que ele podia fazer agora era abraçá-la e se preparar para o próximo impacto.

Mas ele não veio.

Kaito abriu os olhos e encontrou Tumulume olhando para ele com seu estranho rosto de mármore. Ela esticou seus dedos ossudos para mais perto, parando a centímetros do corpo da tanuki.

A tanuki soltou um grito em resposta.

Não — um grito não. Uma ordem.

Tumulume soltou um suspiro. O estrondo fez Kaito recuar — e então a Kami das Clareiras Esquecidas mergulhou de volta no rio, água espirrando em todas as direções, e desapareceu de vista.

Kaito estremeceu, olhando para a pequena kami ainda protegida em seus braços. “Eu — eu acho que isso significa que podemos ir?”

A kami respondeu com um chilro em intervalos, e Kaito ficou de pé, enxugou a água do rio de sua testa e correu para encontrar sua irmã e Tameshi.

O grupo se reconectou perto da fronteira, para alívio visível de Eiko.

“Você poderia ter morrido.” Ela apertou os braços em volta do pescoço de Kaito, a voz abafada.

Entre eles, o kami tanuki deu um rosnado antes de pular no chão.

Eiko se afastou e fez uma reverência se desculpando. “Obrigada. Acho que você pode ter salvado nossas vidas na floresta.”

Kaito observou a kami esticar as pernas, orbes dourados dançando em círculos. “Sim. E ela não é a única.” Ambos se voltaram para Tameshi.

“Você ia desistir de sua pesquisa para nos proteger.” Eiko disse.

Os olhos de Tameshi brilharam. “Não olhe para mim como se eu fosse um herói, porque não sou. A maior parte da minha pesquisa está aqui em cima.” Ele bateu no lado de sua cabeça. “E o resto? Bem, eu nunca mantenho toda a minha pesquisa em um só lugar. Eu estava enrolando, esperando a Ordem de Jukai aparecer. Estou feliz que eles receberam minha mensagem a tempo.”

Kaito sentiu a onda de choque como um soco no estômago. “Você mandou chamá-los?”

Tamish riu. “Não vou montar um laboratório de pesquisa na Floresta Jukai sem ter certeza de ter câmeras de segurança.” Ele encolheu os ombros. “Quando vi vocês dois, enviei um drone para o templo deles. Achei que vocês poderiam lutar entre si enquanto eu levava meu equipamento para algum lugar seguro. O que, gostaria de salientar, acabou sendo uma excelente ideia.”

Kaito balançou a cabeça. “E eu estava aqui, tentando decidir se tinha gostado de você.”

Tameshi riu, e Kaito abriu um sorriso.

“Estamos gratos por sua ajuda. Mas ainda tenho o dever de denunciá-lo aos Imperiais,” Eiko disse calmamente. “E quando eu fizer isso, ficará uma marca em seu nome. Eles ficarão de olho em você e em qualquer coisa que você faça pelo resto de sua vida.”

Tameshi esperou. “A menos que?”

Houve outra longa pausa.

“A menos que você concorde em nunca continuar esta pesquisa,” Eiko finalizou.

“Pelo resto da minha vida, hein?” Tameshi fingiu pesar suas opções. “Bem, eu gosto de um desafio…”

Kaito bufou, e Eiko lançou-lhe um olhar. “Eu sei que ele soa como você, mas tente lembrar que você está do meu lado.”

Kaito ergueu os ombros. “O quê? No que se refere aos membros de uma equipe, ele não é o pior.”

Tameshi sorriu. “Agradeço o elogio.”

Eiko ignorou a amizade deles e cruzou os braços. “Temos um acordo?”

“Você não precisa de um.” Tameshi suspirou. “Eu posso ter criado um protótipo para mesclar kami e tecnologia, mas eu queria que eles o possuíssem por vontade própria. Deveria ser a escolha deles.”

Eiko franziu a testa. “Nenhum kami sacrificaria voluntariamente sua liberdade dessa maneira. Isso vai contra a natureza deles. Canalizadores de kamis são poucos e distantes entre si, mas eles existem porque há uma troca. Algo compartilhado. Um kami não teria motivos para se fundir com um drone.”

“Você está certa. É por isso que eu estava procurando por esta pequena.” Tameshi acenou para o tanuki. “Um kami nascido no reino mortal é um fenômeno novo. Eu pensei que talvez nascer de forma diferente a levaria a reagir de forma diferente.”

“Mas ela recusou você,” Kaito admitiu. “Quando os Vingadores atacaram, você tentou fazer com que ela se fundisse com a tecnologia, e ela não conseguiu. Nem mesmo para se salvar.”

Tameshi soltou um zumbido desapontado. “Eu não sou de admitir facilmente a derrota.” Ele balançou sua cabeça. “Mas você não precisa se preocupar com minha pesquisa. Não sem um kami participante disposto, o que parece não existir.”

Eiko assentiu. “Ótimo.”

“Ainda assim, você é bem-vindo para ficar de olho em mim.” Tameshi piscou. “Não posso prometer que meu próximo projeto será integralmente aprovado pelos Imperiais.”

Seus lábios se curvaram. “Algo me diz que vou me arrepender de você e meu irmão se encontrarem hoje.”

Tameshi pressionou um painel em seu cinto, e seu drone tanuki voou para Kaito. “Pegue. É muito melhor do que aquele guindaste antiquado que você está segurando.”

Os olhos de Kaito se arregalaram. “Eu… você tem certeza?”

“Você pode me pagar um almoço quando vier para Otawara,” Tameshi respondeu. “Katsumasa adoraria encontrar um velho amigo.”

“Obrigado,” Kaito disse sinceramente. Ele pegou o robô com as duas mãos e apertou os lábios para não sorrir muito.

“É melhor eu limpar o que puder do meu laboratório. Seria uma pena a Ordem de Jukai destruir equipamentos perfeitamente bons.” Tameshi olhou para a kami. “Boa sorte lá fora. E obrigado pela perseguição – foi divertido enquanto durou.”

Eles o viram desaparecer de volta na floresta, e foi Eiko quem falou primeiro.

“E agora?” ela perguntou.

“Bem, agora você leva nossa nova amiga para o palácio com você,” Kaito respondeu.

Eiko puxou o rosto para trás. “Para Eiganjo?”

Kaito deu de ombros. “Se ela realmente tem uma conexão com a Imperatriz e Kyodai, então quem melhor para cuidar dela do que o próprio grande kami?”

No chão, a kami tanuki estava olhando para eles, ouvindo atentamente.

Kaito não gostava particularmente de despedidas, mas ele não esperava que esta apertasse seu peito com tanta força. Ele limpou a garganta. “Você deveria ir para a estação de trem antes que a Ordem volte.”

Eiko se acalmou. “Aonde você vai?”

Ele sabia o que ela queria dizer. Ele não seria exatamente bem-vindo no Submundo tão cedo. Os Vingadores provavelmente perderam a luta, mas sempre havia uma chance de alguns deles fugirem. Kaito preferia que a notícia sobre o que aconteceu não chegasse a Satoru, mas seria mais seguro ficar quieto por um tempo, para ter certeza.

“Eu vou ficar bem.” Kaito sorriu. “Não se preocupe comigo.”

Eiko franziu os lábios. “Você sabe oque eu penso?”

“Que você se divertiu muito mais aqui do que em Eiganjo?” Kaito sugeriu.

Ela fez uma careta. “Acho que você nunca teve a intenção de dar esses esquemas para Satoru. Acho que você pediu minha ajuda porque queria fazer a coisa certa. Você é teimoso demais para admitir isso.”

Kaito riu. “Você ainda acha que há um Imperial em mim, mas eu juro – eu sou um rebelde por completo.”

Eiko olhou para o tanuki. “Seria bom se tivéssemos algo para chamá-la. Uma kami tão importante merece uma apresentação formal quando chegarmos ao palácio.”

“Você não deveria ser uma especialista em relações kami?” Kaito pontouu. “Como você geralmente descobre seus nomes?”

“Nem sempre é tão simples,” ela disse. “Às vezes é através de palavras ou linguagem corporal. Às vezes é telepático. Mas em alguns casos, você tem que ganhar a confiança deles antes que eles se comuniquem adequadamente com você.”

“Eu voto para chamá-la de Pompon-chan por enquanto,” Kaito disse. Quando o espírito soltou um chilro em camadas, ele sorriu. “Viu? Ela gosta.”

Eiko se moveu para pegar a kami, mas a tanuki imediatamente saiu de seu alcance. Quando Eiko deu outro passo, a kami correu atrás dos pés de Kaito em busca de abrigo.

“Não se preocupe,” Kaito disse. “Você estará em boas mãos. Minha irmã é uma das melhores pessoas em Kamigawa – você só precisa ignorar as rugas.”

Ele deu um passo para longe, tentando encorajar a kami a ir até Eiko, mas a kami soltou um uivo frustrado e se escondeu atrás de Kaito mais uma vez.

Eiko ergueu uma sobrancelha. “Eu não acho que ela quer ir ao templo.”

“Bem, ela não pode ficar aqui sozinha. Os Vingadores sabem sobre ela. Não é seguro,” Kaito disse.

Eiko segurou uma risada. “Para alguém que pensa que é tão inteligente, você é terrível em ver o que está bem na sua frente.”

Kaito piscou. “Mas — eu não entendo.” Ele balançou a cabeça para a kami. “Eu não tenho nada para lhe oferecer. Nem abrigo, ou comida. Eu mal sei o que estou fazendo na metade do tempo.” Ele passou a mão pelo cabelo. “Só sei que preciso encontrar alguém, e não pretendo parar até descobrir como trazê-la para casa.”

Os olhos da kami brilharam.

Eiko pressionou a mão contra o ombro de Kaito. “Talvez seja exatamente isso que ela quer.”

Kaito se inclinou na grama, o drone ainda preso contra o peito. “Você quer ajudar a procurar a Imperatriz também?”

A kami emitiu um som que imitava a música de Kyodai, e Kaito reconheceu o alívio por trás da luz. O senso de propósito.

Talvez a kami nunca tenha se escondido na Floresta Jukai. Talvez ela estava procurando.

Kaito assentiu como se entendesse. “Ok. Acho que somos você e eu de agora em diante.”

Sem aviso, a kami saltou para o peito de Kaito e se uniu ao protótipo de tanuki. Houve um clarão de luz e metal esvoaçando como um trilhão de beija-flores cromados.

Quando a luz diminuiu, o drone tanuki piscou por trás de seus olhos de vidro. Ele escalou o braço de Kaito até encontrar um lugar para descansar em seus ombros.

Um barulho pingou em sua mente, firme no início e suave como um chocalho, mas nos segundos que se seguiram o barulho se tornou um cântico inconfundível. Então Kaito pôde ouvir – o nome da kami, ecoando em sua mente. Quando ele se virou para olhar para o tanuki, ela abaixou a cabeça, e uma gentil consciência passou entre os dois.

“O nome dela,” ele disse lentamente. “Ela diz que o nome dela é Himoto.”

Kaito se levantou para encarar sua irmã, cuja boca estava aberta de medo.

A pesquisa de Tameshi — ela tentou detê-la. Tentou ter certeza de que nunca cairia em mãos erradas.

E agora a prova disso estava nos ombros de Kaito como um animal de estimação amado.

O robô tanuki mudou mais uma vez e caiu nas mãos de Kaito. Quando virou, Kaito percebeu que ele havia se transformado em uma máscara.

Ele olhou para as bordas lisas e recortadas de origami, imaginando se uma conexão com a Imperatriz realmente vivia dentro de Himoto e se escolher ficar com Kaito significava alguma coisa.

Quando ele colocou a máscara de tanuki sobre o rosto, ele a sentiu imediatamente.

A energia vibrava em seu núcleo, até a ponta dos dedos. Era como estática, magia e poder, implorando para ser liberado. Implorando para Kaito soltar.

Em algum lugar atrás dele, Eiko estava chamando seu nome. Gritando com respirações desesperadas e aterrorizadas.

Mas Kaito não podia responder a ela. Algo estava puxando sua alma em outra direção – para outro Plano – e ele não podia lutar contra isso.

Ele não queria lutar contra isso.

Pela primeira vez em anos, Kaito sentiu como se soubesse exatamente para onde deveria ir.

O poder explodiu através dele, percorrendo cada osso e veia. Kaito deixou que aquilo o consumisse inteiramente – e quando ele sentiu o puxão contra sua alma mais uma vez, ele respondeu ao chamado como se tivesse sido o destino o tempo todo.

Kaito deu um passo à frente e desapareceu de Kamigawa.

EPÍLOGO

Os cheiros familiares de Towashi deixaram Kaito com água na boca. Fazia um ano que não comia bolinhos de carne de porco e arroz ao curry — não porque não tivesse retornado a Kamigawa, mas porque nunca ficava muito tempo.

A Imperatriz ainda estava lá fora, em algum lugar do Multiverso.

Ele não podia deixar a comida de rua distraí-lo.

Quando Himoto, a Kami da Centelha, transformou Kaito em um planinauta, ele sabia que devia ter sido por algum motivo. Que de alguma forma o reino espiritual sabia que Kaito era a única pessoa em cem Planos que nunca pararia de procurá-la.

Ele tinha feito uma promessa, afinal.

Kaito pegou sua máscara de tanuki e a deslizou sobre o rosto, protegendo-se da multidão. Ele sempre soube se tornar invisível, mas hoje em dia era praticamente uma forma de arte.

O Multiverso tinha informações que ele precisava – e na experiência de Kaito, era sempre melhor quando seu inimigo não o via chegando.

Kaito levantou o colarinho e pisou na calçada, a cidade refletida em cada poça ao seu redor. Ele era uma sombra entre as luzes de neon, que poderia desaparecer a qualquer momento.

E ele iria, em breve.

Mas hoje, Kaito tinha um amigo em Otawara que queria vê-lo, e uma irmã em Eiganjo que estava esperando notícias.

E depois disso?

Havia muitos Planos para procurar.

Arte de Yongjae Choi

NOTA DO TRADUTOR: Lucas Lanna da TCGeek

¹: Do original, Reckoner. O termo pode ser traduzido de diversas formas diferentes, como Vindicador, caso seja um grupo de cobranças de dívidas, ou Vingador, caso eles sejam um grupo de vingança. A própria Wizards flerta entre as duas possibilidades na tradução de diversas cartas, às vezes até optando por Víndice, que é uma versão estilizada de Vingador.

Sinceramente, se eu pudesse, traduziria para Agiotas Hyozan.

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