Mtg Lore

Compêndio da Lore de Magic the Gathering

GÓRGONA DE XATHRID

Ao leste da fronteira eu sou chamado de Sentos, o Misericordioso. A oeste, sou chamado de Sentos, o Justo. No lugar onde o leste encontra o oeste, sou apenas um homem. Um homem sozinho na cabana de um monge em um mosteiro nas montanhas da fronteira. Um homem de vinte e seis anos e veterano de uma guerra que começou no ano em que nasci.

Uma hora para o leste está An Karras, a cidade do meu nascimento. É uma cidade ancestral, tão antiga que o pó entre as lajes é o remanescente de templos construídos em sua infância. Lá, meus pais, minha esposa e legiões de admiradores saudariam alegremente meu retorno. Eles veneram Sentos, o Justo, o soldado que trouxe glória a todos os que moram em Thune.

Mas e aqueles que clamam por Sentos, o Misericordioso, o soldado que terminou a guerra por meio de um ato de misericórdia sem precedentes em uma terra devastada pela guerra? E sua cidade oriental com seus templos antigos? Eles me abençoaram por poupar seu Ancestral Rei Sol, um homem de sobrenatural longevidade e sabedoria. Seus contadores de histórias me chamavam de filho da deusa. Minha mãe, que quase morreu durante a gravidez, riu ao ouvir tamanha tolice.

Em um dia sem nuvens, posso vislumbrar as lendárias cúpulas de An Karras à distância, apoiadas pelo oceano cerúleo. Mas agora é noite, fria e enevoada, e vejo apenas sombras do lado de fora da minha janela aberta. Por opção, meu mundo reduziu-se a quatro coisas: um palete para dormir, a mesa vazia em que me sento, o anel no meu dedo e o frasco de veneno.

O anel veio até mim no dia em que a guerra terminou em Fleet Rock. O dia em que não executei um homem. O veneno eu obtive no dia em que An Karras celebrou o flagelo do leste. Se eu bebo à justiça, morro em nome daquela grande cidade no horizonte ocidental. Se eu bebo à misericórdia, morro por aquela cidade oriental – agora uma confusão de pedras carbonizadas. Você não pode traçar uma linha reta entre o meu coração e aquela devastação. Mas na fronteira, neste lugar onde eu não sou nada além de um homem, é só um fardo que carrego sozinho.

Então, levantarei o frasco em homenagem aos reis anciãos, aos templos antigos, aos contos daqueles que renunciam a glória. Beberei ao esquecimento. E me alegrarei enquanto a escuridão cai.

Sacerdote de Guerra de Thune | Arte de Izzy

A porta de madeira da cabana se abriu devido a uma rajada de vento, e o estrondo sacudiu Sentos de sua letargia melancólica. O frasco vazio de veneno caiu sobre a mesa e se estilhaçou contra a parede. Ele se virou em sua cadeira enquanto o vento soprava novamente, soprando as folhas de outono pela porta aberta. Vários ratos pretos correram pela soleira e se esconderam atrás do estrado de palha ao longo da parede.

A tocha na parede oposta ainda queimava, e ainda era noite. Mas é a mesma noite? Com as pernas trêmulas, Sentos tropeçou em direção à porta, esperando fechá-la contra o frio, quando algo na borda da clareira chamou sua atenção. Ele saiu da cabana e tropeçou em direção a ela. Uma estátua? Brilhando branca ao luar, a estátua lembrava um dos monges que vivia na fortaleza. Mas o artesão esculpira o medo nas feições idosas do monge. Um jeito estranho de representar um homem santo, pensou Sentos.

A cabana do monge estava isolada da fortaleza principal. Não havia estátua antes, disso ele tinha certeza. Como os monges transportaram esse peso pelo caminho sinuoso que levava à cabana? Ele tropeçou de volta para dentro, onde ele queria deitar e dormir. Mas e os ratos e o vidro quebrado? A meia-noite veio e foi embora? Seus pensamentos pareciam muito banais para um homem que optou pela morte ao invés da vida.

Ratos Vorazes | Arte de Carl Critchlow

De volta à cabana, ele percebeu que não estava sozinho um segundo antes de uma lâmina fria ser pressionada contra sua garganta.

“Não se mexa,” a voz de uma mulher o advertiu. Ela parecia jovem, como uma das jovens que vivia na aldeia abaixo do mosteiro. “Você é Sentos o Misericordioso?” Ela falou com um sotaque que não era de Thune, mas que também não era do leste. Shandalar era vasta e, de onde quer que ela fosse, o sotaque não lhe era familiar.

“Não.” Ele podia ver a sombra da mulher na parede, iluminado pela tocha perto da porta. Ela era apenas um pouco mais baixa que ele, mas ele não era um homem muito alto.

“Então quem é você?” ela perguntou.

“Sentos, o Que Não Morreu,” ele disse. Ela enfiou a lâmina nas costas dele, entre a omoplata e a coluna. Ele mal conseguiu não gritar. Uma ideia tola era a que uma mulher não poderia ser mortal.

“Quem é você?” ela exigiu.

“Sentos,” ele conseguiu dizer. A lâmina ainda estava em suas costas. Ele sentiu um pânico momentâneo, como uma sensação de aperto em sua barriga. Ele queria que saísse dele. Ele a queria em sua garganta.

“Diga-me o que aconteceu no Fleet Rock. No dia em que você terminou a guerra.”

Execução Pública | Arte de Anthony Palumbo

“Eu não matei um homem,” disse Sentos com os dentes cerrados. A dor é apenas fraqueza deixando o corpo. Ela torceu a lâmina, e ele sentiu um jorro de sangue quente saindo do rasgo na pele. Ela não entende a mente de um guerreiro. Uma vez que ela me faz odiá-la, a dor se torna irrelevante.

“Use mais palavras, Sentos, o Que Não Morreu,” ela sussurrou.

“Eles levaram um homem de cabelos brancos para o bloco do carrasco. Parecia um vagabundo das ruas de An Karras,” disse Sentos. “Ninguém me disse que ele era o falso rei.”

“Então, por que poupar a vida dele?” ela perguntou.

Por que mesmo? Por causa do anel que agora pesava em sua mão. Por quê? Ele me ofereceu o anel para poupar sua vida. Por quê? Porque um anel para minha linda esposa parecia melhor do que um balde cheio de sangue e outra cabeça rolando pelo chão.

“Por que me torturar por uma resposta?” Ela não era uma sobrevivente do leste. Uma oriental teria o assassinado por chamar o homem de cabelos prateados de falso rei.

Ela arrancou a lâmina do lado esquerdo de sua espinha e a enfiou do lado direito. Mas quando a fúria esquentou seu peito, a dor desapareceu. O oblívio poderia esperar até que ele quebrasse o pescoço dela com as mãos. Ele tentou girar, mas o aperto dela era de ferro. Muito mais forte do que ele esperava, ela jogou o corpo dele sobre a mesa, seu rosto esfregando nos fragmentos quebrados do frasco de veneno.

“Porque você tem algo que eu preciso.” Ela empurrou a cabeça dele para baixo com tanta força que parecia que as tábuas quebrariam sob a pressão. “Por que você poupou a vida dele?”

“Porque poderia ter sido eu naquele bloco. Ou meu filho. Ou qualquer um no meio daquela guerra miserável. Eu fiz isso por misericórdia.” Era uma mentira que ele contara tantas vezes antes, que fluía facilmente de seus lábios. Ela vai acreditar em mim porque acha que eu quero viver.

Chamado do Capitão | Arte de Greg Staples

“Era seu plano secreto usar a rendição deles contra eles?” ela perguntou. “Fazê-los abaixarem suas armas, então cortar suas gargantas?”

“Não, meus superiores viram uma vantagem que ninguém tinha planejado.” Isso não era uma mentira, e as palavras pareciam pedregulhos em sua língua. Nenhuma linha reta entre o meu coração e aquela devastação.

“Então o que eles dizem é verdade. Você é um homem justo.” Normalmente, quando alguém o chamava assim, era com deferência. Mas ele não ouviu nenhum respeito ou admiração em seu tom.

“Isso te traz paz?” Sentos perguntou, ainda a odiando, ainda imune à lâmina nas costas, ainda observando sua sombra na parede.

“Paz?” ela zombou. “Eu sou amaldiçoada. Um demônio exige pagamento. Ele exige os olhos de um homem justo.”

Ela empurrou o capuz para trás e sua silhueta se transformou quando as mechas de seus cabelos se soltaram. Uma górgona, um monstro de Xathrid, com o poder de petrificar um homem com seu olhar. Repugnado, ele recuou contra o aperto dela. Se vislumbrasse o rosto dela, encontraria o mesmo destino que o monge da clareira. Apenas um homem gentil para encontrar em meu destino.

Górgona de Xathrid | Arte de Chase Stone

“Olhos de pedra falharam,” ela sussurrou. “Olhos de homens inferiores são insuficientes. Seus olhos serão a minha salvação.”

No instante em que ela aliviou a pressão em sua cabeça, Sentos pegou um pedaço de vidro, girou e enfiou no coração dela.

Antes mesmo dele remover o fragmento, serpentes negras se derramaram da ferida. Ele se afastou da enxurrada de víboras, escorregando e caindo no chão. Elas enxamearam sobre ele, suas presas afundando e liberando veneno em seu sangue. Desesperadamente, Sentos rolou de barriga e rastejou em direção à porta. Ao seu redor, as cobras que foram pegas no olhar da górgona se transformaram em pedra. Com suas presas ainda profundas em sua pele, elas puxaram seu corpo para baixo enquanto ele avançava em direção à soleira da porta.

O pé da górgona bateu em sua nuca, prendendo-o no ninho de cobras petrificadas.

“Como você não está morto? Você não é um homem?” Ela se agachou ao lado dele, levantando sua mão com tanta força que ele ouviu seu ombro estalar. “Este anel? Onde você conseguiu isso?”

Do falso rei em Fleet Rock, aquele homem de longevidade e sabedoria sobrenatural. Ele me ofereceu em troca de sua liberdade. Eu não acreditei nas mentiras dele. Mas ainda assim, lhe devolvi a sua liberdade em troca da bijuteria.

Anel de Xathrid | Arte de Erica Yang

Com sua lâmina, ela cortou fora o dedo dele, pegando o anel para ela.

“Um anel que concede vida eterna,” ela murmurou. “Desaparecido por tanto tempo, mas aqui? Em Thune?”

Sem o anel, o veneno tomou seu coração. O sangue fluía livremente de suas feridas. Ele lutou para respirar enquanto a porta parecia estar a quilômetros de distância de seu alcance. Fugir é inútil. Em vez disso, Sentos virou o pescoço e fitou o rosto da górgona. Ela uivou, descendo o gume da faca para tomar seus olhos enquanto ele ainda era carne. Mas ele ouviu a ponta de sua lâmina encontrar a pedra de seu rosto. E se alegrou quando a escuridão caiu.

Traduzido por Blackanof

Comentários

Review Text

Testimonial #1 Designation

Review Text

Testimonial #2 Designation

Review Text

Testimonial #3 Designation

Magic the Gathering é uma marca registrada pela Wizards of the Coast, Inc, uma subsidiária da Hasbro, Inc. Todos os direitos são reservados. Todas as artes e textos são de seus respectivos criadores e/ou da Wizards of the Coast. Esse site não é produzido, afiliado ou aprovado pela Wizards of the Coast, Inc.