Mtg Lore
Compêndio da Lore de Magic the Gathering
EPISÓDIO 05: JURAMENTOS QUEBRADOS
K. Arsenault Rivera
Escreveu os arcos de Innistrad: Caçada à Meia-Noite, Voto Carmesim e Marcha das Máquinas.
O pequeno Kellan chega às ruínas do castelo. Embora as ações tomadas por ele e Rubi tenham lhes garantido os pôneis de presente, ele não se sente heroico em sua nova montaria. Longe disso. Enquanto ele observa as colinas e vales outrora orgulhosos ao redor do Castelo do Vale Arden, tudo o que ele sente é resignação.
“Você está pronta?” ele pergunta a Rubi.
Ela está em cima de seu próprio pônei, vestida com sua cor homônima, sua capa esvoaçando sobre o flanco dele. Há uma boa razão para tal exibicionismo: uma lâmina de gelo eterno se esconde sob o tecido. Hylda achou o pedido de Rubi por uma espada “tão grande quanto ela” encantador em vez de ridículo. Com o último resquício da magia da coroa, ela concedeu a Rubi o presente — e Rubi estava mais do que feliz, na maioria dos casos, em se gabar sobre isso.
Ela não está se gabando disso agora. Quem poderia, vendo a tristeza no rosto de Kellan? “Sim, estou pronta. Mas se você precisa de mais tempo para falar sobre isso-“
“Eu não preciso,” Kellan diz. “Vamos fazer a coisa certa, e é isso.”
Nenhum inimigo os desafiou ao longo do caminho até os portões do Vale Arden. Um silêncio estranho havia se espalhado pelas planícies. Kellan já sentira isso antes com a aproximação de uma tempestade, o gado recuando horas antes das pessoas saberem o motivo.
Ao enxergarem o estado deteriorado das portas diante deles, a sensação torna-se algo palpável, algo racional: a tempestade proverbial que os consumirá arrancou a porta de suas dobradiças; o coração apodrecido e corrompido da maldição consumiu a madeira; os sonhadores que espreitam por trás dela são os pesadelos que atormentaram Kellan durante a jornada até aqui.
Este não é um lugar de socorro ou descanso, nem um lugar de glória.
É um lugar onde as feridas infeccionam.
Kellan não quer entrar. Mas deu sua palavra de que o fará, e algo em seu sangue se fixou a este juramento como tinta no escudo de um cavaleiro.
“Não podemos passar pelos guardas adormecidos,” ele diz. “Só estaríamos causando dor a eles.”
Rubi ergue uma sobrancelha. “Tem uma ideia melhor?”
Kellan coloca a mão dentro de sua capa. Em sua mão, erguido acima: a segunda garrafa de sapificação que Troyan lhes emprestou.
Rubi sorri. “Quer saber, gosto do jeito que você pensa,” ela diz. “Mas desta vez, você se segura em mim.”
Há algo no sorriso de Rubi que lembra a Kellan de tempos melhores. “Tudo bem, tudo bem. Apenas nos faça pousar suavemente.”
“Não prometo,” Rubi responde.
Kellan amarra os cavalos a uma estaca. Com dois sacos de ração, eles estarão abastecidos pelo resto do dia — se tudo der certo, ele e Rubi não precisarão de mais tempo do que isso. Depois de se despedir rapidamente dos cavalos, ele encontra Rubi na base das muralhas do castelo.
Eles estão no ar segundos depois. Rubi não é do tipo que fica esperando por um sinal.
Suas habilidades de pouso são melhores do que as de Kellan, pousando suas poderosas pernas anfíbias momentos antes de começar a voltar à sua forma humana. Eriette não deve ter esperado que alguém pularia os portões do castelo. Não há sentinelas adormecidos aqui de guarda, nenhum olhar fechado para vigiá-los.
“Tá bom, tá bom, talvez o Troyan não fosse tão ruim,” Rubi diz, mantendo a voz tão baixa quanto seus passos. “Para onde agora?”
As sobrancelhas de Kellan se juntam enquanto ele pensa. “Se eu fosse uma bruxa, eu gostaria de ter o salão do trono só para mim.”
“Hylda disse que a Eriette adorava atenção,” Rubi diz com um aceno. “Provavelmente tem um monte de gente lá dentro a alimentando com uvas e coisas do tipo.”
Kellan inclina a cabeça para ela e abre a primeira porta que vê. “Por que uvas?”
“Eu não sei. Mas são sempre uvas,” Rubi responde.
À frente deles havia um corredor amplo, escuro e sombrio, adornado com retratos desbotados e desfigurados. Os pisos e paredes de pedra deixavam o ar mais fresco lá dentro. Embora haja várias tochas em seus suportes, nenhuma está acesa. A única luz concedida a eles é aquela que entra pela porta — e a luz da maldição do sono ao longo do chão.
Juntos, os dois heróis seguem os fios violetas sinuosos pelos corredores do Castelo do Vale Arden. Passam por quartos vazios, salas de guerra saqueadas e armarinhos revirados. Seus ouvidos estão tão atentos que os guinchos passageiros dos ratos soam tão altos quanto o grito da morte de um dragão.
Assim, não é surpresa que eles ouçam os passos da mulher antes de a verem. São suaves, mas não o suficiente: o ranger de suas botas de couro, o arrastar da sola contra a pedra, até mesmo o suspiro cansado a entrega.
Kellan e Rubi se pressionam do lado oposto da porta. Rubi é a primeira a espiar, com a lâmina firme ao seu lado. Quando ela faz um gesto para que ele faça o mesmo, é com um olhar atônito.
Ele entende o por quê. Em pé diante de um púlpito e cercada por redemoinhos de nuvens de maldição está uma mulher conhecida até mesmo em Orrinshire. Rowan Kenrith, a filha do próprio Grande Rei, veio ao Castelo do Vale Arden.
Kellan não consegue evitar sorrir. Ela deve ter compreendido tudo da mesma forma que eles. Ele não consegue acreditar em sua sorte.
As boas notícias sobrecarregam seu bom senso. Kellan corre para dentro da sala, e Rubi o segue, sua espada pendurada como um brinquedo ao seu lado. “Rowan!” ele chama. Então, suas bochechas avermelham de vergonha quando ela olha para cima, ele gagueja. “E-eu quero dizer, S-Senhora Kenrith! Tenha cuidado com a maldição-“
“Quem são vocês? O que estão fazendo aqui?” ela responde. Estranho – Rowan está franzindo a testa.
“Viemos derrotar a bruxa, assim como você,” Rubi diz. “É algum tipo de feitiço que está te prendendo aqui?”
Kellan não tinha pensado nisso. Sorte que Rubi está junto; ela está sempre pensando rápido. Deve haver algo que está prendendo Rowan aqui — talvez a maldição. A forma como ela está se circulando ao seu redor, deve ser isso.
“Podemos encontrar alguma maneira de quebrar o feitiço,” Kellan oferece. Não há caldeirões aqui, nem gelo que não derrete, nem selos que ele consiga identificar. Apenas livros, varinhas, páginas soltas e frascos de tinta. Ele examina esses elementos em busca de respostas. “Eu e Rubi nos tornamos muito bons nisso.”
“Somos heróis,” Rubi acrescenta, prestativa.
Mas Rowan Kenrith não ri, nem sorri, nem sequer agradece por sua ajuda. Ela coloca as mãos em cada extremidade do púlpito. Faíscas estalam ao longo de seus dedos.
“Acho que vocês dois deveriam sair,” ela diz com uma voz fria e firme.
“Haha, digo, você provavelmente poderia lidar com isso sozinha. Mas eu preciso, pelo menos, estar com você,” Kellan diz. “Eu prometi que ajudaria a acabar com essa maldição.”
“Você pode fazer isso de fora,” Rowan diz. “Seria melhor se vocês não estivessem aqui.”
Algo em sua voz faz com que Kellan se sinta tenso. Sua língua gruda no céu da boca, e ele olha novamente para a página diante dele. Em tinta vermelho-marrom, uma caligrafia irregular soletra a verdade.
Tentativa 23. Ainda não consegui fazer ninguém dormir, exceto da maneira convencional.
Ele não tem tempo para processar o que acabou de ler, porque quando ele olha para Rowan, ela está envolta em uma luz cintilante.
A visão de Kellan fica branca.
“Kellan! Kellan, acorde! Não me faça pegar a água da prisão, eu juro que vou!”
… O quê?
Antes que ele consiga entender o que está acontecendo, ele é atingido no rosto por algo muito, muito frio; Rubi está em pé na frente dele com um balde vazio aos seus pés.
“Você voltou?” ela pergunta.
Kellan limpa a garganta. A corda que mantinha suas mãos juntas já foi cortada, provavelmente obra da espada gelada de Rubi. Mas espere…
“Onde estamos? E como você recuperou essa espada?”
“Dê uma olhada ao redor, herói. Syr Rowan nos nocauteou. Ela estava tentando fazer algum tipo de magia dos sonhos em você quando eu acordei, mas então…”
Os olhos de Kellan pousam em guardas adormecidos de bruços no chão. Metal batendo e madeira rangendo ecoam pelas escadas de pedra até sua pequena cela.
“…a cavalaria chegou. Ela foi lidar com isso, então peguei minha espada e te acordei.”
Kellan se levanta. Ele ergue as correntes sobre a cabeça e as deixa cair no chão, exceto a mais curta, apenas o suficiente para enrolar em torno de sua mão. “Ela realmente se virou contra nós?”
“Ela achou que estava te ajudando,” Rubi diz franzindo a testa. “Continuava repetindo isso enquanto estava trabalhando. Que se ela conseguisse acertar o feitiço, você estaria agradecendo a ela pelo que estava fazendo.”
“Ah tá, bem, esse não foi um sonho muito bom,” Kellan diz, soltando um suspiro. “Ela está lá em cima?”
“Acho que a bruxa também está,” Rubi diz. “Alguém gritou o nome da Rowan, e com certeza soou ameaçador.”
“Então vamos subir lá,” ele diz.
No fundo de seu coração, Rowan Kenrith sabia que esse sonho não duraria. Assim como nenhum treinamento a preparou para salvar sua família, nenhuma doce ilusão poderia estender esse alívio eternamente. Seu tempo com Eriette, estudando a magia que salvaria Eldraine, sempre esteve fadado a terminar.
Mas ela esperava ter mais do que algumas semanas.
Quando os cavaleiros de seu irmão invadiram os portões, faíscas estalaram ao longo do antebraço de Rowan. Eriette, sentada em seu trono, esforçava-se para controlar dezenas de adormecidos entre as ruínas, fios violetas voando de suas mãos para os membros dos guerreiros. Rowan lutava apenas para manter as crianças dormindo e tecer um sonho para elas. Eriette está fazendo isso em um exército inteiro.
A última coisa que ela precisa é de distração, mas o que ela pode oferecer é ajuda. Ashiok tinha deixado o Reino para cuidar de assuntos em outro lugar. Rowan é a única pessoa que Eriette tem. Pelo menos até que Ashiok retorne.
Uma falange de cavaleiros invade as portas. Para enfrentá-los, Eriette mobiliza seus sonhadores, posicionados em duas fileiras diante do trono. Ela pode ser melhor quando se trata de magia dos sonhos, mas Rowan teve lições suficientes de táticas para saber que isso vai terminar mal. Duas fileiras não serão suficientes para enfrentar uma falange desse tamanho.
“Por ordem de Sua Majestade, o Grande Rei de Eldraine, recuem!” grita uma mulher na vanguarda. Rowan estreita os olhos; a voz é familiar. É um braço de madeira? Ah — o jato de fogo sobre as cabeças dos adormecidos confirma suas suspeitas. Imodane. Claro que alguém tão tola pensaria que atirar fogo em inocentes adormecidos seria uma boa ideia. Ela foi descuidada na montanha e está sendo descuidada aqui.
Rowan se concentra nas faíscas em seu sangue, deixa-as crescer, deixa-as se acumularem. Ela libera toda essa energia em um raio assustador direcionado aos pés de Imodane. A pedra se despedaça; a fumaça sobe de um novo buraco feito no chão do castelo.
“Não há Grande Rei em Eldraine,” ela ressoa. “Vire-se e volte para o impostor, Imodane, ou vou te atirar contra as pedras.”
“Você!” diz Imodane. “O que você está fazendo aqui?”
“Ahh, Rowan,” diz Eriette do trono. “Você manterá os vermes longe para mim, criança?”
“Eles não vão atrapalhar nosso caminho,” Rowan promete subindo no pódio elevado de onde avista seu irmão e sabe que, de uma forma ou de outra, tudo isso vai acabar hoje.
Ele cavalga em cima de seu cavalo branco atrás da vanguarda, sua espada desembainhada. Gelo cobre suas ombreiras e braçadeiras. Apesar de cavalgar para a batalha, não tem o bom senso de colocar um elmo. Vê-lo… Vê-lo é ver todas as partes que ela menos gosta em si externalizadas em outra pessoa.
Pior ainda quando ele estreita os olhos, quando chama com a voz cheia de incredulidade e dor, “Rowan? O que você está fazendo?”
Há um nó na garganta dela, uma dor indescritível, quando seu irmão a olha daquele jeito. Como se tivesse medo dela. Como se ele quisesse que ela fosse algo diferente do que é, que acordasse um dia e voltasse a ser a mulher que ele conheceu antes. Quando ele perceberá que a Rowan que ele conheceu está morta?
“Estou aprendendo como salvar o Reino,” ela diz.
“Escute a si mesma. Trabalhando com bruxas? Amaldiçoando o Reino? Isso não é você,” ele diz. É isso que ele acha que um Grande Rei deve ser — um homem à beira das lágrimas em cima de seu cavalo de guerra? “Por favor, volte para casa.”
Ela quer que ele entenda. Ela quer tanto que ele entenda que ela nunca mais vai ficar bem novamente.
Mas ele não vai entender.
Ela está avançando contra eles antes de saber o que fazer. Sua espada afasta escudos e quebra lanças. No meio da confusão, seu sangue canta. Aqui, cercada pelas pétalas florescentes do aço, está livre de qualquer pensamento, exceto aquele que anima seus membros. Parar, contra-atacar; esquivar, explodir.
Quando ela alcança seu irmão, já há sangue em sua armadura. Ela ergue sua espada na direção dele, ele em seu cavalo, e o desafia a desmontar. “O lar se foi, Will!”
Olhos calmos a estudam. Quando seus pés finalmente tocam o chão, seus ombros estão curvados pelo peso de suas preocupações. Ele não saca nenhuma arma. “Não, não se foi. Hazel e Erec precisam de nós…”
Ele está falando com ela da mesma forma que falou com Imodane. Sua própria irmã. Ela não suporta mais um segundo disso. “Nossos pais estão mortos, o Reino está arruinado, e você está agindo como se falar sobre isso fosse ajudar. Não vai! Falar nunca vai ajudar!”
Um golpe brusco em seu peito o convencerá a erguer sua espada. Mesmo Will não consegue competir com um argumento tão convincente — ele ergue sua própria lâmina para se defender. Não o ajuda muito. Rowan é mais forte do que ele. Ela sempre foi mais forte.
Sob uma série implacável de golpes, ele é repelido, passo a passo, seus guerreiros se afastando para deixá-lo passar. Seja porque ele deu uma ordem ou porque eles a temem, os outros cavaleiros fazem pouco para deter Rowan.
A única coisa que a detém é um raio de gelo. Will consegue lançar o raio entre os golpes: ela não percebe que seus pés estão congelados ao chão até tentar movê-los novamente.
Rowan recupera o fôlego. Enquanto a batalha continua ao redor deles — cavaleiro contra sonhador, amigo contra amigo — seu irmão luta contra as lágrimas.
“Ro, me desculpe,” ele diz. “Eu não te ajudei quando você precisou.”
Não é o que ela estava esperando dele. Há uma sensação aguda no canto de seus olhos, uma dor em seu peito. Uma flecha voa sobre sua cabeça, acertando um sonhador atrás dela. Ela não pode olhar para Will por muito tempo, senão não conseguirá falar. Ela olha rapidamente sobre o ombro em direção a Eriette.
Mas não é apenas Eriette que ela vê. O coração de Rowan afunda. As crianças devem ter se soltado. Pior do que isso, elas estão atacando o trono. A garota de vermelho está balançando uma espada duas vezes maior que ela em direção a Eriette; o menino luta com um chicote de videira dourada.
Eriette pode ser uma bruxa poderosa, mas não é uma lutadora. Não vai conseguir lidar com as crianças e animar os sonhadores ao mesmo tempo.
Rowan olha para Will novamente. Ele está franzindo a testa agora. “Você quer salvá-la?”
“Ela é nossa tia. Essa magia sempre esteve em nosso sangue, Will,” Rowan diz e fica surpresa com o quão jovem soa. “Podemos usá-la para salvar Eldraine. Ninguém mais precisa sofrer, ninguém mais precisa morrer. Podemos mantê-los seguros.”
Por um momento, ela confunde a mágoa em sua expressão com simpatia. É o momento mais longo de sua vida — um comprimento de esperança amarrado em volta do pescoço com uma caixa sendo chutada de debaixo dela.
“Eu não te reconheço mais,” ele diz.
Faíscas se unem nas pontas dos seus dedos. Rowan dispara contra a vanguarda novamente, criando outra fenda no chão. Outra onda de raiva, outra onda de frustração, outra onda de dor. Uma e outra vez ela dispara contra seus antigos amigos infiéis. Todas essas pessoas que sabiam o quanto ela estava sofrendo e a deixaram apodrecer, todas essas pessoas que a viram sangrando e jogaram sal na ferida — que agora conheçam seu poder.
Somente quando a poeira de sua raiva se acalma é que Rowan solta um suspiro.
E ali, onde ela espera vê-los derrotados, vê um casulo de gelo. Marcado e rachado por cicatrizes, ainda resistindo diante de seus ataques.
Will o desfaz com um gesto. “Isso não vai funcionar.”
“Você não sabe!” Rowan responde, desesperada e sem fôlego, não conseguindo se conter de avançar contra ele. Sua espada terá sucesso onde sua magia falhou — ela tem certeza. Will nunca poderia se igualar a ela no campo de batalha.
Ela desfere um golpe nele, mas uma familiar mão de madeira segura sua lâmina. Imodane a empurra para trás e Rowan tropeça.
“Você não entende, não é mesmo, garota?” Imodane rosna. Perder uma arma não parece tê-la detido. Ela soca seu punho de madeira na palma da mão de Rowan. “Ele é o único que vai reunificar o Reino. Até eu consigo ver isso agora.”
“Não tenha tanta certeza.”
Gelo contra a nuca; fumaça nos pulmões; uma névoa que ameaça levá-la para algum lugar bonito e distante. Véus negros se unem na forma elegante de Ashiok diante do exército aglomerado.
Rowan não consegue evitar um sorriso. Eriette pode ter tido dificuldade em controlar tantos de uma vez, mas para Ashiok isso é algo natural. Os sonhadores aglomerados atacam com nova elegância, desviando dos golpes que vêm em sua direção e desferindo os seus próprios com precisão feroz.
“Will não é o único com amigos,” Rowan responde a Imodane.
Eles não podem lutar facilmente contra isso. Ashiok, no centro, está cercado por todos os lados pelos seus sonhadores, e os sonhadores estão mais do que dispostos a se defender. A falange deve quebrar se eles quiserem atacar.
Imodane envia um soco na direção de Rowan. Ela não se dá ao trabalho de desviar — seu nariz quebra, o mundo ao seu redor gira, o sabor de cobre enche sua boca. Vale a pena, se isso a levar mais perto. Porque há algo que Rowan sabe e que eles não: os cavaleiros não podem vencer Ashiok. Tudo o que ela precisa fazer é resistir o tempo suficiente para que Eriette coloque todos para dormir.
Rowan golpeia o cabo de sua espada no rosto de Imodane. Um momento de concentração é suficiente para canalizar faíscas pela armadura da cavaleira. Ela uiva, se afastando da luta para tentar arrancar sua cota de malha, mas Imodane não é a única inimiga que Rowan enfrenta. Pelo menos uma dúzia de cavaleiros se reuniram para defender seu irmão enquanto os outros seguram os sonhadores.
Treze contra um.
Rowan gosta dessas probabilidades.
“Essas pessoas estão aqui porque acreditam na mesma coisa que nossos pais: em uma Eldraine unificada. Você não pode forçar as pessoas a fazerem o que você quer!” Will diz.
“Você só está dizendo isso porque sempre foi fraco demais para conseguir,” Rowan responde. “A diplomacia teria impedido Oko? Os Oriq?”
Três dos guardas de Will desabam ao redor dele, seus corpos se juntando ao monte de adormecidos. Um ataque vindo de um dos outros dá outra chance a Rowan, que avança na direção do golpe, desviando no último segundo. Com a distância encurtada, ela consegue golpear o cabo de sua espada na têmpora do cavaleiro. Sangue cobre as juntas dos dedos enquanto seu oponente desmorona.
No meio do caminho.
Ao longe, ela vê um flash dourado entre a fumaça de Ashiok. O menino de antes, balançando um tipo de corrente dourada. Pequeno como é, ele conseguiu se soltar.
Vai lá, então. Ele é um garoto contra Ashiok. O que ele pode fazer? Os arcos dourados do seu chicote improvisado podem ser chamativos, mas não o salvarão. Falar também não o ajudará. Ela volta sua atenção para Will.
“Se você tivesse conversado com os phyrexianos, Will, você acha que nossos pais estariam vivos agora?” Ela se lança sobre Will mais uma vez.
Durante anos eles brigaram, há anos eles conhecem a mente um do outro. Ela sabe cada truque que ele tem, mas ele também conhece os dela. E de costas para a parede, ele está desesperado. Resfriando o ar ao redor dela, conjurando escudos no último segundo, congelando o chão para fazê-la perder o equilíbrio. “O poder importa tanto para você?”
“O poder é a única coisa que importa.” Ela corta o cotovelo dele com sua lâmina; ele derruba a espada. Um dardo vem em seu caminho, mas um dos sonhadores se joga na frente. O contra-ataque – uma martelada no joelho – também derruba o assassino. “Agora você entende? Traga quantas pessoas você quiser, Will. Não vai importar. Olhe ao seu redor, seu exército adormeceu.”
Will, como bom discípulo, faz o que ela disse. Rowan o observa enquanto ele percebe que não há como escapar. Ele solta um último dardo de gelo sem esperança, um que ela se desvia facilmente.
“Acabou.”
Mas então Will começa a sorrir. “Qual era a frase? ‘Não tenha tanta certeza’?”
É o truque mais antigo de todos, mas ela cai, virando-se para olhar atrás dela.
O dardo atingiu seu verdadeiro alvo: o peito de Ashiok.
O garoto não estava tentando vencer Ashiok, agora Rowan entende. Ele só queria prendê-lo tempo suficiente para Will atacar. E foi um ataque potente; Rowan raramente vira Will colocar tanto de si em um dardo de gelo.
Ashiok solta um grito de dor enquanto o gelo se espalha por seu corpo. A fumaça o engole, e depois ele desaparece. Ainda tem a centelha, Rowan percebe subitamente, com uma sensação de inveja.
A fumaça sai bem a tempo de ver a garota pressionar sua lâmina contra a garganta de Eriette.
O coração de Rowan salta para a garganta.
Neste momento de aflição, Eriette permanece calma e recolhida. Através das ruínas da sala do trono seus olhos encontram Rowan. Um único fio da maldição – dificilmente notado – as conecta.
Saia daqui, Eriette diz para ela. Quando chegar a hora, nos encontraremos de novo.
Rowan caminha em sua direção. Não posso perder mais ninguém.
Você não está perdendo ninguém. Eles não vão me matar, querida. Eles são muito bondosos. Nós aproveitamos o nosso tempo.
O fio se quebra. Nas reentrâncias de sua mente ela está sozinha, vendo mais uma vez alguém com quem se importa sendo mantida à espada.
Se ela não seguir o conselho de Eriette, então seu irmão certamente vai levá-la. Ele vai aprisioná-la, e haverá um interminável desfile de curandeiros e tolos de bom coração para falar com ela. Para tentar entendê-la. Enquanto isso Eldraine permanecerá dividida, pois apesar de Will ter reunido um exército de muitas cores aqui, ele não reuniu todos. E se ela finalmente ceder, se ela fingir que está bem, ele permanecerá como Grande Rei e ela…
Ela sempre será a mulher que se rebelou. Pior, sempre será a mulher que ele graciosamente perdoou.
Não. Não tem como retroceder, não há como voltar para casa.
Mas há o suficiente para mais uma explosão.
Rowan Kenrith respira fundo. Como tinha aprendido em Strixhaven, ela deixa seu poder estalar através dela em surtos de luz.
“Rowan!” Will grita.
Ele se preocupa com ela. Mas ele ainda tem medo dela, e esse é o problema.
É difícil controlar seu poder quando há tanto. Ainda assim, ela tem que tentar. Franzindo suas sobrancelhas, mordendo os dentes, ela torce a energia quando ela a deixa – em vez de apontar para frente, ela mira para baixo.
Um boom mais alto do que a queda de um gigante.
Rowan está no ar.
Daqui de cima ela pode ver os fios da maldição se unindo, uma teia de aranha centrada em torno do castelo.
O que foi que Royse disse a ela? Se você não fizer tempo para o descanso, ele virá a você quando você menos esperar.
É o mesmo para Eldraine. Quantos golpes eles sofreram até agora? Quantos sonhos despedaçados? Para serem fortes de novo – se unificarem – eles precisam forjar esses sonhos novamente.
Eles precisam descansar.
Assim como Rowan.
Um dia, ela trará aquela magia adormecida para o resto de Eldraine.
Na sequência, há muita coisa para Kellan organizar.
O Grande Rei Kenrith leva ele e Rubi ao seu lado. Ele diz que nunca conheceu crianças mais bravas do que elas, que são convidados a vir ao palácio quando quiserem, que serão recebidos como membros da família. Mas seus olhos estão nublados quando diz tudo isso, e ele não consegue parar de olhar para o horizonte. Kellan acha que está procurando Rowan. Se fosse ele – se fosse sua irmã que tivesse feito tudo isso – era o que faria. Então ele não culpa o Rei Kenrith por estar um pouco distante. Isso deve estar doendo.
Rubi aceita a oferta, contanto que possa levar seu irmão. O sorriso do rei se quebra. Ele concorda. Sim, ele adoraria ter a visita dela e de seu irmão, dos dois.
Enquanto eles fazem seus planos, Kellan foge. Há algo mais que ele tem que fazer. Sua amiga merece todos os prêmios que puder receber. Enfrentar uma bruxa com uma espada de gelo? Esse tipo de coisa rima bem em uma história. Edgewall estará forrada de capas vermelhas por muito tempo. Deixe-a se divertir; o que ele tem que fazer só vai levá-la para longe da glória que merece.
Fora do Castelo do Vale Arden, ele entra no Mundo Fada.
Uma fazenda sonolenta fora de uma vila sonolenta. Um lugar que sabe lutar apenas contra o clima e o solo. Aqui, entre os pastos e pastagens de Orrinshire, não se fala de heróis.
O silêncio é estranho aos ouvidos de Kellan enquanto caminha pelo caminho batido para a fazenda familiar. Ele nunca foi tão grato por berros distantes e machados cortando madeira. Depois de tudo que passou, o silêncio se encaixa nele como um casaco encolhido. Esse lugar todo é assim.
Quando ele passa pelos meninos Cotter, eles olham para ele da mesma forma. O pior é que parte dele ainda os teme, mesmo quando sabe que não deveria. Mas Kellan sabe que agora é forte o suficiente. Ele se mantém de cabeça erguida, passa por eles, e quando não fazem nada para prejudicá-lo, solta o fôlego.
Hex é o primeiro de sua família a cumprimentá-lo. Percorrendo as fileiras de nabos bem plantados ele vai deixando um rastro de baba, farejando um cheiro familiar. Quando Hex lambe sua bochecha, Kellan dá um pequeno suspiro de alívio. Não importa onde ele esteve ou o que descobriu sobre si mesmo, Hex ainda sabe quem ele é.
Kellan carrega o cão em seus ombros enquanto sobe a colina. Hex não vai parar de latir, é claro, então não demora muito até sua família ouvir que algo está acontecendo. Ronald emerge de perto da casa, um machado pendurado em seu ombro. Ele o derruba ao ver Kellan. “Querida! Querida, ele voltou, nosso garoto está de volta!” grita.
Ronald corre para ele e Kellan está tão envolvido nos braços de seu padrasto que não percebe a chegada de sua mãe até que ela tenha abraçado os dois. Virando-se sobre os campos, o berro suave das ovelhas em suas orelhas e o gosto tênue da terra em sua língua, a voz de sua mãe e o aperto forte de seu padrasto – sim, depois de tudo isso, ele finalmente está em casa.
Eles o acolhem. Insistem nisso. Lágrimas felizes escorriam pelo rosto de sua mãe. Ela o presenteia com um casaco que fez para ele. Há quanto tempo ela está tecendo fios para isso? Como ela poderia ter terminado no tempo que esteve fora? Cada fio é vibrante e bonito, do mais profundo azul ao amarelo mais brilhante. Na parte dourada ele fica chocado ao encontrar o fio de ouro em si. Só as cores e o material empobreceriam a aldeia – mas os detalhes fariam até mesmo uma cidade como Edgewall mendigar. Há alces bordados por todos os lados, saltitando entre os olmos e faias ao redor de Orrinshire. Ao longo dos punhos estão primaveras floridas; abaixo de um bolso, uma menina senta-se diante de uma lagoa de água limpa, seu reflexo olhando de volta para ela. E o forro! Aqui ele vê a garota novamente, seguindo um homem cuja pele está listrada com azul.
A mandíbula da Kellan está tensa. Ele joga os braços em volta da mãe de novo. “Isso é tão bonito, mãe, mas não posso aceitar. Não posso usar isso por aí! Pode estragar!”
Ela ri, alisando seu cabelo para longe do rosto. “Foi muito gentil da sua parte dizer isso, Kellan, mas eu usei magia.”
Kellan olha para o casaco de novo. Ele pressiona os dedos sentindo o tecido, como se a mágica fosse uma coisa que pudesse ser sentida como sulcos em um instrumento. “Sério?”
“Bem, sua mãe não passou cinco anos como aprendiz de bruxa por nada,” ela diz sorrindo. “Ronald, você pode fazer um chá para nós?”
“Claro. Mas primeiro eu vou ter que ir buscá-lo nos Browns, eu ouvi que Gretchen conseguiu essa coisa nova em…”
Ele já está vestindo seu próprio casaco – muito menos caprichosamente feito – e indo para fora da porta. Quando fecha atrás dele, Kellan levanta uma testa em sua mãe. “O que está acontecendo.”
“Você ficou mais esperto, não foi?” sua mãe diz, olhando para o casaco.
Kellan se senta em frente a ela na mesa de jantar. Ele não se sente muito mais esperto, mas acha que tem uma ideia do que está acontecendo. Ainda assim, quer que ela fique confortável. “O que você quer me dizer?”
“Sobre seu pai e eu,” ela diz. “Seu pai biológico. Eu tenho certeza de que o Senhor das Fadas lhe disse o que sabe dele, mas eu pensei que você poderia conhecê-lo como eu.”
Kellan sorri. O coração dele está acelerado. “O Senhor das Fadas não me disse nada sobre ele.”
“Ele não disse? Mas a sua missão…”
“Eu disse a ele que queria ir para casa, para ouvir a sua história,” Kellan diz. “Quando você achar que estou pronto.”
O silêncio passa como lágrimas bem nos olhos de sua mãe. Ela aperta a mão dele, e ele aperta a dela, e quando está pronta, ela começa.
“Conheci seu pai durante meu treinamento,” ela diz. “Estava na floresta, colhendo beladona, quando encontrei um homem deitado entre as flores como se elas não representassem nenhum perigo. Quando me convidou para se sentar com ele, achei que ele devia estar brincando, mas ele ofereceu me dar toda a beladona que eu quisesse em troca de apenas uma conversa. Sabendo que era um ser das fadinas, fiz ele prometer que era apenas uma conversa, e então… conversei com ele. Ele me disse que se chamava Oko, e me contou que tinha acabado de chegar em Eldraine. Que não era de nenhum dos Reinos que eu já tinha visto. Queria saber mais sobre o lugar, e saber de uma garota bonita, era ainda melhor.”
O homem com listras azuis no forro do casaco chama novamente sua atenção. Oko. Seu pai. Um homem entre as flores de beladona.
Sua mãe suspira com um toque de sonho. “Foi a primeira vez que alguém disse que eu era bonita. E achei a ideia de Reinos além do nosso tão emocionante que, naturalmente, fiz mil perguntas a ele. Graciosamente, ele me entreteve com respostas, contanto que eu lhe contasse algo sobre Eldraine em troca. Por horas, ficamos sentados assim, conversando entre as flores, até… percebemos que precisaríamos nos encontrar novamente.”
“Outro Reino… Ele disse como era chamado?”
“Ele disse, embora sejamos sinceros, o nome tenha escapado há muito tempo da minha memória,” sua mãe diz. “Mas ele disse que era uma terra onde as fadas reinavam supremas. Ele achava a ideia de que os humanos as desafiassem muito engraçada e lamentava não poder confrontar Lorde Talion diretamente. Claro, todos os jovens falam assim, e nós dois éramos jovens naquela época.”
Ela se inclina para trás em seu assento.
“Nos anos seguintes, eu ouviria a voz dele em corvos, ou árvores, ou às vezes até em produtos assados, e eu sabia que isso significava para encontrá-lo no vale da beladona. Ele veio até mim de muitas formas e me contou muitas coisas. Mostrou-me muitas coisas. Sem a ajuda do seu pai, eu nunca teria escapado da minha mestra – ele me fez sentir tão ousada e esperta. Por um tempo, foi maravilhoso. Nós dois íamos para onde queríamos e fazíamos o que queríamos. Eu aprendi mais sobre magia com ele do que com ela. Ele sussurrou para mim os segredos da terra e me prometeu um trono. Os problemas começaram depois. Embora eu tivesse sido libertada, ninguém na cidade queria ter nada a ver comigo. Uma vez bruxa, sempre bruxa, dizia o ditado. Seu pai… ficou muito chateado com isso,” sua mãe disse.
“Parte de mim achava encantador que um homem se importasse tanto comigo. Eu queria ir embora com ele, mas ele não podia me levar. E ficar aqui estava o afetando. Eventualmente, ele… machucou pessoas que tinham sido cruéis comigo, e eu percebi que não podíamos continuar como estávamos. Não importava o quanto eu o amasse. Eu não estava destinada a ser uma rainha, entende? Depois de toda aquela luta, eu queria paz, mas ele queria arrasar este lugar até o chão por me ofenderem. Ele me visitou novamente há três anos. Eu o ouvi me chamando enquanto estava fiando uma noite. E embora a garota dentro de mim quisesse ir até ele, a mulher que me tornei sabia o que eu estaria abrindo mão se fizesse isso. Eu sou muito mais feliz aqui com você.”
Kellan ouve atentamente, muito concentrado para interromper, olhando o casaco repetidamente.
“Você poderia me contar mais sobre ele?” Kellan pergunta. “Sobre como ele era.”
O sorriso de sua mãe é só um pouco triste. “Claro. O que você quiser saber.”
Ele não consegue dormir. Há muita história dentro de sua cabeça. Muitos rostos de seu pai olhando de volta para ele. Ele se pergunta quantas vezes já o viu. Sua mãe disse que ele gostava de mudar de forma, então talvez eles já tenham se encontrado.
Mas se isso aconteceu, por que ele não se apresentou?
Essa é a pergunta que o impede de descansar, como uma ferradura mal colocada impede um cavalo de correr. Isso dói. A pergunta continua voltando para ele: Por que você não falou comigo? Eu não sou bom o suficiente?
Ele não tinha sido corajoso o suficiente para perguntar a sua mãe.
Com a falta de sono, ele decide fazer uma caminhada. Talvez isso desloque os pensamentos de sua cabeça traiçoeira. Talvez doa menos. Ele desce, envolvendo-se em seu belo casaco novo, para a escuridão e as terras selvagens.
Elas costumavam assustá-lo. Agora ele as conhece melhor. As florestas nunca o trairão, desde que seu sangue cheire a pinheiro.
Hex o segue. Ao contrário das outras noites, Kellan não consegue pensar em nada para dizer ao seu velho amigo. Falar seria piorar as coisas; se ele abrir a boca, tem certeza de que terá apenas perguntas. E ele não deveria fazer perguntas a um velho cão farejador.
Mas Hex tem suas próprias maneiras de ajudar. Apenas cinco minutos depois, ele dispara, como se tivesse captado um cheiro. Kellan não pode fazer nada além de correr atrás dele. Sua respiração forma uma névoa no frescor da noite; a luz da lua brinca sobre sua pele.
Sobre os galhos, passando por um bosque de teixos que arrepiam sua pele, ele finalmente alcança Hex. Ele late uma vez e assume sua postura de apontar, mirando direto para… um portal?
Deve ser o que é aquilo: uma série turbilhonante de triângulos entrelaçados, algo como um espelho embaçado, erguendo-se livremente sob os galhos balançantes das árvores. Não se parece em nada com os portais para o reino de Talion. O outro lado não se parece em nada com Eldraine.
O fôlego de Kellan fica preso em seu peito. Troyan lhe contou sobre outros Reinos. Sua mãe também tinha repetido as coisas que seu pai lhe havia contado sobre eles.
E se isso for a maneira dele de se comunicar? E se isso for um teste? Seu pai habitava em algum lugar além de Eldraine. E se ele vive lá, do outro lado? Kellan poderia perguntar por que passou tanto tempo sem que eles se encontrassem. Talvez saibam dele lá.
Ele avança.
Será apenas uma rápida olhada ao redor. E ele se lembrará do caminho de volta. Não vai dar problema, certo? Ele não está realmente deixando sua casa, está apenas fazendo uma viagem para algum lugar. Não é diferente de ir ao mercado.
Ele não vai sair de casa. Ele já vai voltar.
Kellan acaricia Hex e atravessa o portal.
Acorde. Nem tudo está perdido. Eu voltei para você.
A voz é fria, familiar. Eriette se pergunta por que demorou tanto para ouvi-la novamente. Quando ela abre os olhos, a cela da prisão a encara, mas também Ashiok. Fumaça sai de suas vestes evanescentes, apesar da falta de vento na sala.
“Por que demorou tanto?” ela pergunta, suas correntes tremulam quando ela fica de pé. Se os guardas do lado de fora ouvem, eles não dizem nada, nem mesmo se mexem. Sem dúvida estão sonhando com algo muito mais agradável do que guardá-la.
“Era necessário fazer preparativos,” responde Ashiok.
“Onde está Rowan?” ela pergunta. “Esperando lá fora?”
Os lábios de Ashiok se apertam. “Ela ainda não está pronta para o que deve ser feito.”
Eriette franze a testa. “Se você der a ela a chance de aprender, tenho certeza…”
“A oportunidade nos chama em uma nova direção. Uma longe daqui. Você aprenderá muito, e se desejar, pode voltar para educá-la. Até lá você terá uma série de servos para cuidar de sua nova rainha.”
Bem. Isso certamente acalma as coisas. Rowan ficaria bem sozinha por um tempo — e se Eriette garantisse um novo território para elas, melhor ainda. Ela levanta as mãos acorrentadas.
A mão de Ashiok paira sobre as algemas. “Você ficará longe daqui, Eriette. Muito longe.”
“Longe de uma cela de prisão? Meu bem, isso é algo bom,” ela diz.
Ashiok não ri. Nunca.
A escuridão envolve a cela. Correntes caem no chão de pedra. Na manhã seguinte, quando eles procurarem na cela, ela terá desaparecido.
Traduzido por Rissa Rodrigues
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