Mtg Lore

Compêndio da Lore de Magic the Gathering

MARCHA DAS MÁQUINAS | EPISÓDIO 07: INTERVENÇÃO DIVINA

K. Arsenault Rivera

Escreveu os arcos de Voto Carmesim e Innistrad: Caçada à Meia Noite

Diga a ela para não me seguir. Nenhum de vocês. Nunca.

A primeira vez que Karn tentou resolver o problema phyrexiano de Mirrodin, ele deixou um recado para não ser procurado. Foi uma decisão consciente. A corrupção estava tomando conta dele. Mirrodin caiu por causa de Karn. Em sua arrogância, ele moldou o Plano; em sua soberba, ele deixou uma de suas próprias criações no comando; em sua ignorância, ele rastreou o óleo phyrexiano por todo o plano. Se ele estivesse mais presente, poderia ter percebido que Memnarca havia se perdido. Se tivesse prestado atenção, poderia ter visto o óleo pingando em seu rastro. Mas ele não estava presente e não estava prestando atenção, e a queda de Mirrodin esmagou qualquer um que vivesse nele. Não me sigam, ele disse aos outros, porque tudo isso era problema dele, e resolvê-lo iria matá-lo.

E ele estava certo. Se não fosse por Venser sacrificar sua centelha, Karn estaria morto. Um inventor brilhante, contador de piadas horríveis e uma pedra no sapato para a maioria dos que o conhecia, Venser fazia parte do grupo que veio encontrar Karn quando ele estava no auge da phyresis. Koth e Elspeth repeliram as legiões inimigas por tempo suficiente para ganhar tempo até Venser encontrá-lo nas profundezas do núcleo de Mirrodin. Melira tornou Venser imune à corrupção, e Venser…

Mais de uma vez Karn jurou que honraria a memória de Venser. Venser tinha visto algo nele, algo pelo qual valia a pena morrer. Se Karn se deixasse morrer, estaria traindo aquela esperança.

O que tornava sua situação atual ainda mais dolorosa. Amarrado a um pedaço flutuante de escória erguido pelo coro de Norn, feito do mesmo material que o impediu de transplanar nas Cavernas de Koilos, o que parecia anos atrás, ele tem a visão perfeita do fim do Multiverso. A maior parte do seu corpo foi levada para ser usada como sucata. Karn costumava se perguntar por que ele podia sentir dor. “As pessoas são menos propensas a machucar algo que grita,” Urza disse. Que pena que phyrexianos não são pessoas. Karn está em agonia. Ele não tem escolha a não ser abraçá-la, remodelá-la, torná-la algo útil: uma âncora que o manterá preso ao que resta deste corpo. Enquanto puder sentir essa dor, ele é ele mesmo.

E cercado pelo triunfo de seus fracassos, parece apropriado.

Este é o fim – de suas criações, do Multiverso, dele.

Conhecendo Norn, não será rápido. Entre as provocações intermináveis de Vorinclex e as cutucadas de Jin-Gitaxias, Karn não tem ilusões sobre o que será feito com ele. O que está sendo feito com ele. Os phyrexianos o desmontaram, peça por peça, e reaproveitaram seu corpo prateado. Vorinclex e Jin-Gitaxias têm ideias diferentes sobre a melhor forma de fazer isso, mas a ideia principal é a mesma.

E Norn?

Norn quer que ele sofra. Ele vê isso em seu sorriso cheio de presas.

“Falso Patriarca,” ela diz a Karn, “não é uma visão abençoada? Depois de todos os seus anos de tropeços, ver as alturas que escalamos sem você.”

Karn não olha para ela. Não pode. Ele tem pouco poder precioso dentro dele. Com o que resta, ele quer se lembrar de seus amigos. É o mínimo que ele pode fazer por eles. Koth senta-se com as costas retas enquanto Jin-Gitaxias avança em sua direção. Dos cativos, ele é o único a encontrar os olhos de Karn. Todos os outros têm suas razões. Chandra está muito machucada para se ajoelhar. E Melira?

Melira também não suporta olhar.

Embora seu coração doa, ele entende. Depois de tudo pelo que trabalharam, todo o tempo lutando contra o impossível, os sacrifícios e os sonhos, todos vão morrer aqui. Por causa de seus erros cometidos tanto tempo atrás. Se ele estivesse no lugar dela, também não iria querer olhar.

Seus pretensos salvadores mirranianos já perderam seus membros; alguns já estão sendo implantados e se tornando novas monstruosidades. Quando chegaram, havia dezenas deles. Agora resta apenas um punhado – Koth, Melira, Wrenn, Chandra e talvez dez ou vinte sobreviventes. Um por um, os outros foram arrastados para experimentos. Aqueles que continuam aqui estão por razões especiais de Norn.

Uma das membras do coro se estende, sua coluna se desdobrando como um acordeão para acomodar seu novo incremento. Ela pega a cabeça de Karn na mão e a segura – força-a a confrontar o rosto de Norn.

“Phyrexia te fez uma pergunta. Você deve respondê-la. Não é de admirar que você tenha falhado em nos liderar se não pode fazer nem isso.”

Karn está cansado. Ele não consegue pensar em algo para dizer.

No final das contas, ele nem precisa.

Jin-Gitaxias levanta um braço para atacar. No brilho de suas garras perversas, Karn vê os fantasmas de seu passado. Quem melhor para oferecer conforto a ele em um momento como este? Em breve ele estará entre eles, aonde quer que tenham ido.

Vai doer?

Será como adormecer? Ele sempre teve inveja do sono.

Hora de descansar.

Ele fecha os olhos – para um flash de ouro brilhar em suas pálpebras.

Um toque de clarim despedaça o chiado-trote da grande máquina de Phyrexia. As forças agrupadas têm apenas um aviso instantâneo do que está por vir – e nenhuma ideia do que pode ser. Enquanto a luz dourada engole os espectadores, Karn ouve o choque de metal. E por ter sido construído para funcionar nos ambientes mais inóspitos, ele pode ver o que apareceu no centro da onda de choque que agora balança a ponte.

Um anjo em armadura brilhante, uma lâmina dourada agora levantada para conter o ataque de Jin-Gitaxias. Ela desce do alto como a lança de um deus furioso na direção deles – e quando ela pousa, ela abre crateras no metal abaixo dela. Seu impacto joga dezenas das legiões de Jin-Gitaxias para o abismo. Os corpos delicados do coro também não foram feitos para um impacto como esse. Logo eles também mergulham no escuro, derrubando o pedaço de escória de Karn no chão.

Ainda assim, ele observa.

“Você não vai derrubar este homem,” diz o anjo.

Espere. Ele não…? Aquela voz…

Karn não é o único a reconhecê-la. A apenas um braço de distância, Elesh Norn solta um guincho agudo. “Você?!”

Arte de Denys Tsiperko

Quando a luz desaparece, Elspeth Tirel está no centro da cratera. No entanto, esta é Elspeth como Karn nunca a viu: flanqueada por radiantes asas douradas. As muitas feridas de seu passado não marcam mais seu rosto sereno.

Jin-Gitaxias recua, seus servos cerrando fileiras para proteger sua fuga. Elspeth o deixa ir. Ela está ocupada em outro lugar, colocando a mão no rosto inchado de Chandra. A luz da cura flui dela para a piromante. A carne se cicatriza novamente.

Norn já se levantou de seu trono; em sua raiva, ela o derrubou. Dois do seu coro são esmagados sob seu peso. Aos olhos de Karn, suas mortes não parecem tê-la incomodado. “Você! Você não deveria mais nos incomodar!”

Elspeth não se digna a dar uma resposta, nem olha para ela; ela mantém sua atenção em Chandra, depois em Koth. O choque em seu rosto é claro – mas também há esperança. Isso, por sua vez, acende alguma esperança dentro de Karn. Quando foi a última vez que ele viu isso naqueles olhos?

“Nós, o poder e o coração de Phyrexia, nos dirigimos a você!” Norn arremessa um pedaço do seu trono em Elspeth. Karn se prepara para a queda de Elspeth – mas ela não parece nenhum pouco incomodada quando a rocha se quebra contra sua asa.

Algo ondula pelas fileiras reunidas de Phyrexia, algo como medo, algo como choque. Seja o que for, eles não gostam. Como animais diante do fogo, eles começam a recuar, a se espalhar. Os mirranianos veem sua chance. No momento em que Koth está curado, ele enfia o punho no chão. Magma dispara de uma rachadura laranja na ponte, correndo até a base da Árvore de Invasão. “Mirrodin!” diz Koth. “Comigo!”

Mas Norn parece não ouvi-los. Ao que parece, tudo o que ela consegue pegar serve como arma: mais pedaços de seu trono, um chifre que ela quebra de um Vorinclex uivante, a cabeça decepada de um infeliz membro do coro. Ela os arremessa tudo em Elspeth. Elspeth se esquiva, corta e defende – nenhum dos golpes acerta. Norn grita novamente.

Jin-Gitaxias rasteja até o lado de Norn. “Os prisioneiros-”

“Você e Nissa lidam com eles,” Norn retruca. “Temos algo mais importante para lidar.”

“Aquele anjo?” Jin-Gitaxias pergunta. “Absurdo. Ela é apenas um entre tantos. Minhas legiões podem lidar com eles, e Vorinclex comerá tudo o que deixarmos para trás. Seria mais sábio você recuar e deixar o assunto…”

Norn o agarra pela garganta. “A dissidência é uma blasfêmia, pretor. Ela não mancha a língua dos fiéis. Nossa vontade é a vontade de Phyrexia. Cuidem disso.”

É ridículo que eles estejam tendo essa conversa. Norn deve estar perdendo o controle.

Especialmente se ela não notar Melira correndo para a plataforma de Karn. Um simples aceno para Koth e, de repente, Karn está no ar novamente. “Você vai ficar bem,” Melira diz.

Muito disso é difícil de acreditar.

Uma vez, há muito tempo, ele quase morreu em Nova Phyrexia. Foi a intervenção de seus amigos – Venser, Koth, Elspeth e Melira – que o salvou.

Agora quase todos eles estão aqui para salvá-lo novamente, e a centelha de Venser lhe dá força.

Não me sigam, ele disse certa vez a Venser.

Mas a centelha de Venser ainda estava nele e o seguiu até aqui.

Ele não podia desistir. Ainda não.

Wrenn não podia desistir. Ainda não.

Embora não haja muito de Wrenn sobrando, embora toda a sua força de combate tenha sido reduzida a apenas alguns sobreviventes quebrados, ela não pode desistir. O que importa se ela não tem mais pernas? O peso do mundo ainda está sobre seus ombros.

A chegada do anjo não é uma surpresa para ela, mas uma confirmação. Qualquer outra coisa teria sido inaceitável porque significaria que todos poderiam morrer. Alguém veio para salvá-los, e foi Elspeth em suas novas cores de outono, é claro. Ela está esplêndida, embora não houvesse tempo para apreciá-la.

Os humanos costumam se distrair com coisas brilhantes e reluzentes. Ela espera que os phyrexianos também.

“Chandra,” ela murmura. “Chandra, precisamos ir.”

O ouro dança nos olhos da piromante – ela está tão distraída com os acontecimentos quanto os outros. Até Wrenn morder a manga da roupa de Chandra e puxá-la para ela olhar para baixo.

“Não consigo mais andar. Preciso da sua ajuda,” diz Wrenn.

É toda a explicação que Chandra precisa. A realidade parece se estabelecer para ela novamente. Ela pega Wrenn. “Certo. Vamos.”

Juntas, elas saem. Os mirranianos seguem, olhando para trás a cada passo em direção à mulher que salvou todos eles – e ao exército do qual eles tinham que fugir.

Pelo menos, era isso que Wrenn achava que eles estavam admirando. “Karn!” grita Melira. “Temos que salvá-lo também.”

“Certo!” diz Koth. A placa em que Karn está é de pedra como qualquer outra – responde ao chamado dele da mesma forma que a madeira atende ao dela. A placa de Karn voa para encontrá-los. Uma enxurrada de flechas e lanças rebate na parte de trás da placa de pedra. Isso também é trabalho de Koth: ele a está usando para proteger a retirada deles.

Wrenn franze a testa. As armas não estavam realmente machucando Karn, mas isso ainda parecia uma coisa cruel. Há quanto tempo eles lutam para tomar decisões como essa?

Eles merecem paz.

Wrenn quer levar a paz para eles, mas não será capaz de fazer isso sozinha. Teferi saberá o que fazer, se ela conseguir alcançá-lo. E ele foi para algum lugar que ela não conseguirá chegar sem a ajuda da Árvore de Invasão. Ela não pode chegar lá sem Chandra, e Chandra…

“Largue a dríade e ainda haverá esperança para você, Chandra. Você é inteligente o suficiente para saber que eu vou te matar, caso contrário.”

Chandra tinha Nissa para lidar.

Todos eles. Não importa o quão rápido eles corram, nada disso vai significar alguma coisa se Nissa os pegar. E ela pretende pegá-los. A elfa está arremessando os corpos dos caídos de volta para eles, seus passos certos e inevitáveis. Wrenn gostaria de não ter se virado para olhar. Não há compaixão naqueles olhos, nem piedade, nem vestígio da mulher que um dia esteve ali.

Koth está ocupado evitando que os outros se machuquem. Karn está tão dilacerado quanto ela. A resistência em fuga – eles estão fazendo o que podem, mas o que podem fazer a uma planinauta élfica phyrexianizado não é muita coisa. Elspeth está distraindo Norn. E Chandra? Chandra não consegue machucar Nissa. Wrenn sabe disso sem precisar perguntar.

Elas precisam chegar à árvore. E elas vão. Wrenn tem certeza disso, porque se não o fizerem, todos morrerão, e isso não pode acontecer.

O que ela não consegue ver daqui é como.

Tudo o que ela tem é fé.

Phyrexia se enfurece, mas não pode quebrar a paz de Elspeth Tirel. É uma paz tão certa e sólida quanto sua armadura dourada, tão arduamente conquistada quanto suas cicatrizes de batalha. Um atrás do outro, blocos de porcelana vem voando sobre ela; ela não se mexe. Essas são as ações desesperadas de uma pessoa que sabe que vai perder.

Elspeth está acima de tudo isso agora.

Houve um tempo em que ela achava Norn assustadora. Um tempo que aqueles dentes em forma de agulha a assombraram. A voz misteriosa de Norn narrou seus pesadelos com a bravata de um falso deus. Lembre-se sempre de sua humildade, pois foi Phyrexia que te derrotou.

Elspeth não a acha mais assustadora. Ela não está mais derrotada. Na verdade, com um único bater de asas, Elspeth consegue voar acima dela. Daqui, Norn é mais uma boneca enorme do que uma ameaça ao Multiverso. Tudo parece menor agora. Mais longe. Toda a impureza da vida de Elspeth foi eliminada, deixando apenas a verdade.

Arte de awanqi (Angela Wang)

E a verdade é que Phyrexia não vencerá hoje.

Abaixo dela, os mirranianos fogem em direção à árvore. Koth cobre a retirada com Chandra na vanguarda, Wrenn em seus braços. Amarrado a um pedaço de escória está Karn – que a observa com pura admiração. Embora ele esteja em um estado lamentável, ela se vê sorrindo para ele. Depois de todos esses anos, eles finalmente vão consertar tudo.

Desde que Elspeth consiga garantir a segurança deles até lá. Ela tem que parar Nissa. Wrenn tem que alcançar aquela árvore.

Mas há um assunto mais urgente para atender – alguém que não quer que ela fuja.

Furiosa, Norn avança para Elspeth, com as garras estendidas. Ela puxa Elspeth do ar por uma perna pendurada e a joga contra o chão. “Você não vai estragar nosso momento de triunfo!”

Os ouvidos de Elspeth zumbiram; sua visão ficou embaçada. Ela pisca. Norn se eleva acima dela mais uma vez.

“Nós nos dedicamos a esta causa incondicionalmente. A salvação do Multiverso é nossa vocação honrada. Como você ousa se opor a isso?”

“Eu tenho minha própria vocação,” Elspeth responde. Ela se levanta, poeira caindo de sua capa. “E você não vai me impedir.”

A risada de Norn é suficiente para gelar o sangue. “Sua vocação é falsa,” ela começa. Enquanto ela fala, os corpos dos phyrexianos caídos se levantam e se aglomeram ao redor dela. Pedaços voam de suas formas flácidas: cacos de metal, cacos de osso; lâminas e navalhas; dentes e tubos. Deformando-se pela união das partes, Norn tece para si uma nova armadura hedionda. “Em todos os Planos, há apenas uma verdade eterna e imaculada: todos serão um. Qualquer um que se interponha no caminho da unidade estará no caminho de um futuro perfeito.”

Elspeth olha por cima do ombro. Os outros estão fugindo, e Nissa parou para espreitar na direção deles. Ela não pode se dar ao luxo de ficar aqui e ouvir o discurso de Norn. Elspeth concentra-se em sua lâmina: a dourada e crepitante Mensageira dos Deuses. Esta é apenas uma cópia da espada verdadeira – mas é a cópia dela. Ela sabe que vai funcionar com ela. Um pouco de foco é tudo o que é necessário para lançar um raio de luz sobre Norn. Pedaços da armadura caem, incinerados pelos raios purificadores da espada. Um buraco fumegante se abre no ombro da pretora. Desta vez, Norn não grita. Em vez disso, ela levanta uma mão com garras. Os corpos dos soldados caídos ao redor delas – aqueles já despojados de suas partes úteis – erguem-se novamente para cercar as duas lutadoras.

“Phyrexia nunca cairá,” Norn diz. “Olhe ao seu redor. Não há morte, Elspeth Tirel, apenas Phyrexia.”

Ela não terá muito tempo para agir. Antes que as fileiras erguidas possam prendê-la, Elspeth levanta voo mais uma vez. No entanto, quando ela se volta para os mirranianos em fuga, paredes se erguem do chão para bloquear seu caminho – paredes que se elevam até as alturas infinitas do teto do santuário.

“Você não pode fugir de nós,” Norn diz. “Nós somos o chão sob seus pés, o ar em seus pulmões. Tudo o que você vê é Phyrexia, e Phyrexia somos nós. Somos inteiros.”

Elspeth ataca a parede. Faíscas são o único sinal de progresso: o revestimento de porcelana não cede à sua lâmina. À frente, Nissa está se aproximando dos mirranianos. Chandra está com eles – as duas eram próximas, não eram? Chandra seria capaz de derrotá-la? Elspeth hesita. Se Chandra vacilar, Nissa irá detê-los.

Eles precisam de Elspeth. Esta luta é uma distração. Ela precisa passar por aquela parede. Se os outros aguentarem apenas alguns segundos…

Mais uma vez ela se concentra na lâmina, cada respiração deixando-a mais brilhante. Uma aurora brilha em sua armadura. Atrás e abaixo dela, as legiões ressuscitadas de Vorinclex e Jin-Gitaxias estão atacando. Correntes circulam suas asas. Ao mesmo tempo, elas se fecham. Seus músculos se esticam sob a pressão.

“Por que você resiste tanto?” Norn pergunta. “Você sempre lutou contra nós. O que deseja? Se você anseia por um lar, encontre um conosco. Se precisa de amigos ou amantes, há incontáveis legiões deles entre nossas fileiras. Ainda pode ser juntar a nós, se você se submeter.”

Elspeth olha por cima do ombro. Norn estava mais alta do que nunca, as placas adicionadas da ponte e dos caídos serviram para esticá-la ainda mais. Vísceras brilhantes brilhavam sob a superfície: a carne esfolada da qual ela tanto se orgulhava. Pelo tamanho dela, pelas formas cruéis de sua armadura e a grande semelhante de sua nova carapaça a um casco, ela não se parece em nada com um lar. Elesh Norn é guerra e morte.

Um segundo conjunto de correntes dispara da mão estendida de Norn. Elspeth não tem outra escolha: se ela quiser ficar no ar, ela terá que passar por Norn. Um único golpe de sua lâmina corta os dois conjuntos de correntes; o impulso derruba os gitaxianos de costas.

Elspeth voa em direção a Norn. “Você não me entende.”

Outro corte vem em sua direção; ela se esquiva e retribui Norn com um corte no braço. Fumaça sobe da ferida. O cheiro de carne queimada gruda no céu da boca de Elspeth. “Eu não sou nada como você.”

Norn agarra uma das asas de Elspeth. Em uma paródia imunda de uma criança segurando um pássaro, ela pendura Elspeth no alto. “Você ansiava por um propósito – por algo maior do que você mesma. O desejo do seu coração é um lugar ao qual você possa pertencer, um lugar de paz sem fim, onde aqueles que você valoriza nunca estão longe. Um futuro brilhante. Um futuro phyrexiano.”

A voz de Norn é alegremente doentia e doentiamente alegre. Elspeth corta os dedos de Norn, mas embora ela tire sangue, a pretora não solta.

“O que esta forma oferece a você que Phyrexia não pode? O que você ganhou é uma pálida imitação do que nós aperfeiçoamos. Olhe ao seu redor!”

Ela olha.

E embora ela relute em admitir, há verdade no que Norn está dizendo. Os olhos que a encaram das fileiras do exército são todos iguais. Aqueles que respiram o fazem em uníssono – e com essas respirações, o santuário estala e zumbe, uma máquina ligada à vida de seus habitantes. Nissa, Nahiri, Ajani… nenhum deles parecia chateado com seus novos estados. Em cada um deles ela não viu nada além de êxtase.

O lar pode ser o que você fez e com quem você o fez. Se ela se juntasse, não faltariam amigos. Ela e Ajani poderiam forjar Theros em sua melhor forma possível. Até Daxos poderia se juntar a eles. Imortal, sem idade, todos apenas um – para sempre.

“Os anjos são uma pálida sombra da divindade. Nós somos sua verdadeira luz. Das alturas deste santuário, vemos todas as coisas exatamente como elas são. Após esta batalha, você não existirá mais como você mesma – você se tornará um deles. Todos esses anos você olhou com horror para a phyresis, e aqui está você, abraçando-a com outro nome.”

“Não é a mesma coisa!” Elspeth responde.

Norn segura Elspeth de cabeça para baixo na frente dela. São olhos de porcelana, Elspeth balançando metros acima do solo. Os dentes de Norn brilham com a luz refratada da lâmina de Elspeth. “Então cite uma única diferença.”

“Meu propósito é divino.”

“Meus evangelistas agem como as espadas de nossa divindade. Tente novamente.”

“Essa transformação não mudou nada em mim.” A mentira mancha sua língua no segundo em que ela a conta.

“Essas suas novas asas contam uma verdade diferente. É tão difícil assim para você entender?”

“Eu…” Elspeth começa.

Outra voz por trás – uma voz familiar. Jin-Gitaxias chama sua soberana. “Não passamos tempo suficiente nisso? Complete-a e vamos embora.”

“Quieto!” Norn grita. Imediatamente seu humor muda para uma fúria violenta. Ela se vira para Jin-Gitaxias. Uma colisão metálica, o som de carne rasgando. Jin-Gitaxias gorgoleja atrás de Elspeth. Ela percebe que ele estava certo: eles passaram muito tempo brigando como crianças. Seu propósito é maior do que isso. E a reação de Norn à insubordinação diz a Elspeth tudo o que ela precisa saber sobre suas diferenças.

Ela enfia sua espada no ombro ferido de Norn – o único lugar que ela consegue alcançar daqui. Um jorro de sangue mancha a armadura de Elspeth quando Norn, finalmente, a solta. Elspeth levanta voo novamente. O braço de Jin-Gitaxias está em uma poça de óleo não muito longe de Norn. Se ela não tivesse escapado, poderia ter sido o dela. Elspeth concentra seu poder em sua espada. Uma luz dourada inunda a plataforma.

Arte de Livia Prima

“Você está certa, Norn,” ela diz. “Não somos tão diferentes assim. Discutimos. Cometemos erros. Temos nossas próprias vontades, sonhos e desejos.”

A boca de Norn se contorce em confusão e desgosto. “Que blasfêmia é essa? Nós declaramos apenas a vontade de Phyrexia…”

Norn ataca, mas Elspeth desvia do caminho. “Você discordou de Jin-Gitaxias, não foi? Phyrexia quer que você me ignore, mas você quer algo diferente.”

Um grito sai da garganta de Norn. Fragmentos de soldados caídos cortam o ar, lâminas dos mortos, cada uma apontada para Elspeth. “Você! Você não entende nada de Phyrexia!”

“Não, o problema é que eu entendo você muito bem,” diz Elspeth. A lâmina zumbe com poder. Ela a levanta bem alto. É isso. Depois de todos esses anos e todos esses mortos – finalmente é hora de derrubar Elesh Norn. Jin-Gitaxias não fará nada para ajudá-la. Suas legiões já estão atacando…

Na direção da árvore. Milhares deles para apenas um punhado de mirranianos. Lanças caem como granizo na superfície da ponte. Aquela pessoa caindo no chão – é Melira? Nascida sem vestígios de metal em seu corpo, imune aos horrores da phyresis, a garota já representou a esperança para todo o Plano. É ela caindo no chão?

O grito de Koth confirma isso.

Não é certo demorar.

Elspeth olha para a pretora diante dela. Uma tempestade de lâminas gira em torno de Norn como as pétalas de uma flor de porcelana. “Estamos além da sua compreensão, além do seu alcance! Quando tivermos conquistado o Multiverso que você tanto preza, você se ajoelhará aos nossos pés e se deliciará com a glória da nossa criação! Você não arruinará tudo o que conquistamos. Séculos depois você será esquecida e nós continuaremos sendo o eterno hierofante, Elesh Norn!”

“Isso é exatamente o que quero dizer. Você quer que as pessoas adorem Elesh Norn, não é? Phyrexia não importa para você. Nunca importou. O poder é a única coisa com a qual você se importa.”

As espadas ao redor de Elesh Norn permanecem imóveis e silenciosas. Um brilho sanguíneo de raiva cresce atrás deles. “Você… eu odeio você!” Como as flechas de um exército, as espadas voam em sua direção – pedaços puxados agora da ponte, das paredes, do próprio corpo de Phyrexia.

Então ela finalmente aprendeu a falar por si mesma, não é? Bem, isso não é mais preocupação de Elspeth. As espadas, no entanto…

Apenas uma chance. Se Elspeth alinhar tudo direitinho…

Ela voa direto para a parede. No último instante ela se afasta. O impulso revira seu estômago, mas ela consegue virar para cima e para longe. As lâminas não têm espaço. Com todos os seus problemas concentrados em um só lugar, Elspeth finalmente libera um raio de luz.

Quando a luz diminui, ela já está na metade da ponte, em direção à árvore. As esperanças do Multiverso repousam em seus ombros emplumados.

Ela não ouve Jin-Gitaxias se levantar, mas ouve o grito de Norn.

“Volte aqui! Eu não terminei com você!”

Ela demorou demais. É hora de fazer a coisa certa.

Wrenn e Chandra estão quase na árvore. Elspeth tem que garantir que elas consigam.


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