Mtg Lore
Compêndio da Lore de Magic the Gathering
ATRÁS DO SOL NEGRO
Texto original
por Adam Lee
A chama da vela oscilou.
“Eu sou um portal para a vida,” afirmou o clérigo. A luz dançante acrescentava uma certa gravidade à declaração.
O clérigo sorriu a alguma reação inconsciente que deve ter ocorrido em meu rosto.
“A maioria me olha com estranheza quando eu digo isso a eles. Talvez seja porque eu uso um manto Orzhov e todos acreditam nas difamações grotescas sobre nossa guilda. Nós não somos todos egoístas e gananciosos.” O clérigo suspirou. “O ignorante sempre pressupõe o pior, eu imagino. As pessoas são facilmente influenciadas pelas emoções cegas e pelo ardil intencional, você não concorda?”
“Acho que sim,” eu disse. “Mas você tem que admitir, os Orzhov não são conhecidos por jogar limpo.”
O clérigo recostou-se na cadeira, virou as palmas das mãos para cima e deu de ombros. “Colocamos tudo por escrito. Está tudo lá para ver. Pessoas simplesmente não se dão ao trabalho de ler as letras miúdas antes de assinar.”
Eu podia sentir a postura defensiva do clérigo e me censurei por deixar meu próprio preconceito escapar. Já era difícil encontrar evidências desta ordem e mais ainda conseguir audiência com um dos seus membros. Eu podia sentir anos de trabalho começando a desmoronar em minhas mãos. Eu teria que engolir minhas opiniões e orgulho se eu quisesse chegar a algum lugar com esse acesso sem precedentes.
“Verdade. As pessoas estão focadas no que elas querem e raramente têm a paciência de esperar e avaliar antes de agir livre de suas emoções.”
Aquilo pareceu trazer o clérigo de volta.
“Poucos são capazes de ver a verdade e eu estou feliz que você consiga. Minha escolha de revelar nossa ordem depende de sua avaliação ser feita com a mente aberta.” Ele derramou vinho em uma taça de ouro e ofereceu-me um pouco, mas eu educadamente recusei. “Os Orzhov valorizam muito a paciência. Suas virtudes são nos ensinadas logo que começamos o nosso serviço à guilda; a missão para a qual fomos escolhidos requer não só paciência, mas também dedicação, confiança e abnegação. Nossa missão, nossa vocação, é entregar nossas vidas para o Sindicato. Nós mantemos algo muito maior do que o mero valor monetário para a guilda. Somos um portal através do qual algo maior do que nós mesmos pode emergir.”
Agora nós estávamos progredindo. Eu sempre fui fascinado pela forma como uma crença devota poderia substituir o desejo inerente de preservar a vida – nosso egoísmo instintivo. Os soldados Boros que se sacrificam para que inocentes possam viver sempre foram um mistério para mim, como um vislumbre de um outro conjunto de normas que corre interiormente, operando abaixo de nossas críticas e mentes preocupadas. Parecia apropriado para os Boros e os Selesnya assumir tal comportamento, mas para os Orzhov? Os rumores soavam duvidosos com relação à guilda dos negócios.
Agora, eu entenderia mais sobre este culto misterioso dentro dos muros do Sindicato e documentar um momento crítico neste mundo enclausurado e envolto em mitos e especulações.
O clérigo largou o copo e levantou-se.
“Caminhe comigo para o santuário.”
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Nós andamos em uma câmara que cheirava a incenso e lenha fresca. Movendo-se suavemente em meio à fumaça espessa, o manto do clérigo fluía sobre ele e os pesados discos de ouro que pendiam do seu colarinho.
Na luz tremeluzente da tocha, eu pude ver um grande símbolo Orzhov feito no chão com grandes pedras ornamentais. O clérigo se ajoelhou no círculo e sinalizou para eu me sentar em uma cadeira pequena, sem braços, que estava um pouco afastada dele. Assim que eu tirei minha pena e papel, ele começou e sua voz ecoava na escuridão:
“Nossa ordem representa os mais puros ideais de Orzhov, por isso que tão poucos de nós são escolhidos. Trata-se de um manto muito pesado para a maioria, mas eu descobri que depois de ter sido escolhido, minha vida foi inundada por um propósito maior. Até hoje, cumprir tal propósito tem sido a minha maior ambição.”
Naquele momento, dois sacerdotes adentraram na área iluminada pelas tochas como fantasmas silenciosos. Um deles colocou algumas velas diante do clérigo e as acendeu com longos fósforos. O outro colocou várias tigelas de metal diante do clérigo, contendo alguma substância densa. Eu pude notar isto devido ao ruído que fizeram quando foram colocadas sobre as pedras ornamentais. Então os sacerdotes deixaram o recinto tão silenciosamente como chegaram.
Das dobras de seu manto, o clérigo retirou um tubo de vidro tampado que estava pendurado em uma corrente de ouro em cada extremidade. Dentro do tubo, havia uma fumaça branca que parecia, de certa forma, viva.
“Este é o Pacto da Morte!” ele disse, enquanto olhava para o tubo, sua luz tênue iluminava suas feições como a luz solar através da água. O clérigo olhou para as profundezas, hipnotizado. Aquela luminescência misteriosa fez o seu rosto tornar-se incrivelmente mais pálido, o que serviu para destacar a escuridão de seus olhos de obsidiana; ele parecia um fantasma de marfim enquanto refletia sobre aquele tubo: “Este é o nome de nossa ordem sagrada. Difícil imaginar que dentro deste pequeno cilindro esteja presente um poder tão magnífico.”
O clérigo soltou o cilindro de sua corrente e reverentemente o posicionou diante dele. Ele então removeu as tampas das tigelas de ouro e estendeu a mão para espalhar punhados de moedas ao redor dele no chão. O som das moedas ecoou por todo o salão e me fez sentir como se eu estivesse dentro de um estranho, enorme carrilhão. Eu senti um espasmo de apreensão primitiva através do meu corpo.
De que tipo de poder ele estava falando? Eu estava em perigo?
Instintivamente me afastei do clérigo e resisti ao impulso de fugir do local. Eu respirei profundamente enquanto ele continuava, registrando tudo com a minha caneta de pena, apesar do meu medo. Os instintos de ser um escriba são difíceis de dominar: o conhecimento a qualquer preço.
Eu me perguntava o significado, caso houvesse algum, que as moedas possuíam, mas eu não ousava interromper o ritual com uma pergunta. Parecia rude. Sacrilégio. Eu anotei todos os detalhes que pude enquanto o clérigo fazia mais gestos e expressões. Seu transe lentamente se aprofundou, de forma que o som de arranhar minha pena no pergaminho parecia quase uma intromissão, mas eu estava com mais medo de deixar algum detalhe de fora.
Então, ele ficou parado.
Depois de um longo momento com apenas os sons do fogo das tochas crepitando, o clérigo sussurrou:
“Eu estou pronto.”
Então, ele tirou a tampa do cilindro de vidro.
Minha mente ansiava angustiadamente. Pronto para o quê? O que vai acontecer? Que segredos eu estava prestes a testemunhar?
Parecia um truque mental no início, mas depois…
A fumaça turbulenta dentro do cilindro de vidro serpenteou para fora como uma entidade assustadoramente consciente. O clérigo respirou profundamente enquanto a fumaça branca avançava em direção ao seu rosto. Ela entrou no peito do clérigo; ele tossiu por reflexo, mas manteve seus olhos fechados enquanto ela envolvia seu pescoço. Quando a fumaça se aproximou de seu rosto, deslizando para cima em direção ao nariz do clérigo, pude ver uma mecha negra dentro dela, que parecia um pedaço de borracha, brilhando à luz das tochas. A oração murmurada do clérigo cessou, assim que ele respirou profundamente por seu nariz. Como se ouvisse a inalação, a fumaça se lançou pelas narinas do clérigo e desapareceu. O clérigo fez um som de engasgo enquanto caía para frente.
Eu pulei, mas assim que fiz isso a manga da minha roupa se prendeu ao tinteiro, e acabei derrubando-o no chão de pedra. A tinta preta espirrou como sangue escuro à luz das tochas. Corri para o lado do clérigo, que se contorcia e rolava no chão. Ele agarrava seu colar de ouro. Seu rosto se transformou em uma colcha de retalhos manchada de veias arroxeadas e machucados. Eu pedi ajuda. Tudo que eu ouvi foram as reverberações através do grande salão.
Então a fumaça negra começou a sair da boca do clérigo. Isso me fez lembrar imediatamente de um incêndio químico Izzet que eu tinha testemunhado alguns anos atrás.
A cabeça e o pescoço do clérigo se arquearam para trás quando ele ficou instantaneamente rígido. A fumaça negra jorrava de seu nariz e de suas orelhas e começou a tomar forma diante de mim enquanto eu recuava e escondia meu rosto com a manga das minhas vestes.
O corpo do clérigo se encolheu e ressecou diante dos meus olhos enquanto um espesso vapor branco saiu dele e se aglutinou em uma forma humanoide. Braços, pernas, cabeça e torso se reuniram em uma forma corpórea de uma mulher com a pele branca como o alabastro. A fumaça negra formou duas grandes asas atrás dela e a fumaça ondulante a envolveu como um tecido vivo. Moedas de ouro e seus recipientes dourados tornaram-se poças de metal líquido que se transformaram em uma armadura cintilante e a maciça lâmina de uma foice. Tudo isso aconteceu diante de meus olhos incrédulos em um ato arcano de criação, mas tudo que eu podia fazer era contemplar a face desta criatura sobrenatural que me olhava com um olhar impassível, mas intensamente curioso.
Ela estendeu a mão, seus dedos pálidos se fecharam ao redor do cabo de ébano da grande foice, exatamente quando os últimos fios de fumaça negra formaram a empunhadura.
O anjo flexionou os dedos se sua mão livre como se quisesse testar sua eficácia, então olhou para sua armadura brilhante e os arredores. Eu estava congelado. Eu não queria me mover, para não incorrer em sua fúria, mas também não queria ficar ali.
Ela flexionou suas asas de penas de corvo, então se virou na minha direção
“Você. Escriba Orzhov. Escreva isto…” Mesmo que fosse apenas um sussurro, sua voz cortou o ar como uma lâmina extremamente afiada. Após um momento de hesitação, eu procurei meu pergaminho, pena e o que restou de tinta. Felizmente, algumas gotas ainda podiam ser aproveitadas para escrever.
“Eu vim dos salões fantasmas do Obzedat com uma mensagem para Teysa Karlov. Há mais a respeito do labirinto do que sabíamos. Teysa deve encontrar o caminho correto e completar o labirinto, a qualquer custo.”
Traduzido por: mtgvortex
Revisado por: Blackanof
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