Mtg Lore

Compêndio da Lore de Magic the Gathering

EPISÓDIO 04

Valerie Valdes

Primeiro trabalho para Magic: the Gathering. Escreveu a trilogia Chilling Effect.

QUINT

Os exploradores do Império do Sol esperavam pela Grande Moldadora Pashona em uma sala grande o suficiente para acomodar eles e os dinossauros que sobreviveram à jornada. Huatli alimentou Pantlaza com tiras de carne seca, que o grande raptor engoliu avidamente, enquanto Inti supervisionava a limpeza de armaduras e armas. Caparocti e Wayta iniciaram um treinamento com passos complicados, grunhindo e golpeando um ao outro com varas.

Quint examinou o poncho que continha o espírito do Abuelo enquanto contemplava o que ele e Wayta haviam discutido anteriormente. Ele nunca havia trabalhado em um sítio arqueológico tão longe de sua própria experiência e se sentia despreparado, apesar de seu treinamento. Quantos textos de história em Strixhaven foram escritos por membros da cultura que descreveram? Ele mesmo não ficou irritado com algumas representações dos loxodontes? Quando encontrou a cidade perdida de Zantafar, alguns arqueólogos argumentaram que ele não deveria ter permissão para trabalhar no local porque não era suficientemente neutro. Felizmente eles foram rejeitados, mas foi um momento tenso.

Agora, diante de uma descoberta surpreendente atrás de outra, ele se perguntava se Wayta estava certa: nada daquilo era sua história para contar. No entanto, talvez se ele encontrasse mais evidências do Império da Moeda-

Nicanzil voltou para a sala e toda atividade cessou.

“A convocação vai começar,” Nicanzil disse. “Sigam-me.”

As mochilas foram colocadas nos ombros, as armas embainhadas e logo o contingente do Império do Sol subiu escadas intermináveis até o topo da edificação. Eles emergiram em frente à enorme porta dourada que era visível da costa quando chegaram. Quint queria examiná-la, mas uma tensão repentina entre seus aliados o deteve.

“Vampiros,” Wayta cuspiu. Os outros guerreiros espelharam seu desgosto, alguns pegando armas.

Vampiros? Esta deve ser a Legião do Crepúsculo, de Torrezon. Saheeli os mencionou.

Uma tritã enrugada entrou pelo lado oposto da sala, sua pele verde marcada com manchas rosa-acastanhadas, barbatanas rosadas se abrindo atrás dela como uma capa. Ela usava armadura de jade como muitos dos Arautos do Rio, mas não carregava armas visíveis – uma usuária de magia, talvez.

“Grande Moldadora Pashona,” Huatli disse, curvando-se profundamente. “É uma honra.”

“Poetisa Guerreira,” respondeu a Moldadora Pashona, inclinando a cabeça. Para surpresa de Quint, ela olhou para ele. “Quem é você, estranho?”

“Quintorius Kand,” Quint respondeu, batendo educadamente na testa com a tromba. “Um loxodonte arqueólogo. Venho de Arcávios – que é, um lugar longe de Ixalan.”

“Por quê você está aqui?” a modeladora perguntou.

“Para ajudar o Império do Sol com algumas pesquisas,” Quint respondeu, “mas também estou em minha própria busca por conhecimento.”

“O que você pretende fazer com esse conhecimento?”

Quint se perguntou se a modeladora poderia ler mentes. Ele olhou para Wayta e disse: “Ainda não tenho certeza. Nada de ruim”.

A Moldadora Pashona voltou sua atenção para Huatli. “E você, Poetisa Guerreira, e seu povo? Quais são suas intenções?”

Huatli apontou para a enorme porta. “Viemos em busca deste portal. Acreditamos que ele leva a” — ela lançou um olhar desconfiado para os vampiros — “um lugar de importância histórica para o Império do Sol.”

Pashona seguiu o olhar de Huatli. “Quem lidera vocês?” ela perguntou aos membros da Legião.

Um dos vampiros com armadura e carregando uma lança deu um passo à frente. “Nosso assunto não é da sua conta. Você nos libertará imediatamente.”

Inti, que já era alto, endireitou-se e jogou os ombros para trás, parecendo duas vezes maior. “Esses invasores deveriam ser presos,” ele disse.

“Ou mortos,” Caparocti acrescentou.

Huatli, para surpresa de Quint, concordou com a cabeça. Ele nunca a tinha visto tão sanguinária.

“Todos vocês são invasores,” disse a moldadora Pashona. “Nós ajudamos para que pudéssemos descobrir seu propósito, mas podemos jogá-lo de volta ao mar e deixar os espíritos decidirem seu destino.”

“Você não pode impedir nossa missão sagrada,” o líder vampiro insistiu.

“Se você nos matar,” Inti disse, “estará declarando guerra a todo o Império do Sol.”

Outro vampiro deu um passo à frente, elegantemente vestido, com um chicote pendurado no cinto. “Torrezon também. A Rainha Miralda ficaria muito descontente.”

As nadadeiras de Nicanzil ondularam. “Você pressupõe que seu povo algum dia nos encontraria.”

Mãos buscaram armas e o cheiro forte de magia encheu o ar. Quint fixou a imagem de um selo defensivo em sua mente.

“Já chega!” Huatli exclamou. “Moldadora, o seu povo e o meu tentar abrir esta porta. Proponho que trabalhemos juntos.”

A Moldadora inclinou a cabeça. “Que ajuda você oferece?”

Huatli sorriu. “Podemos traduzir a escrita na porta. Se for como a que encontramos em Orazca, abriremos rapidamente.”

“Obrigado pela lembrança da traição do seu povo ao tomar a cidade dourada,” murmurou Nicanzil.

“Se estamos nos recordando de coisas,” disse Inti, “lembre-se de que foi um Arauto do Rio quem primeiro reivindicou o Sol Imortal.”

“Aquele que morre sem cometer erros nunca viveu,” disse Huatli diplomaticamente. “Todos nós lutamos contra os phyrexianos para defender nossos lares. Podemos lutar uns contra os outros agora que nosso inimigo em comum foi derrotado, ou podemos usar esta oportunidade para construir uma paz mais duradoura entre nosso povo.”

Para surpresa de Quint, o segundo vampiro falou novamente. “A Rainha Miralda pode estar aberta a tais negociações, dependendo do que descobrirmos.”

“Cale a boca, Bartolomé,” o outro vampiro retrucou. “Eu te avisei-”

“Muito bem,” disse a moldadora Pashona, e o vampiro ficou em silêncio. “Poetisa Guerreira, você pode prosseguir.”

Huatli fez um gesto para que Quint a acompanhasse e juntos examinaram a porta. Não continha nenhuma placa removível e os glifos pareciam um pouco diferentes. Ao lado da porta, uma caixa em camadas com compartimentos de vários tamanhos estava embutida na parede, mas o propósito ele não conseguia entender.

“Este dialeto não é igual à outra porta,” Huatli disse, com a testa franzida. “Isso pode demorar mais do que eu esperava.” Ela examinou os glifos, seus lábios movendo-se ligeiramente, enquanto os membros das várias facções se moviam inquietos. Pantlaza emitiu um leve trinado e sentou-se para alisar as penas.

Quint estava prestes a procurar em seus pergaminhos um feitiço que pudesse ajudar, quando percebeu que tinha algo potencialmente melhor. Ou melhor, alguém.

“Vou invocar um fantasma,” Quint disse. “Ninguém entre em pânico, por favor.”

Wayta fungou e Quint sorriu para ela.

Ele puxou o poncho da mochila e mais uma vez lançou o feitiço para invocar o Abuelo. Ele brevemente temeu que o espírito tivesse se perdido na luta contra o enorme cogumelo ambulante, mas para seu alívio o familiar brilho rosado da magia no tecido se transformou na mesma forma azul-petróleo de antes.

Huatli deu um passo para trás. “Quem é?”

“Abuelo,” Quint respondeu. “Espero que ele saiba como abrir esta porta.”

Abuelo olhou para a multidão e depois para o portal. “Ah, você chegou a Matzalantli!” ele exclamou. “Que maravilha. Devemos entrar e avisar os oltecas sobre o micotirano.”

“Como fazemos isso?” Quint perguntou.

“É muito simples,” Abuelo disse. Então seu rosto se contraiu em confusão. “Mas não consigo me lembrar.”

Huatli apontou para a caixa ao lado da porta. “Tem algo haver com isso?”

“Sim!” Abuelo exclamou, radiante. “Que bom, você descobriu.”

Huatli e Quint trocaram olhares confusos.

“O que fazemos com isso?” Huatli perguntou gentilmente.

Abuelo franziu a testa. “Tem uma chave. Eu sempre esqueço. A Abuela guardava no quipu e eu sempre ficava com ela…”

“Este é o quipu?” Quint perguntou, mostrando o objeto que havia encontrado com o poncho do Abuelo, um cordão semelhante a um cinto enfeitado com pedaços de barbante e miçangas.

“Sim, sim, me dê,” Abuelo disse. Ele mexeu nas cordas com mãos surpreendentemente corpóreas, murmurando para si mesmo até encontrar a que queria. “Aqui! A porta dourada.”

Quint se aproximou, prendendo a respiração enquanto os dedos do Eco deslizavam pelos nós e contas.

“Abra a gaveta na lateral,” Abuelo disse, apontando para a caixa. Huatli fez isso, encontrando uma coleção de pedras preciosas polidas em cores diferentes.

“Onde eles devem ficar?” Huatli perguntou, colocando-as na mão.

“Verde nos cantos superior direito e inferior esquerdo,” Abuelo respondeu. “Amarelo nos outros cantos, e também nos três espaços acima ou abaixo, e acima de um.”

Huatli fez o que lhe foi ordenado, Abuelo assentindo e sorrindo.

“Por último, o cosmium,” ele disse.

“As rosas?” Quint perguntou.

“Sim.” Abuelo tremeluziu como a fumaça de uma vela e depois se afastou. “Perdoe-me. Às vezes o cosmium pode afetar Ecos como eu de maneiras estranhas.”

Quint arquivou isso para conhecimento futuro. “Então, onde colocamos elas?”

Abuelo piscou novamente, sua boca se movendo, mas nenhuma palavra saiu.

Inti gemeu. “Estávamos tão perto,” ele disse. “E agora?”

Huatli examinou a caixa, inclinando a cabeça. “Acho que conheço esse padrão.”

“Ah é?” Quint perguntou. “O que é?”

Huatli riu baixinho. “É uma chave.” Ela colocou o resto das contas de cosmium nas caixas centrais, que formaram uma serpente estilizada.

Assim que a última conta foi colocada, a caixa brilhou fracamente, e o brilho rosado se espalhou pela porta e seus glifos. Uma luz irrompeu por uma fresta na costura do portal agora aberto, que se abriu com uma lufada de ar fresco e surpreendentemente frio.

Por mais que Quint quisesse entrar correndo e saborear a emoção da descoberta, ele deixou Huatli liderar o caminho, com os outros guerreiros flanqueando-a. Eles entraram em um túnel amplo, com largura suficiente para acomodar uma dúzia de pessoas. A passagem descia acentuadamente e, ainda assim, enquanto Quint caminhava, ele tinha a sensação estonteante de que tudo ao seu redor estava mudando, como acontecia quando ele transplanava. Ele continuou descendo, o caminho íngreme, mas nunca íngreme o suficiente para ser intransitável – até chegar a um amplo círculo de pedras como um poço, facilmente do mesmo diâmetro do próprio túnel. Huatli parou na beira do poço e perdeu o fôlego. Outros rapidamente se aglomeraram ao redor dela para ver.

“Isso é impossível,” Huatli disse.

“Incrível,” Inti acrescentou.

“Inacreditável,” murmurou Caparocti.

Wayta apenas piscou o único olho visível.

Eles estavam diante de um círculo de céu pontilhado de nuvens. A porta levava de volta à superfície? Mas não, eles estavam nas profundezas da terra e o túnel descia.

Sombras apareceram na borda da abertura. Pessoas, esticando seus pescoços sobre a borda do poço, olhando para Huatli e os outros.

“Encontre Anim Pakal,” um deles disse, em tom mais preocupado do que chocado. “Alguém abriu o selo.”

Arte de Piotr Dura

MALCOLM

Com as cordas do elevador cortadas, Malcolm teve que voar aos poucos para baixo, de um nível para o outro. Às vezes ele carregava Bermuda, outras vezes o goblin descia pelas paredes ásperas e eles paravam para descansar sempre que se cansavam. O brilho verde e doentio dos fungos iluminou o caminho junto com as lanternas, e ambos continuaram a usar suas máscaras toscas, com medo de respirar quaisquer esporos que tivessem afetado seus companheiros.

Eles finalmente encontraram o elevador, danificado, mas quase intacto, preso em cima de uma prateleira de cogumelos estendida no meio do cenote como um palco macabro. Eles não encontraram nenhum cadáver, nem qualquer sinal dos caídos além da bile negra que os infectados vomitaram na plataforma de madeira.

E ainda assim, o fundo do poço permanecia fora de vista.

Malcolm perdeu a noção do tempo, os minutos se transformaram em horas. Em algum lugar lá em cima, o sol nasceu e se pôs; no escuro, apenas o cansaço, a fome e a sede marcavam a ausência das rotinas diárias habituais.

Uma luz fraca abaixo deles aumentou gradualmente, até que finalmente chegaram ao fim de sua descida aparentemente interminável. Um túnel à esquerda se iluminou enquanto o brilho ao redor deles diminuía, como se estivessem sendo guiados. Ou pastoreados.

Bermuda resmungou, “COGUMELO RUIM.”

“É isso aí, cara,” Malcolm concordou.

Eles seguiram o brilho através de túneis toscos, regulares e propositais demais para serem naturais. Quanto mais andavam, mais aumentava o pavor de Malcolm. Se isso fosse uma armadilha, como eles escapariam? O céu estava tão acima deles, o mar tão distante…

O túnel se abria para uma caverna grande o suficiente para conter uma cidade inteira, e o teto era tão alto que Malcolm podia voar confortavelmente sem bater nele. Uma floresta de fungos se estendia diante deles, assustadoramente bela, repleta de ruínas desmoronantes. Esporos bioluminescentes flutuavam como pequenos vaga-lumes entre cogumelos tão altos quanto árvores, com chapéus e estipes em todos os tons de verde, desde a mais clara espuma do mar até quase preta. Eles estremeciam quando Malcolm e Bermuda passavam, como se estivessem sendo farejados.

Ruídos suaves sugeriam que não estavam sozinhos. O som de passos, corpos roçando o terreno, murmúrios ocasionais. Talvez sobreviventes da Cidade Baixa? Mas e se todos estivessem infectados? As entranhas de Malcolm se apertaram de horror.

Chegaram a uma clareira, o chão coberto por círculos concêntricos conectados, como as marcas na pele de seus aliados. Malcolm parou, temendo pisar nas linhas, que pareciam fios de teia de aranha. Ele não desejava ser pego como uma mosca.

Um grupo heterogêneo de pessoas emergiu da floresta. Ele não os reconheceu a princípio, cobertos de fungos como o cadáver que deu início à investigação. Alguns estavam ladeados por cogumelos ambulantes com braços e pernas, como bonecos de pesadelos infantis.

Um dos humanos deu um passo à frente, seus movimentos rígidos, os olhos substituídos por cogumelos brilhantes. Xavier Sal, prefeito da Cidade Baixa. A esperança de Malcolm de encontrar sobreviventes desapareceu assim que o homem abriu a boca.

“Nós lhe damos as boas-vindas a este lugar,” Xavier disse, sem emoção.

“Quem somos ‘nós’?” Malcolm perguntou.

“Nós somos o Micotirano.” Xavier gesticulou para trás e uma figura gigante foi subitamente iluminada por dezenas de fungos brilhantes.

O Micotirano pendia em uma teia circular de fios semelhantes a raízes que se estendiam do chão ao teto. Seu corpo semelhante ao de um sapo era largo e verde com manchas arroxeadas e guelras como uma coleira em volta do pescoço. Grandes cogumelos brotavam de suas costas, alguns menores de sua cabeça e, embora não tivesse pernas, dois braços grossos terminavam em garras ferozes. Acima, uma boca aberta, sem lábios, cheia de dentes espinhosos, olhos redondos brilhavam verdes, olhando para Malcolm e Bermuda com malévolo interesse.

Arte de Chase Stone

“Você é nosso conhecido, Malcolm Lee,” Xavier disse. “Assim como sua missão, graças aos seus antigos companheiros.”

“Eles estão aqui?” Malcolm perguntou, temendo a resposta.

“Sim,” Xavier respondeu. “Eles foram incorporados à nossa colônia, assim como aqueles que já residiram no lugar que você chama de Cidade Baixa.”

Malcolm se encolheu. “Incorporados, como se…?”

“Somos um,” todos os humanos disseram em uníssono sinistro.

Malcolm tinha visto árvores derrubadas por fungos, troncos apodrecidos por dentro. Dado o que aconteceu com seu povo, os dinossauros contra os quais eles lutaram e o que ele enfrentava agora, ele só podia presumir que eles estavam sofrendo um destino semelhante.

Ele olhou além de Xavier para o Micotirano, envolto em luz fúngica. “O que é que você quer?” Malcolm perguntou. “Pedras preciosas? Dinheiro? Comida?”

O Micotirano emitiu uma nuvem de esporos como uma risada silenciosa. A boca de Xavier se esticou em um ricto que refletia o movimento de seu mestre de marionetes.

“Tudo.”

AMALIA

A porta dourada cuja imagem havia atormentado Amalia durante semanas estava aberta diante dela. Ela não pôde deixar de se sentir emocionada, mas profundamente perturbada por sua previsão se tornar realidade novamente. Com Kellan a reboque, ela seguiu a massa de pessoas através de um túnel, emergindo no lugar surpreendente que ela também tinha visto em visões.

Arte de Piotr Dura

Um amplo panorama se espalhou diante dela, acima e ao redor dela enquanto atravessava o portal. Pastagens vibrantes se estendiam ao longe, estranhas criaturas peludas de pescoço comprido vagavam e pássaros voavam pelo ar, sozinhos ou em bandos. Mas em vez de a terra desaparecer no horizonte, ela curvava-se para cima. Amália teve a desconcertante sensação de estar dentro de um enorme globo invertido.

No centro de tudo pairava um sol estranho, tão perto que Amalia imaginou que poderia alcançá-lo se possuísse o poder de voar. Iluminava metade da terra, enquanto outras partes caíram na sombra causada pelas peças de metal girando ao seu redor. Uma cauda de mais fragmentos de metal se estendia para longe dele, brilhando em um tom rosado fraco. Ela havia previsto isso também, e estremeceu ao pensar quais lugares futuros ela veria em seguida.

Arte de Adam Paquette

“Isso é realmente incrível,” Kellan disse. “Era isso que você estava tentando encontrar?”

Amalia encolheu os ombros, impotente. “Não sei. Nunca estive aqui antes.”

À esquerda deles, uma pirâmide erguia-se de vários andares, com um grande disco pontiagudo no topo, semelhante aos do Império do Sol. Prédios menores estavam espalhados ao redor e as pessoas saíam deles. Eles usavam ponchos e quipus como o espírito que o arqueólogo chamava de Abuelo, e empunhavam armas de lâmina rosada e cajados com magia que enviava pulsos ondulantes pelo ar. Entre eles, criaturas menores andavam, seus corpos articulados formados por vários tipos de metal. Cada um tinha um único olho brilhante em cores que variavam do vermelho ao verde, ao roxo e além. Espíritos flutuantes juntaram-se a eles, alguns humanoides com características reconhecíveis, outros mais parecidos com animais ou fogos-fátuos semiformados de névoa azul-petróleo.

Amalia semicerrou os olhos para o sol estranho, pontos pretos flutuando ao seu redor como pássaros. Alguns deles mudaram para uma formação em forma de flecha e se aproximaram. Mais guerreiros, montados nas costas de grandes morcegos que também usavam armaduras como os dinossauros voadores do Império do Sol.

Algo nos morcegos a fez estremecer e, como se em resposta, a voz de suas visões retornou.

Venha até mim…

Parecia mais alto agora, mais forte. Amália olhou para Vito. Seus lábios se esticaram em um sorriso fanático enquanto ele voltava seu olhar para o céu.

Bartolomé tocou-lhe no braço e Amalia estremeceu. “Você está bem?” ele perguntou.

“Só sobrecarregada,” ela disse. Ela nunca havia mentido tanto em sua vida como nesta jornada.

Kellan assobiou ao notar os voadores se aproximando. “Suponho que você não tenha ideia do que está acontecendo aqui?”

Amália sorriu timidamente. “Receio que não,” ela disse. “Espero que descubramos em breve.”

“Contanto que eles não nos joguem em mais areia movediça,” Kellan disse, “suponho que deveríamos considerar isso uma melhoria.”

Um dos cavaleiros de morcego pousou e Bartolomé se aproximou da multidão que se reunia ao seu redor. Amalia o seguiu, Kellan ao lado dela, querendo saber o que estava acontecendo.

O cabelo escuro da mulher estava preso por uma faixa em forma de coroa, e seu quipu e cinto eram adornados com as mesmas pedras cor-de-rosa usadas nas armas. Uma das estranhas criaturas mecânicas a seguia como uma criança.

“Meu nome é Anim Pakal,” ela disse. “Eu comando as Mil Luas. Quem são vocês e como abriram o selo em Matzalantli?”

Arte de Chris Rahn

O espírito Abuelo avançou. “Eu os ajudei,” ele disse. “Recebi a chave da entrada quando a porta foi selada, na esperança de que pudéssemos retornar quando o Micotirano fosse derrotado.”

Anim inclinou a cabeça para ele. “Honrado Eco, bem-vindo. Isso significa que Topizielo está segura agora?”

Abuelo balançou a cabeça. “Não está, mas Oteclan e o resto do Núcleo também não. O poder do Micotirano cresceu em vez de desaparecer. O plano para isolá-lo e derrotá-lo falhou.”

“Então por que você abriu a porta?” Anim perguntou. “Você trouxe ruína para nós.”

“A ruína teria encontrado vocês dormindo em suas camas,” Abuelo respondeu com um gesto breve. “Agora você pode se preparar.”

“As Mil Luas não dormem,” Anim disse. “Esta guarnição guarda a porta de Matzalantli desde que ela foi fechada na época dos meus ancestrais. Ela teria permanecido fechada e estaríamos seguros se você não a tivesse aberto.”

A poetisa-guerreira deu um passo à frente agora, curvando a cabeça respeitosamente. “Teríamos encontrado uma maneira de entrar, se não por esta porta, pelo menos por outros meios. Nosso povo tem cavado minas mais profundamente na terra, assim como outros.”

“Ela está certa,” Bartolomé disse, ignorando o olhar de Vito. “Só a Coalizão Brônzea tem uma cidade inteira abaixo da superfície dedicada à escavação.”

A Moldadora Pashona acrescentou: “Acreditávamos que encontraríamos a Fonte atrás da porta. Nós também teríamos feito tudo ao nosso alcance para retirá-la. A ignorância pode fornecer uma medida de segurança, mas também pode resultar em escolhas erradas.”

Quão bem Amalia sabia disso agora. Se tivesse percebido o que esta viagem significaria para ela, ela poderia ter ficado em casa. Mas não, esse era um pensamento indigno. Ela havia aprendido muito e seus mapas seriam de grande valor para seu povo, se algum dia conseguisse retornar a Torrezon.

Anim olhou para a assembleia com o queixo erguido imperiosamente, depois se fixou na poetisa guerreira. “Você é do Komon?” ela perguntou.

“Somos do Império do Sol,” a mulher disse, indicando o resto de seus companheiros e seus dinossauros. “Meu nome é Huatli. Quem são os Komon?”

“Um didata poderia explicar melhor do que eu,” Anim disse. “Os Komon são nossos ancestrais que deixaram o Núcleo para explorar Topizielo. Até as portas serem seladas, negociávamos regularmente, mas não os vimos desde então.”

O loxodonte – Quintorius – pigarreou educadamente. “Talvez os Komon tenham chegado à superfície? Isso explicaria a semelhança nos glifos usados pelo Império do Sol e, bem, por você, se foram vocês que fizeram a porta.”

Essa interrupção levou a uma rodada mais completa de apresentações que incluía ele e todos os membros do Império do Sol, depois os Arautos do Rio. Amalia esforçou-se para prestar atenção enquanto considerava as implicações da discussão. Se o Império do Sol descendia dessas pessoas, o que isso tornava esse lugar dentro do Plano? Talvez o seu próprio povo já tivesse caminhado por estes campos e colinas, tenha voado pelos céus montado em morcegos. Isso explicaria por que a busca pelo seu deus os trouxe até aqui.

Anim olhou para mais morcegos que chegavam. “Enviamos uma mensagem sobre sua chegada a Oteclan. Em breve, Akal Pakal chegará para dar as boas-vindas aos nossos primos há muito desaparecidos, se de fato é isso que vocês são.”

O que se chamava Inti curvou-se e disse: “Oferecemos-lhe a força do nosso povo em troca da sua hospitalidade. Estamos ansiosos para negociar e melhorar os laços entre nós.”

Alguma escuridão cruzou a expressão de Huatli, mas antes que ela pudesse falar, Anim se aproximou de Vito, onde ele permanecia rígido ao lado de Clavileño.

“Não fomos apresentados,” Anim disse. “Minhas desculpas pelo descuido.”

Vito inclinou a cabeça friamente, mas não disse nada.

Bartolomé mais uma vez intercedeu. “Somos humildes exploradores da Companhia da Baía Rainha,” ele disse com uma reverência cortês.

“Eles são vampiros,” gritou um soldado do Império do Sol.

A mudança em Anim Pakal foi imediata. Magia formou um arco entre seus dedos e dançou por seus braços enquanto ela formava um escudo brilhante entre ela e Vito. Os oltecas cercaram os membros da Legião, armas em punho e mais magia ondulando no ar.

“Adoradores do Grande Traidor não são bem-vindos aqui,” Anim disse friamente. “Aprisione-os.”

“De novo?” Kellan gemeu. Amalia repetiu o sentimento, mas se lutar contra os malamet tinha sido imprudente, atacar os oltecas seria suicídio.

Vito pareceu prestes a protestar, mas então seus olhos ficaram vítreos e ele agarrou o braço de Clavileño. “Tudo procede de acordo com a sua vontade,” ele disse.

Amalia estremeceu, esperando que os sussurros de Aclazotz ecoassem em sua mente mais uma vez, mas não ouviu nada. Talvez isso tenha sido uma bênção.

As sombras dos cavaleiros de morcegos caíram sobre os vampiros enquanto eles eram levados para as profundezas da guarnição, longe da luz do estranho sol coberto de conchas.

WAYTA

O contingente do Império do Sol sentou-se em um refeitório dentro da guarnição, saboreando a deliciosa comida local. Depois de dias de rações para trilhas, Wayta se esbaldou. Nunca se sabia quando chegaria a próxima refeição; a contenção era para os tolos.

Um dos oltecas abordou Huatli. “A regente chegou. Os Mil Luas me enviaram para guiá-la.”

“Agradecemos,” Huatli respondeu, jogando o resto de sua comida para Pantlaza e indo em direção à porta.

Inti e Caparocti flanquearam-na, enquanto os outros guerreiros seguiram atrás. Wayta esperou que Quint terminasse de colocar frutas em um de seus muitos bolsos antes de acompanhá-lo para fora.

Akal Pakal, regente olteca, aguardava-os num edifício pintado de forma vibrante e adornado com um emblema do sol no telhado. Ela usava camadas de vestes cerimoniais, azuis, verdes e douradas com intrincados padrões geométricos. Grandes discos de ouro pendiam de seu pescoço e um alto capacete gravado com glifos adornava sua cabeça. Wayta não conseguia se imaginar carregando tanto peso, mas talvez não fosse mais incômodo do que seu próprio capacete e armadura.

Arte de Ryan Pancoast

“Bem-vindos,” Regente Akal disse, com a voz quente e rouca devido à idade. “Ouvi um pouco da sua história contada pela minha irmã Anim e estou ansiosa para ouvir mais. Primeiro, porém, deveríamos discutir a presença de bebedores de sangue em seu meio.”

“Eles não são nossos aliados,” Huatli disse. “Nós guerreamos contra eles, mas quando Ixalan foi invadido pelos phyrexianos – pessoas de outro Plano – essa luta teve precedência. Depois de tanta violência, espero um caminho pacífico a seguir e gostaria de receber qualquer ajuda que você possa fornecer enquanto tentamos reconstruir.”

“Ou,” Inti interrompeu, “você poderia nos ajudar a nos livrar dos vampiros agora.”

“Inti, já discutimos isso,” Huatli disse, em tom afetuoso, mas exasperado.

“E o imperador discutiu isso conosco,” Caparocti acrescentou. “Torrezon foi enfraquecida pela invasão e pelas lutas internas. Os vivos se opõem aos seus senhores vampiros mais do que nunca, a Coalizão Brônzea os atormenta quando é lucrativo e os orcs da costa oeste nunca foram amigáveis. Agora é o momento perfeito para atacar.”

“É melhor trabalharmos juntos para cuidar de nossas terras e reconstruir o que foi perdido,” Huatli disse, “em vez de morrer em terras estrangeiras”.

“É melhor aproveitarmos nossa vantagem antes que a morte chegue até nós,” Inti se contrapôs.

Wayta já tinha ouvido falar o suficiente da mesma conversa quando lutou em Tocatli durante a guerra. Ficar no mesmo lugar e estabelecer bloqueios ou permanecer móvel e ser mais difícil de atingir? Recuar e reagrupar ou avançar para expulsar o inimigo? Manter as linhas de abastecimento abertas e arriscar uma morte rápida, ou deixá-las entrar em colapso e correr o risco de morrer de fome? Alguns comandantes foram mais cuidadosos que outros, alguns mais sedentos de glória e poder. Estes últimos, ela descobriu, estavam ansiosos para gastar o dinheiro da vida de outros guerreiros na segurança de seus abrigos bem abastecidos.

Os soldados comuns também sofreram no rescaldo da guerra, apesar dos seus sacrifícios. Aqueles que ganharam poder através da violência não desistiram dele facilmente, utilizando-o para explorar os impotentes e aumentar a sua própria influência. Sua frustração a levou à Coalizão Brônzea e agora de volta ao Império do Sol, mas ela se perguntava se haveria algum lugar em Ixalan onde os mesmos problemas não a encontrariam.

Wayta foi até Quint, que estava à parte com Abuelo, profundamente envolvido em uma conversa. As mãos de Abuelo se moviam enquanto ele falava, enquanto Quint assentia e fazia anotações.

“Você deve estar preso ao poncho,” Quint disse. “Foi o que eu usei para invocar você.”

Abuelo olhou para suas roupas. “Não é a coisa mais conveniente, mas estou feliz por aparecer tão claramente. Alguns Ecos são fogos-fátuos, outros são monstros alterados por sua vinculação.”

Talvez aquelas pessoas estivessem mostrando suas verdadeiras formas na morte, Wayta pensou.

“Um Eco está vinculado a isso?” Quint perguntou, mostrando o quipu que os ajudou a abrir a porta dourada.

Abuelo passou os fios pelos dedos fantasmagóricos. “Espero que sim,” ele disse. “Este era da Abuela.”

“Sua esposa?” Wayta perguntou.

“Sim.” Abuelo sorriu melancolicamente. “Ela podia fazer qualquer coisa crescer. Flores, frutas… Espinhos quando precisava. Ela era feroz.”

A menção às flores lembrou a Wayta um poema que ela compôs, depois de mais uma batalha como tantas outras:

Não pudemos salvar as flores
       Pisoteados na lama pelas nossas botas
       Então plantamos sementes alimentadas com sangue
       Nas bocas abertas de nossas feridas
       Esperando que flores douradas de morte
       Crescessem de nossas covas rasas

Nada parecido com o que a poetisa guerreira criava, Wayta pensou. Mas Huatli uma vez lhe dissera que os poemas deveriam ser honestos.

Quint usou as mãos e a tromba para espalhar o quipu enquanto o examinava. “Talvez possamos trazê-la de volta, já que ajudei você a voltar.”

“Supondo que ela seja uma Eco,” Abuelo disse. “Ela pode simplesmente ter falecido.”

Quint alargou ligeiramente as orelhas. “Vamos descobrir, certo?”

Wayta se afastou novamente como uma pétala ao vento, olhando para a paisagem pacífica com a dor enchendo seu peito. Ela carregava consigo seus próprios fantasmas, diferentes tipos de ecos. Um olhar lhe disse que a regente e seu pessoal ainda estavam em profunda discussão. Eles formariam uma aliança? Isso levaria à guerra que o imperador queria? Se fosse assim, quais sementes Wayta plantaria?

MALCOLM

Os moradores infestados de fungos da Cidade Baixa cercaram Malcolm, sem se mover, nem mesmo respirar. Os que ainda tinham olhos, olhavam para ele, e aqueles que não tinham apontavam órbitas vazias ou cogumelos pálidos em sua direção.

Todos mortos. Ele esperava salvá-los, tirar os sobreviventes da escuridão profunda, mas tudo o que podia fazer agora era coletar informações e tentar voltar vivo à Coalizão Brônzea para entregá-las.

“Você fez isso com nosso povo?” Malcolm perguntou à forma enorme do micotirano acima dele.

O que sobrou do prefeito respondeu. “Você cavou pedras, minérios e veios de cristal brilhante até que um de sua espécie nos encontrou. Queríamos saber mais sobre você.”

“E você não poderia simplesmente perguntar?”

“Unir-se é perguntar e saber.”

As penas de Malcolm se arrepiaram. “Matar, você quer dizer.”

A cabeça de Xavier inclinou-se num gesto quase humano. “Nós não matamos. Nós mudamos. Nós nos espalhamos. Onde há um de nós, há todos nós.”

Uma imagem do corpo perto da Baía do Raio Solar passou pela mente de Malcolm. Ou essa criatura não tinha noção da morte ou não entendia que estava matando seus hospedeiros quando ela… estava fazendo o quê exatamente? Controlando suas mentes? Consumindo-os? Assimilando-os em si mesma?

“De onde você veio?” Malcolm perguntou.

“Daqui,” Xavier respondeu. “Sempre estivemos aqui. Observamos e crescemos. Vimos os oltecas e seus deuses caminharem pelo Núcleo antes que ele nos fosse negado. Estávamos aqui quando os Komon Winaq construíram cidades e quando seus ossos enriqueceram o solo. Nós negociamos com os malamet e os goblins das profundezas, e reunimos conhecimento de toda a carne que nos encontra.”

Malcolm não tinha ideia do que isso significava, mas parecia impressionante. E alarmante. A menção ao comércio, porém, foi a primeira coisa promissora que ele ouviu até agora.

“Talvez possamos chegar a um acordo,” Malcolm disse. “Há algo específico que meu pessoal possa oferecer a você?”

“OURO?” Calções perguntou. “GEMAS?”

Os brilhantes olhos verdes da criatura suspensa brilharam.

“Queremos… o sol,” Xavier disse.

“O sol,” repetiram os infectados.

“Há muito tempo que nos foi negada a luz de Chimil,” Xavier continuou. “Você tem outro sol acima e nós o teremos.”

Você não pode simplesmente ter um sol, Malcolm pensou, mas guardou isso para si enquanto todo o potencial do que o micotirano disse lhe ocorreu. Se esta criatura chegasse à superfície, dependendo da rapidez com que se espalhasse, em breve poderia consumir toda a Baía do Raio Solar. Talvez até mesmo toda Ixalan.

Ouro e pedras preciosas perdidos, como Bermuda continuava lamentando, eram a menor de suas preocupações. Malcolm olhou ao seu redor para a floresta de fungos, o teto alto da caverna e as estalagmites e estalactites com seu molde luminescente. Ele se lembrou dos túneis pelos quais ele e Bermuda passaram para chegar aqui, a distância do fundo da mina de cenote da Cidade Baixa até a superfície.

Como ele e Bermuda poderiam escapar vivos deste lugar?

AMALIA

Os oltecas não tinham prisões como as de Torrezon, que Amalia ouvira dizer que eram lugares vis e úmidos, cheios de morte e doenças. Eles tinham salas de detenção temporária, segundo o guarda relutantemente respondeu às perguntas de Bartolomé. As pessoas não eram presas como punição – o conceito pareceu chocar o homem.

Mesmo assim, os vampiros da Legião e seus poucos servos restantes foram trancados em quartos vazios, as armas confiscadas e deixadas à espera de seu destino. Bartolomé providenciou para que ele, Amalia e Kellan ficassem juntos; ele andava de um lado para o outro, Amalia sentou-se no chão e Kellan espiava pela pequena janela, ocasionalmente olhando para trás com uma expressão de preocupação. O mapa de Amalia não havia sido levado, então ela usou sua magia de sangue para explorar a área imediata, preenchendo-a na página.

Da sala ao lado deles, a voz de Vito aumentou. “O tempo da nossa salvação está próximo. As palavras do Venerável Tarrian guiaram-me até este lugar, o nosso destino, e em breve seremos redimidos.”

Seguiram-se sons abafados de aprovação. Bartolomé balançou a cabeça consternado e continuou a andar, de um lado para o outro, com as mãos cerradas atrás dele.

“Então,” Kellan disse calmamente. “Vocês são vampiros?”

Bartolomé fez uma pausa. “O que você sabe sobre vampiros?” ele perguntou.

Kellan encolheu os ombros. “Eles matam pessoas inocentes e bebem o seu sangue, não necessariamente nesta ordem.”

“Não é isso que a nossa igreja prega,” Amalia disse, com uma justa indignação crescendo dentro dela. “Nós só nos alimentamos de criminosos, de pessoas más, e usamos o poder do sangue para ajudar os outros.”

“Quem decide quem é o criminoso?” Kellan perguntou, apontando para a sala. “Neste momento, somos criminosos.”

“A justiça será feita,” Amália disse, mas a sua convicção vacilou. Ela nunca tinha pensado que as pessoas condenadas à prisão em Torrezon pudessem ser inocentes. A igreja nunca permitiria isso.

Será?

Vito rugiu, “A promessa da eternidade é nossa, batizada com sangue e santificada por Aclazotz, que nos espera aqui, além destas portas”.

Bartolomé suspirou. “Alguns de nós não estamos totalmente comprometidos com a moral defendida pela Igreja”.

Amália sabia que ele não se referia apenas a Vito. Ela ouviu os sussurros sobre Vona de Iedo e outros hereges. Mas talvez não fossem eles a quem Bartolomé se referia?

“Você disse que veio até aqui por uma porta mágica,” Amália disse, ansiosa por um novo assunto. “Por que você sairia de casa?”

Kellan olhou de volta pela janela. “Estou procurando meu pai,” ele disse.

“O que aconteceu com ele?” Bartolomé perguntou.

“Eu não sei,” Kellan disse.

“O que você fará quando encontrá-lo?” Amália perguntou.

“Isso depende,” Kellan refletiu. “Eu nunca o conheci, pra falar a verdade.”

“Por que você quer encontrá-lo, então?” Bartolomé perguntou curioso.

Uma faísca dourada brilhou nos olhos castanhos de Kellan. “Preciso saber mais sobre mim. Sobre quem eu sou.”

Amália compreendeu muito bem esse sentimento.

“Eu suspeito,” Bartolomé disse, colocando a mão no ombro de Kellan, “que, você encontrando seu pai ou não, você se conhecerá muito bem ao final de sua busca.”

“Você pode estar certo.” Kellan riu. “Já sei que estou cansado de ser resgatado e preso.”

Bartolomé apontou o queixo para Amalia. “A magia dela pode nos tirar daqui a qualquer momento, mas para onde iríamos? Estamos cercados por inimigos e a superfície está bem acima de nós.”

Ele estava correto. Ela poderia usar sua magia para reescrever o mapa, como fez antes. Mas e depois?

“Contemplem,” Vito disse. “O poder de Aclazotz!”

A luz oblíqua que entrava pela janela suavizou-se e desapareceu, substituída por um fio de névoa. Amalia levantou-se e espiou do lado de fora. Uma névoa mágica cobria o prédio, tão espessa que sua mão desapareceria se ela a enfiasse pela abertura. Seu povo conseguia fazer isso, fazia isso frequentemente em batalha, mas por que agora?

Em outra sala, um grito abafado morreu com um gorgolejo. O pedido de ajuda foi recebido com um baque nauseante. Quando o cheiro de sangue chegou até ela, Amália temeu o pior. Os soldados da Legião não se alimentaram o suficiente desde o início da descida e os seus servos humanos diminuíram entre o deserto e os malamet. As regras e tradições habituais talvez não vinculem aqueles que já estavam preparados para cometer atrocidades em nome de Deus.

A voz de Vito preencheu novamente o silêncio. “Sigam-me, filhos das sombras. Agora recuperamos nosso poder.”

O som de madeira lascada pontuava suas palavras. Onde estavam os guardas? Engolidos pela névoa? Amalia se posicionou diante de Kelllan, que protestou e passou para o seu lado. Bartolomé ficou entre os dois e a porta.

“Amalia,” Bartolomé disse, “se algo acontecer comigo, você deve voltar para a Rainha Miralda. Contar tudo.” Ele olhou para ela por cima do ombro. “Prometa.”

“Eu juro,” Amalia disse, com a voz rouca.

A porta foi arrancada do lugar e jogada de lado. Clavileño olhou feio para Bartolomé e depois deu um passo para o lado para permitir a entrada de Vito. Uma marca de uma mão vermelha estava manchada na frente de sua armadura, os olhos brilhando – com fervor religioso ou sede, Amalia não sabia.

“Aclazotz exige um sacrifício,” Vito disse, seu tom suave em desacordo com sua expressão e o sangue manchando sua boca.

“Ele já teve sacrifícios suficientes,” Bartolomé retrucou.

“O sangue do estranho será suficiente,” Vito continuou, olhando além de Bartolomé para Kellan. “Nós o levaremos para Aclazotz, que nos recompensará com um poder incalculável e trará a escuridão a este lugar mais uma vez.”

O olhar de Bartolomé se voltou para Kellan e depois se fixou em Amalia. Sua expressão mudou, olhos arregalados e mandíbula endurecida.

Fuja, ele murmurou para ela.

Estavam impossivelmente longe de Torrezon, cercados por guerreiros oltecas. Mas talvez, depois disso, ela e os estranhos compartilhassem um inimigo comum.

Amalia passou a pena sobre o mapa. Com um traço, ela poderia libertá-los.

Bartolomé saltou sobre Vito, as mãos curvadas em garras, as presas à mostra. Eles lutaram, bloqueando a porta para que Clavileño e os outros soldados não pudessem intervir.

Ao lado de Amalia, Kellan tirou os punhos de madeira do cinto. Uma luz dourada explodiu deles e formou um par de espadas brilhantes.

Vito passou um braço em volta da cabeça de Bartolomé e girou, o terrível estalo ecoando na pequena sala. Ele deixou o corpo cair e olhou para ele com indisfarçável desprezo.

Arte de Marta Noel

Amalia abafou um soluço enquanto firmava a mão trêmula. Ela baixou a pena e passou delicadamente na borda do prédio no mapa, apagando a linha.

A parede atrás dela desapareceu. A névoa entrou, engolindo todos na sala. Kellan só era visível graças às suas espadas.

“Corra,” Amalia disse, agarrando o braço de Kellan. A luz de suas armas desapareceu enquanto eles fugiam, desaparecendo na escuridão, com o medo perseguindo-os como um cão farejador.

Comentários

Magic the Gathering é uma marca registrada pela Wizards of the Coast, Inc, uma subsidiária da Hasbro, Inc. Todos os direitos são reservados. Todas as artes e textos são de seus respectivos criadores e/ou da Wizards of the Coast. Esse site não é produzido, afiliado ou aprovado pela Wizards of the Coast, Inc.