Mtg Lore
Compêndio da Lore de Magic the Gathering
A ARQUIMAGA DOS NOITE DOURADA
O mundo de Innistrad está mergulhando na loucura há algum tempo; De cultistas a cátaros, nenhuma mente está segura. Até os anjos se tornaram vítimas. A própria Avacyn enlouqueceu, transformando-se de protetora em monstro e provocando uma devastação inimaginável até mesmo sobre os mais fiéis de sua igreja. Então ela foi destruída. Com a sua protetora angelical desaparecida, Innistrad foi exposta às forças avassaladoras da escuridão e do mal. Agora, os poucos no plano que ainda não perderam a cabeça ficam imaginando se este é o fim. À medida que o mundo se desequilibra, iniciando sua queda final, as pessoas rezam por qualquer coisa ou por qualquer pessoa poderosa o suficiente, boa o suficiente, para ficar no lugar de Avacyn, para protegê-los da escuridão enlouquecedora.
Presente
O cheiro do sangue de anjo. Não havia nada parecido em todo o Multiverso: um buquê peculiar, doce e salobro, com toques de especiarias e uma pontada de poder. O aroma preencheu as narinas lupinas de Arlinn, enquanto ela corria pelo desfiladeiro, em direção à cidade sitiada de Lambholt. Ela rosnou para aquele cheiro, amaldiçoando-o. Ela não tinha sido rápido o suficiente. Deve ter sido ela que o fez sangrar, que o derrubou, que merecia sua ira. Ela era a protetora da Ulvenwald.
Mais rápido.
Ela tinha testemunhado, de longe, a descida do anjo louco em Lambholt; a criatura divina mergulhara, passara abaixo dos telhados e torres. Gritos de horror e flashes de luz se seguiram. Momentos depois, o anjo emergiu, asas ensanguentadas e espada em chamas, apenas para mergulhar novamente.
Embora Arlinn não tivesse visto o que acontecera além dos telhados, ela podia imaginar bem o suficiente – anjos loucos não costumavam fazer muitas coisas. Eles estavam quebrados, inconsoláveis, gritavam e choravam a morte de Avacyn pelo céu. Parecia impossível que o anjo não existisse mais, mas não havia como negar o buraco no tecido de Innistrad. Um buraco que estava se preenchendo rapidamente com os lamentos dos inocentes, rugidos de chamas, e gargalhadas de seres corrompidos.
A trombeta desesperada de um cátaro – um Noite Dourada, ela conhecia o toque – incitou Arlinn a seguir. Ela convocou a força da floresta, bombeando os músculos grossos de suas pernas, lançando-se para cima da encosta. Mais rápido. Mas ela temia que já fosse tarde demais. Sangue fora derramado, e não apenas angelical. Sangue humano também. Os cátaros. Arlinn poderia imaginá-los, as armas sagradas levantadas, invocações mágicas em seus lábios. Mas eles não seriam abençoadas com o poder pelo qual oravam – Avacyn não estava lá para responder às suas orações.
Anos Atrás
“Arlinn Kord, ao se apresentar aqui esta noite, respondestes ao chamado da santa protetora, Avacyn. Não há bênção maior do que a que você está prestes a receber. Por favor, dê um passo à frente.”
O arquimago Reeves estava no altar dos Noite Dourada, apontando para Arlinn se juntar a ele e ao arquimago Rembert. Eles não tinham idéia do quanto este momento significava para Arlinn. Eles nunca compreenderiam totalmente – ela não poderia lhes dizer. Era muito mais do que o sacramento do arcanjo, por mais extraordinário que fosse; mas, para ela, era libertador. Mas se tivesse que explicar isso aos homens santos diante dela, tudo estaria acabado.
Arlinn se levantou de sua posição de súplica e subiu as escadas para encontrar os dois arquimago. Reeves não olhou para ela, mas Rembert desviou o olhar, um sorriso em seus lábios finos. Arlinn devolveu o sorriso da melhor forma que pôde, com os lábios trêmulos. Ela fixou os olhos nas imagens familiares ao seu redor em uma tentativa de acabar com as ondas alternadas de ansiedade e expectativa que surgiam nela. A capela no Campo de Elgaud era pequena, mas longe de ser simplória. O altar brilhava com detalhes dourados que carregavam o símbolo da Avacyn. Espessos tecidos brancos se desenrolavam do telhado em todos os lados, criando a sensação de um local protegido, pacífico e poderoso, que era preenchido com nuvens de incenso.
“Em nome de Avacyn e com o poder investido em mim pela sua santa igreja, eu confiro-lhe esta bênção,” começou a entoar o arquimago Reeves. Arlinn conhecia bem aquelas palavras. Nos últimos anos, ela escutara esta oração inúmeras vezes nos, como a única cátaro que esteve presente em cada cerimônia de bênçãos dos arquimagos. Ela assistira aqueles que foram antes dela ficarem neste mesmo altar e receber o sacramento superior. Cada vez, ela se perguntava se um dia seria ela; cada vez, de seu assento no banco mais próximo do altar, ela duvidava de si mesma; cada vez, do mesmo banco, ela se lembrava de ter fé no poder de Avacyn. Agora, aqui estava ela.
O arquimago Reeves levantou a grossa corrente de ouro com o medalhão brilhando, o manto dos Noite Dourada. “Arlinn Kord, eu te presenteio com este manto, o símbolo de infinito amor e proteção incessante de Avacyn.”
No momento correto, Arlinn baixou a cabeça, e Reeves colocou a corrente no seu pescoço. O medalhão era mais pesado do que ela imaginara. Ela podia sentir o peso dele sobre seu peito e o seu poder sagrado. Era o poder que ela precisava, o poder que ela tinha vindo procurar aqui. Luz. Bondade. Verdade.
Ela sabia que deveria ficar parada, imóvel durante a duração da cerimônia, mas ela não podia parar de tocá-lo, segurando-o na palma da mão, correndo os dedos ao redor de sua circunferência. Era belo e puro, e agora era dela.
A mão do Arquimago Rembert apertou seu ombro. “Estou muito orgulhoso de você,” ele sussurrou enquanto Reeves continuava o cântico.
Uma onda de emoções juntas na garganta de Arlinn, a impediu de responder, mas ela encontrou os olhos de Rembert, desejando que ele visse a gratidão em seu olhar. Ele fora sua rocha durante os anos, um mentor que a incentivou, que foi paciente com ela, e que a ajudou a aprimorar seus pontos fortes. Ele a conhecia melhor do que ninguém, e mesmo assim, nem ele não sabia a verdade.
Arlinn desviou abruptamente o olhar do dele. Quantas vezes ela quis dizer a ele? Mas ela não podia. Se ele soubesse a verdade sobre ela, sobre o que ela era, sua mão seria forçada contra ela. O coágulo de emoções em sua garganta soltou-se e infiltrou-se em seu peito, transformando-se em culpa. Arlinn se encolheu. Ela prometira a si mesma que não sentiria mais nenhuma culpa, não depois de hoje à noite, mas não era tão fácil de se descartar como ela desejava que fosse. Imagens de suas proteções, centenas delas, que ela tinha feito contra a maldição da licantropia, passaram pela sua mente. A sensação do luar em sua pele. Os uivos que ela ouvia tarde da noite. Ela tinha mantido o segredo de todos eles, durante todo esse tempo. Ela teve que fazer isso. Uma licantropo não poderia ser uma Arquimaga dos Noite Dourada e Arlinn tinha de se tornar uma Arquimaga. Essa era a benção que a salvaria de sua maldição.
A bênção de Avacyn era mais forte do que o mal dentro dela. Ela reprimiria a selvageria. Foi para isso que ela trabalhara durante todos esses anos. Depois desta noite, ela seria capaz de confiar em si mesma. Finalmente, e absolutamente.
Ela suspirou, um suspiro que parecia segurar por anos. Ela olhou de volta para Rembert e segurou seu olhar enquanto Reeves completava o cântico dos Noite Dourada.
“E agora, nós oramos, juntos.” Reeves acenou para Arlinn, e ela se juntou a ele enquanto ele começava a oração final. “Querida, Avacyn, protetora de tudo, Santa que nos concede poder, nós-“
“É um ataque!” O grito cortou o ar carregado de incenso, e as cortinas brancas se agitaram, expondo o altar a uma rajada de vento frio que entrou pela porta. “Diabos em Havengul! Hordas deles!” Era o cátaro Leighton que estava gritando, correndo em direção ao altar, sua espada levantada. “O bando dos Noite Dourada veio até você.” Ele tropeçou nos degraus até Reeves. “Eles pediram a ajuda dos arquimagos.”
“Então iremos!” Reeves rasgou o manto cerimonial que estava usando, já seguindo Leighton pelo corredor.
Rembert seguiu o exemplo. “Arquimaga Kord, sua lâmina!”
Era ela. Ele a chamava. Uma Arquimaga. “Mas a oração. Nós não terminamos…” Ela sabia que era uma coisa tola para dizer naquele momento, mas sua mente estava cambaleando, suas emoções expostas. Durante todo esse tempo ela antecipara este momento, e agora era como se tivesse sido deixada pendurada por um fio, que poderia tanto soltar-se, como desfazer-se. Ela precisava saber se estava concluído; ela precisava saber que ela era, finalmente e totalmente, uma Arquimaga.
Rembert abriu a boca como que para repreendê-la, mas então seu olhar se suavizou quando ele encontrou seus olhos. Ele parou na porta. “Você me perguntou, antes desta noite começar, se eu acreditava que você estava pronta para se tornar uma Arquimaga dos Noite Dourada.”
Arlinn assentiu. “Sim.”
“E o que eu disse continua a ser verdade. Em minha mente você é uma Arquimaga desde que chegou aqui. Nunca vi um aluno mais brilhante e mais promissor. Agora você tem no nome o que você sempre teve no coração. Você é um dos Noite Dourada, Arlinn Kord, vinculada pelo sacramento que nos mantém juntos, vinculada ao anjo e uns aos outros. Cerimônia concluída ou não, é oficial.”
Arlinn tentou um sorriso. “Tudo certo.” Foi oficial. Ela poderia viver com isso. Embora ela desejasse sentir isso mais fortemente; ela imaginara que naquele momento ela sentiria uma onda de poder e liberdade.
“E agora os Noite Dourada foram chamados.” Rembert abriu a porta. “Nós devemos ir.”
“Sim, devemos.” Arlinn correu pelo corredor.
Rembert limpou a garganta enquanto eles se apressavam pela porta. “Porém, eu seria negligente se eu não concluísse os trabalhos da igreja e garantisse que a oração final estivesse completa.”
“Oh?” Arlinn olhou para o Arquimago.
“Repita comigo:Cara Avacyn, protetora de todos,” Rembert começou.
Juntos, eles completaram a oração final para Avacyn, dizendo as palavras entre as respirações ofegantes de ar frio cortante, enquanto corriam pelos Campos de Elgaud na direção dos estábulos. No momento em que ela subiu em seu cavalo, Arlinn era uma Arquimaga; ela sentiu em sua alma.
Eles encontraram a cidade de Havengul em chamas. Como Leighton avisara, hordas de diabos se penduravam pelos telhados e dançavam nas ruas. Um grupo de uma dúzia ou mais pulava pelos telhados da cidade, lançando bolas de fogo em qualquer coisa que não estivesse em chamas. Um deles empoleirou-se na cabeça de um velho homem, cortando seu rosto com os dedos finos como agulhas, enquanto outros dois penduravam-se nas mãos do homem para impedi-lo de retirar o que estava em sua cabeça. Outro dos demônios brincava com um jovem inconsciente, riscando desenhos desagradáveis em sua pele, com as unhas incrustadas de sujeira, deixando sangue apenas o suficiente para mantê-lo vivo, enquanto causava dor apenas o suficiente para que ele desejasse que não estivesse. Suas risadas soavam acima das chamas crepitantes, seus pulmões eram imunes à fumaça sufocante que havia feito tantos cidadãos se ajoelharem. Arlinn os odiou instantaneamente.
O bando dos Noite Dourada chegara pouco antes da cavalaria, e agora, arquimagos e cátaros se juntaram à batalha iniciada pelos anjos. Sua primeira prioridade era estabelecer um santuário. Um anjo, Freydalia, abençoou uma pequena igreja, lançando um feitiço de proteção sobre ele, e sob as ordens de Rembert, Arlinn e os outros começaram a levar as vítimas para a segurança. Primeiro eles salvaram os inocentes, e depois, lidariam com os ímpios.
Arlinn agachou-se ao lado dos restos em combustão de uma carroça virada para cima, colocou sua mão debaixo da madeira quente, tentando alcançar a mão de um menino. Outro anjo, Olaylie, pairou acima, segurando uma massa de demônios que ameaçava saltar de um telhado próximo.
“Eles não serão dissuadidos por muito mais tempo,” Olaylie disse para Arlinn. O anjo empalou um dos diabos com sua lança, mas, ao mesmo tempo, outros quatro pularam para pegar sua arma, iniciando-se um terrível cabo-de-guerra.
Arlinn estendeu os dedos mais longe em direção ao garoto. Ela tinha que se apressar. “Dê-me a mão,” ela implorou.
A criança sacudiu a cabeça. A carruagem rangeu acima dele. “Os diabos, eles vão me acertar com fogo, se eu sair.”
Arlinn não queria dizer que, se ele não saísse, ele encontraria uma morte ardente do mesmo jeito; ela não queria assustá-lo mais ainda. “Eu sei que você está com medo,” ela disse, “mas você não precisa ter. Eu vou te proteger, assim como o anjo lá em cima.” Ela estendeu novamente a mão, mas ainda assim o menino se encolheu.
“Mas você são apenas dois, e há tantos demônios.” Ele olhou para cima através de uma fenda na madeira enquanto uma tábua de fogo caía da carroça no chão, ao lado de Arlinn.
Eles estavam correndo contra o tempo, mas Arlinn não podia fazer o menino confiar nela, então ela virou-se para a sua fé. “Você conhece Avacyn?” ela perguntou.
Ele assentiu.
“Então você deve saber que ela é mais do que eu jamais poderia ser, mais do que até mesmo aquele anjo sagrado poderia ser. Avacyn irá ajudá-lo se nós não pudermos.”
O menino considerou as palavras de Arlinn. Ela não sabia dizer o que estava acontecendo por trás de seus olhos castanhos arregalados – tudo o que podia fazer era esperar que ela o tivesse convencido. “Ore comigo,” ela insistiu. “Juntos vamos pedir a ajuda de Avacyn.” Ela escolheu a mais popular das orações que sabia, esperando que ele também a soubesse. “Querida, Avacyn, oramos para você agora em nosso tempo de necessidade. Pedimos que voc-“
“Como você sabe?” O menino interrompeu a oração. “Como você sabe que ela vai ajudar?” ele pressionou. “E eu quero uma resposta séria. Não apenas algo que você diria para me fazer sair. Eu sei como adultos fazem, e não vou sair, com os demônios aí, só porque você disse isso.”
Era a vez de Arlinn considerar a criança. Ela podia ouvir as asas de Olaylie batendo furiosamente sobre eles, e sentir o calor das chamas dos diabos. Porém uma pressão maior do que a combinação dessas duas vinha do seu olhar. “Vou dar-lhe a resposta mais séria que conheço,” disse ela. “Eu sei que Avacyn vai ajudar se você orar, porque ela me ajudou. Alguma coisa muito ruim aconteceu comigo uma vez, e eu estava com medo. Eu estava sozinha. Mas então eu aprendi que não estava. Avacyn me salvou.”
A carruagem acima deles se inclinou. “Depressa, Arquimaga Kord!” Olaylie chamou de cima.
“Dê-me sua mão. Por favor.” Arlinn se estendia até onde ela podia, as pontas de seus dedos chegando um pouco abaixo do cotovelo do rapaz.
“Você é uma Arquimaga?” A expressão do rapaz mudou de dúvida para espanto.
“Eu sou.” Arlinn acenou para baixo, para o medalhão que pendia em seu pescoço enquanto ela apoiava suas costas contra a madeira quente.
“Isso é importante,” disse o garoto. “Tudo bem.” Ele se moveu cautelosamente, e muito lentamente. Arlinn prendeu a respiração quando sua pequena mão alcançou a dela.
A carruagem gemeu acima deles como uma besta. Arlinn começou sua própria oração. “Avacyn me dê força para salvar essa criança inocente.” Ela sentiu o manto de Arquimaga acender-se contra seu peito. A bênção do Avacyn agitava-se dentro dela. Em voz alta, ela orou para o menino – “Protetora do nosso mundo, por favor nos dê segurança até seu santuário.” A agitação tornou-se um dilúvio avassalador de poder sagrado. Quando a mão do menino tocou a dela, Arlinn o puxou de debaixo da carruagem, com uma força divina que fez os dois rolarem pelo chão, pouco antes da carruagem desabar.
O anjo Olaylie desceu, protegendo Arlinn e o menino dos fragmentos de lenha flamejante e dos ataques lançados pelos diabos. O menino chorava.
“Nós estamos bem,” Arlinn enterrou o nariz no cabelo emaranhado do menino, respirando o cheiro de sua vida. “Você está bem.” Ela balançou ele, acariciando seu rosto. “Vou levá-lo para a igreja agora.” Ela levantou a mão de sua cabeça e sua respiração ficou presa na garganta. Seus dedos estavam cobertos de sangue. Seu coração adiou a sua próxima batida; recusou-se a sustentar a sua vida até que ela soubesse que ele viveria. Ela vasculhou a cabeça, procurando a fonte do sangue, procurou em seus ombros, no pescoço. Nada. Mas havia mais e mai sangue. E, em seguida, uma gota vermelha caiu em sua própria mão. Ela olhou para cima.
Olaylie cambaleava no céu, com um diabo nas costas. Ele agarrara seu cabelo com seus dedos afiados. Um segundo diabo pulou em sua perna e um terceiro em seu ombro. Todos cravaram suas mãos perversas em sua carne pura. O anjo gritou.
Arlinn nunca tinha visto um anjo sangrar. Era como se fosse ela quem estivesse tendo o rosto dilacerado, como se fosse seu o grito de agonia que ecoava pela cidade.
Uma gota de sangue caiu na bochecha de Arlinn. Ela podia sentir o cheiro; o sangue de anjo tinha o cheiro das árvores do bosque, o ar dos céus, e as águas do mar. Era um aroma inebriante, pesado com o poder sagrado. Ele não existia fora do corpo do anjo. Ela se moveu para ajudar, chamando o anjo em desespero, “Olaylie!” Mas, então, lembrou-se do menino, agachado na altura do seu braço. Ela olhou para; o sangue do anjo espalhado em seu rosto.
“Salve a criança primeiro, Arquimaga Kord!” A voz de Olaylie veio de cima; era uma ordem, mas foi seguida por um pedido mais suave. “Arlinn, por favor, salve a criança primeiro.”
Tudo que Arlinn pôde fazer foi desviar os olhos da visão dos demônios rasgando a pele do anjo; se ela assistisse mais um momento, ela não seria capaz de obedecer a ordem de Olaylie. Ela ofereceu a mão novamente para o menino. “Venha comigo.”
Desta vez, ele não hesitou. Ele a deixou guiá-lo através do centro de Havengul, correndo em direção ao santuário, sua pequena voz entoando: “Cara Avacyn, por favor ajude aquele anjo. Pare os demônios de fazê-la sangrar. Eles estão machucando ela.”
Presente
“Em nome de Avacyn, a protetora caída, eu os matarei!” O gemido da voz de um anjo louco soava enquanto Arlin subia o desfiladeiro. Ela avançou e derrapou até parar, garras cavando o chão da floresta, enquanto uma clareira se abria diante dela. O anjo louco estava no chão no centro do anel de árvores. Arlinn permaneceu escondida nos arbustos – não ser detectada lhe daria a vantagem. Ela olhou através dos ramos, respirando grandes quantidades de ar impregnado com sangue angelical. O anjo estava preso com cordas, uma flecha cravada em seu abdômen, suas asas ensanguentadas. Cátaros a cercavam por todos os lados, com as armas preparadas. Apesar de tudo isso, o anjo estava em vantagem. Ela era um ser de poder incomensurável, ainda mais potente na sua loucura.
“Impuros!” o anjo gritou para os cátaros. “Todos vocês são impuros!” Sua espada brilhava com magia ígnea enquanto ela se contorcia entre as cordas. Ela gritou, um som vingativo de raiva que arrepiou Arlinn.
Os instintos de Arlinn a impeliam a proteger os cátaros. Apertando os dentes, ela caminhou no meio do mato, preparando o bote; havia pouco tempo para encontrar uma abertura.
“Segure-a rápido!” Uma voz familiar parou Arlinn. Suas orelhas giraram. “Não larguem essas cordas!” As pernas de Arlinn ficaram rígidas; não podia ser. Mas quando o Arquimago avançou por trás do anjo, gritando ordens aos cátaros, já não havia mais dúvidas. “Arqueiros, mirem.” Embora o rosto de Rembert estivesse vermelho pelo esforço e coberto com uma crosta de sujeira, as três longas cicatrizes brancas que cobriam seu rosto até embaixo de sua mandíbula, brilhavam ao luar.
O estômago de Arlinn revirou-se com a visão, com a lembrança. Ela se virou nas árvores mais grossas, sua cauda para baixo. Sua pata traseira quebrou um galho. Se ela não tivesse ficado tão abalada pela visão de Rembert, seus instintos selvagens teriam evitado isso, orientando seu corpo, mudando o equilíbrio, mas, neste momento, ela era mais humana do que selvagem, e sua mente humana estava vacilante, distraída, lenta. O ramo estalou e o anjo virou a cabeça – seu olhar se fixou diretamente na floresta, onde Arlinn estava escondida. Um sorriso inquietante espalhou-se por seu rosto, e o anjo levantou a mão. “Um monstro!” Ela apontou para Arlinn. “Ali nas árvores! Um monstro!”
Alguns dos cátaros se viraram para olhar, inclusive Rembert. Ele avistou o lobisomem antes dos outros, afinal, ele sabia o que estava procurando. Seus olhos se encontraram com os de Arlinn e ele levou a mão ao rosto, os dedos traçando a mais longa das cicatrizes. Um tremor correu pela espinha de Arlinn.
“Lobisomem!” outro dos cátaros gritou, despertando Arlinn do transe do passado.
Os homens e mulheres sagrados recuaram reflexivamente do lobisomem, se aproximando mais do anjo – Não! Arlinn quis gritar, mas seria apenas um grunhido, seria pior. Já estava pior. Aquele momento de lapso de vigilância era tudo o anjo precisava. Em uma demonstração de força insana, ela abriu suas asas com força suficiente para arrebentar as cordas que a prendiam.
“Parem-na! Segurem as cordas!” Os cátaros gritavam, mas era tarde demais.
O anjo alçou o vôo. Pairando no ar acima, ela arrancou a flecha de seu abdômen e atirou-a para baixo, na mais jovem dos cátaros. “Impuro! Eu te condeno!”
Arlin ajoelhou enquanto a jovem caía no chão, sem vida. Seus insintos a dominaram e ela investiu contra o anjo, mandíbulas abertas que se fecharam apenas em torno de um galho grosso. Rembert empunhava o galho como uma arma contra ela. Ele o puxou de volta e atacou novamente. Arlinn se esquivou, seus quadris derraparam na lama misturada com o sangue de anjo. Ela arrastou-se de volta a seus pés, mas ganiu quando o golpe de Rembert atingiu sua cauda.
“Peguem-na!” Rembert gritou aos outros cátaros; ele a golpeou novamente enquanto ela se escondia atrás de um tronco quebrado. “Peguem o monstro!”
Lâminas cortavam e flechas voavam, algumas para o anjo e outras para Arlinn.
“Pare!” Ela queria dizer para Rembert. Ela queria dizer que ela já não era o monstro que ele tinha conhecido. Na verdade, ela nunca tinha sido.
Anos Atrás
“Leve-o! Leve o menino!” A Arquimaga Arlinn Kord empurrou a pequena criança nos braços estendidos de Rembert. Ela não esperou para vê-los recuar até a segurança do santuário antes de descer as escadas, sua lâmina já desembainhada.
Sua visão ficou turva com a fumaça das chamas dos diabos, mas não a ponto de não enxergar o horror diante dela. Havia, pelo menos, uma dúzia de demônios pendurados em Olaylie, puxando seu cabelo, arrancando as suas penas, e cortando sua pele.
“Não!” Arlinn gritou. “Fuja!”
Os diabos gargalhavam e lançavam feitiços de fogo contra Arlinn. Ela desviou o fogo com sua lâmina e seguiu para frente, mais para perto. “Eu vou calar seus risos!”
Como se suas palavras fossem a deixa para uma terrível piada, os demônios soltaram uivos ferozes, suas pernas ossudas se agitavam em frenesi. O que estava sobre a cabeça de Olaylie apontou para Arlinn e gritou, um grito que para os outros parecia ser um comando. Em uníssono, eles arrancaram as asas do anjo, enviando Olaylie ao chão. Eles celebraram com alegria quando ela desabou, caída na imundicie, incapaz de voar novamente.
Arlinn correu para eles, canalizando toda a sua força, todo o poder divino que ela podia depositar em sua lâmina. Ela rezou. “Avacyn, me guie. Dê-me o teu santo poder – se alguma vez precisei, é agora.” Ela se enfureceu através do fogo que os demônios cuspiam nela, sem medo de se queimar. Sua espada atingiu um deles direto no peito. Ela puxou a lâmina e golpeou outro. Em seguida, um terceiro. Mas antes que pudesse atacar novamente, uma dúzia de diabos pulou dos telhados e choveu sobre ela.
Arlinn mal teve tempo de entoar uma oração silenciosa, “Avacyn, eles são muitos, me ajude.” Ela foi agarrada por trás, por dedos em forma de agulha que rasgavam seu casaco. Ela se virou, tentando cortar o diabo, mas ele estava grudado em suas costas. Ela sentiu o peso de outro juntar-se ao primeiro, e depois um terceiro. Rabos enrolados em volta do seu pescoço, queimando sua pele. Unhas cravadas em seus ombros e costas, puxando-a para baixo. Risos agudos ressoavam em seus ouvidos, enquanto ela era arrastada para o chão. “Avacyn, por favor.”
Não houve resposta.
A dor era grande, mas pior era ver o anjo à sua frente, lutando contra a horda sufocante. Entre o anjo e os diabos, havia apenas vermelho, onde antes houvera o branco puro de Olaylie.
“Não!” Arlinn lutou para se levantar, mas ela também estava sendo enterrada pelos demônios. Lágrimas ou sangue, ela não sabia dizer, escorriam por suas bochechas. Isso não estava certo. Não era para acontecer desta forma. Ela era uma arquimaga de Avacyn. Avacyn! Arlinn lutava entre arranhões e mordidas, tentando alcançar o medalhão no pescoço. Seus dedos se fecharam em torno do manto de Arquimaga dos Noite Dourada; “Avacyn, por favor, venha me ajudar.” Ela esperou, abrindo-se ao poder da protetora; ela precisava de poder para salvar o anjo. Mas não houve nada.
Ali, quase ao seu alcance, Olaylie gritou, finalmente, uma explosão sonora depois de ter resistido à dor por tanto tempo. O grito do anjo carregava uma agonia tão grande que rasgou a noite em dois.
Arlinn sentiu o poder da dor no grito de Olaylie, e, assim como a noite, ela se sentiu rasgar.
O lobisomem atacou os diabos. Mandíbulas estalando. Apertando a garganta do mais próximo, arrancando a cabeça do corpo. Jogando-a no pátio.
Mais.
Garras atravessando peitos. Arrancando caudas. Arremessando corpos para longe.
Mais.
Mastigando ossos.
Rasgando carne.
Quebrando colunas.
Carcaças voando.
Mais.
Penas.
Havia penas na boca do lobisomem.
O gosto do sangue de anjo. Intoxicante. Ambrosia quente. Perfeito.
O choque brilhou nos olhos do anjo. Ela se levantou, tentando se afastar, mas não foi rápida o suficiente. As garras do lobisomem atingiram sua perna, rasgando a panturrilha até se fixar na carne. O prazer de dilacerar aquela pele perfeita era incomparável. O lobisomem puxou o anjo de volta ao chão e mordeu sua carne.
“Pare!”
O lobisomem virou-se ao som da voz. Havia um ser humano ali, um homem que ergueu sua espada. O lobisomem acertou sua barriga. Sangue e órgãos se derramaram.
Mais.
O lobisomem se virou para o anjo, porém mais humanos o cercaram. O lobisomem golpeou a lâmina de uma espada balançando, arremessando-a no ar, em seguida, cortou o braço que a empunhava. O humano caiu. O lobisomem pisou no membro amputado, duro, quebrando o osso só para sentir o estalo. O lobisomem estraçalhou o resto do corpo.
Outro humano atacou o lobisomem, espada e escudo cobertos com luz ofuscante. Um salto e o lobisomem já estava atras do humano. Um bote, estocada de garras, e o humano caiu aos pés do lobisomem.
Mais.
Um após o outro. Todos caíram à mercê do lobisomem.
Então, de repente, vindo do alto, um raio atingiu o lobisomem, arrancando um grunhido de dor. Outro raio atingiu as costas do lobisomem. O anjo tinha se recuperado o suficiente para alçar vôo. O lobisomem rosnou. O anjo pairava acima, com um brilho dourado através da sujeira e sangue que cobriam sua pele. Ela mirou com uma lança feita de luz sagrada.
O lobisomem saltou para cima, cortando o ar descontroladamente tentando atingir o anjo brilhante. Garras primeiro, e depois os dentes. A ponta da asa do anjo foi decepada. Um estalo e a ponta da asa do anjo se quebrou. Um punhado de penas, ossos cartilaginosos e sangue angelical.
O anjo perdeu altitude. O lobisomem saltou novamente, desta vez mirando na outra asa. Após ela ser totalmente arrancada de seu corpo, o ser sagrado caiu do céu.
Enquanto o lobisomem caminhava na direção do anjo caído, o anjo lutava para ficar de pé, recuando, mancando, tentando correr, tentando voar, falhando. O lobisomem avançou, derrubou o anjo no chão. Dentes afundaram em carne macia. Os gritos do anjo fundiram-se harmoniosamente com o gosto de seu sangue.
O lobisomem nunca tinha o suficiente.
“Arquimaga Kord?” A voz chamou a atenção do lobisomem. O lobisomem virou, faminto. Um ser humano vestido em armadura e robes apontou uma espada trêmula para o lobisomem. “Arlinn?”
O lobisomem inclinou a cabeça para o lado. O nome que o homem falara parecia errado, cortava como uma faca.
O homem levantou a mão, apontando para o peito do lobisomem. “Por tudo o que é sagrado, é você.”
O lobisomem rosnou, mas seu olhar foi forçado para baixo. Ela viu o pingente que pendia de uma corrente no pescoço. Algo despertou em sua mente. Avacyn. Ela estalou suas mandíbulas, desviando o olhar. Seus olhos pousaram no chão. Sobre os corpos. Tudo ao redor dela eram corpos. Cátaro caídos. Muitos deles. Ela conhecia todos. Leighton. Reeves.
Sua mente queimava.
Não.
Não.
“Oh, Arlinn, o que você fez?”
O lobisomem virou-se para Rembert, dilatada pelo ódio. Por que ele veio até ela? Por que ele falou? A culpa era dele. Ela eriçou os pelos e rosnou. Ele deu um passo para trás, mas ela era mais rápida, pulando, cortando, suas garras cavando marcas em sua bochecha. Ele gritou, brandindo a espada contra ela, recuando.
O sangue floresceu vermelho em seu rosto. “Monstro!”
O lobisomem uivou de angústia, a verdade tomando conta de sua mente, crescendo descontroladamente, até que a realidade preencheu cada fenda e ameaçou rachar o seu crânio.
Rembert ergueu a espada. “Que Avacyn a perdoe.”
O lobisomem não recuou. A lâmina seria uma misericórdia. Deixe acertar. Ela não aguentava mais.
O aço brilhou, e a mente do lobisomem se dividiu.
Muitos Anos Depois
Durante muito tempo após isso, Arlinn acreditou em Rembert. Ela acreditara que era um monstro. Algo tão horrível e terrível que mesmo Avacyn não poderia salvá-la. E depois disso, por muito tempo, ela esteve furiosa com o anjo; a bênção de Avacyn deveria ser mais forte que a maldição, mas, no fim, não importava que ela era uma Arquimaga. Avacyn falhara com ela, as proteções falharam com ela; a licantropia havia vencido.
Ela teve um longo tempo para pensar sobre essas coisas; ela havia transplanado naquele dia, há muito tempo, quando sua mente foi dividida. A espada de Rembert nunca a atingira. Em vez disso, ela foi arremessada para fora do mundo, longe dos horrores que ela tinha cometido, longe do corpo do Arquimago Reeves a seus pés, longe do anjo ensanguentado e sem vida, Olaylie, longe do brilho nos olhos de Rembert. E ela chegara em uma floresta em um outro mundo.
Era impossível medir a passagem do tempo ali; ela não queria. O tempo não passava para ela; sua vida deveria ter terminado. De certa forma, tinha. O outro mundo era como um purgatório. Enquanto estava lá, ela não recuperou a sua forma humana nenhuma vez. Ela permaneceu um monstro por fora, mas, ao mesmo tempo, ela não podia escapar de sua mente humana e nem das memórias que ela mantinha. As duas partes de seu eu guerreavam, e sua alma foi pega no fogo cruzado.
Mas no final, Arlinn estava grata por isso; foi este estado de vida dupla que a forçou a ver a verdade.
Ela esteve errada ao pensar que se tornar uma Arquimaga mudaria quem ela era, o que ela era. Desde o primeiro momento, após os uivos da alcateia de Mondronen terem lhe amaldiçoado, ela procurara ajuda externa – amuletos, orações, Avacyn. Ela se convencera fortemente que o anjo e o poder sagrado da igreja poderiam consertá-la. Mas o que ela não havia entendido, era que ela não estava quebrada. Não da maneira que ela pensava. Ela era o que era e o que sempre seria. Era selvagem e instintiva, uma predadora, mas também era boa e verdadeira, uma protetora. Ela não poderia fazer uma parte de si desaparecer, ela não podia fugir de metade da sua essência. Ela tinha que ser ambos. Ela tinha que confiar em si mesma para ser inteira. Sua salvação nunca foi algo que ela deveria ter pedido ao anjo Avacyn, e sim para ela mesma.
Levou muitos anos, mas finalmente Arlinn voltou a Innistrad, confiando em si mesma a por os pés mais uma vez no mundo que ela tinha deixado para trás. Aquele foi o momento em que ela realmente ganhou o controle de seus poderes e de si mesma. Suas transformações estavam mais fáceis agora, sob seu controle. Sua mente era sempre sua, mas era aumentada pelo poder selvagem de sua forma física. Ela não era mais uma casca, ela já não estava fingindo, escondendo; Ela era tudo o que era para ser.
Arlinn pisou sobre a terra molhada, o nariz, excepcionalmente sensível, mesmo em sua forma humana, pegando os aromas familiares que traziam as memórias. Memórias muito numerosas para contar, todas ameaçavam lhe tirar lágrimas. Foi a primeira vez que ela colocou os pés nos Campos de Elgaud após vários anos. Ela esperava que o primeiro passo fosse ser o mais difícil, mas foram os próximos cem – aqueles que levavam à porta do Arquimago Rembert – que se provaram quase impossíveis.
Ela pensara estava pronta. Ela havia enfrentado todos os outros; ela havia visitado os túmulos de Reeves, Leighton de, todos eles. Ela havia orado nas igrejas de Avacyn por toda Nefália, confessando-se e fazendo penitências; ela já tinha falado com os anjos, olhado em seus olhos, admitido sua culpa e se colocado sob as sombras para ser julgada.
Rembert era o único que faltava. Ela levantou o punho para bater à porta de seu quarto, mas ela não precisaria. O cheiro dele atingiu seu nariz um instante antes de sua mão pesada cair sobre seu ombro. Ela se virou para enfrentar o Arquimago envelhecido.
“Como você ousa?” Rembert estava segurando um amuleto incandescente; ele havia construído proteções contra ela. O coração de Arlinn torceu-se em agonia. Este era o mesmo homem que antes tinha acreditado completamente nela, na bondade de sua alma. Agora, ela não ficaria surpresa ao saber que ele achava que ela sequer tinha uma alma. “Como se atreve a por os pés aqui neste solo sagrado?”
“Por favor, Arquimago Rembert, eu-“
“Monstro! Sua besta assassina!” Ele atirou o amuleto em seu peito e cuspiu em seus pés.
Arlinn recuou. “Por favor,” ela tentou novamente. “Eu entendo como você se sente, eu sei o que eu fiz. Não há nenhuma maneira de justificar. Mas eu não sou o que eu era naquela época. Agora eu sou capaz de usar o que eu tenho para o bem. Eu quero usá-lo aqui, com os Noite Dourada. Eu quero ajudar. Eu estou no controle.”
“Ha!” Rembert sacou a espada sagrada. “Controle é uma mentira que você conta para si mesma, para que você possa viver com o que você é.” Ele acenou com a espada, indicando sua forma humana. “Mas mesmo agora, enquanto você está nesta carne falsa, você é um monstro. Você sempre será um monstro.”
“Eu posso ser um lobisomem, mas eu não sou um monstro.” Arlinn manteve-se firme, diante de sua lâmina, que agora estava brilhando. “Eu sou um Noite Dourada. E eu sempre serei. Você mesmo disse iss-“
Rembert se lançou para ela, a palma da mão colidindo com o ombro, lançando-a contra a porta. Ele pressionou o lado de sua lâmina em seu pescoço. Arlinn recusou-se a revidar, ela não se permitiria provar que ele tinha razão. “O que eu disse a você antes de eu saber o que você era? Quando você ocultava a verdade de mim? Você não pode usar isso contra mim agora. Você não é um Noite Dourada, Arlinn Kord, você nunca foi.”
Arlinn fixou o olhar de Rembert. Ela não podia dizer nada; o coágulo de emoções que tinha sufocado suas palavras, há tantos anos, tinha retornado. Mas desta vez o coágulo tinha bordas afiadas, e a alfinetava como os dedos dos diabos, cutucando o interior de sua garganta e apunhalando os seus olhos.
Então, Rembert desviou seu olhar . Ele soltou um suspiro ofegante e recuou. “Saia.” Ele apontou para o corredor, mas desviou os olhos, olhando para o chão. “Deixe este solo, e nunca mais volte. Se algum dia eu a vir de novo, acabarei com sua vida.”
Arlinn inalou para falar, mas a voz de Rembert, carregada com poder sagrado, abafou suas palavras.
“Saia!”
Presente
Arlinn tentara fugir. Ela não queria o confronto. Mas Rembert não deixou isso como uma opção. Ela estava cercada contra a beirada do desfiladeiro, cátaros em todos os lados e Rembert na sua frente, seu galho grosso levantada sobre sua cabeça. “Eu te avisei,” ele soltou as palavras para ela, cada uma foi um duro golpe; sua arma contundente viria a seguir. Arlinn se preparou. Ela podia suportar mais golpes do que ele poderia imaginar, e ela não permitiria que ele a expulsasse, quando havia um anjo louco tão perto.
Então, como se invocado, o anjo louco desceu por trás dos cátaros.
Arlinn não poderia avisá-los rápido o suficiente. Ela não podia avisar Rembert. O anjo gritou enquanto fechava os dedos sangrentos ao redor dos braços de Rembert e o puxou, ofegante e de olhos arregalados, para o ar.
Os outros cátaros viraram suas armas contra o anjo, e Arlinn levantou-se, instintos protetores tomando o controle.
“Não! Ataquem!” Rembert gritou aos seus cátaros, ainda no comando, mesmo pendurado no ar. “Não virem as costas para o monstro! Matem o lobisomem!”
Os cátaros pareciam confusos. Alguns mudaram seu foco de volta para Arlinn, outros permaneceram focados sobre o anjo louco. O anjo gargalhou, não muito diferente dos diabos, e suas mãos em torno dos braços de Rembert começaram a brilhar com uma luz sagrada tingida de sangue. Ela iria matá-lo, lá, no céu, extinguir a sua vida com pouco esforço.
Uma dos cátaros soltou uma flecha, que passou inutilmente por cima do ombro do anjo. Ela estalou os dentes para a mulher. “Você vai ser a próxima, impura!”
Chega. Isto tinha ido longe demais. Convocando a força de seus músculos, Arlinn lançou-se, saltando por cima das cabeças dos cátaros. Ela alcançou o calcanhar da bota do anjo e cravou seus dentes no couro, puxando-a para baixo e se debatendo. O anjo caiu no chão com um baque retumbante, Rembert estava livre. Arlinn não perdeu tempo. Ela pulou em cima do ser sagrado, afundando seus dentes em sua carne. Agora, ela era puro músculos e tendões, impulsionada pelo poder selvagem da maldição da licantropia, a maldição que havia se tornado uma benção para ela.
O anjo louco estava morto em segundos.
Arlinn virou-se, ofegante, para os cátaros, mas eles não estavam atrás dela; eles estavam agrupados na beirada do desfiladeiro, alguns deitados, esticando seus braços. Rembert não estava à vista. O coração de Arlinn disparou e ela correu para o desfiladeiro, sua mente se preenchendo o que poderia ter acontecido.
Ela não estava errado. Rembert, ferido, havia caído sobre um tronco retorcido de uma árvore morta que não aguentaria o seu peso por muito tempo. Ele caíra muito longe para se alcançar a partir da borda, então ela desceu até outro tronco quebrado. Segurando a madeira molhada com suas garras, ela esticou um braço, oferecendo sua pata para Rembert.
Ele engasgou ao vê-la, se encolhendo, o medo marcava sua expressão
Ela esticou sua pata ainda mais, implorando silenciosamente que ela a pegasse.
“Monstro,” Rembert finalmente encontrou sua voz. “Vou te matar.”
Um rosnado levantou-se na garganta de Arlinn, mas ela o engoliu. Era a dor e o medo que tinham trazido aquelas palavras aos seus lábios. Havia muita dor entre eles. Mas tambem havia também uma ligação. Uma vez dos Noite Dourada. Sempre. Arlinn fechou seus olhos e saudou a transformação para sua forma humana; ela não deixaria o Arquimago perecer aqui esta noite por causa do medo. Quando ele abriu os olhos novamente, era uma mão humana que viu chegando à sua frente. “Pegue minha mão,” ela disse para Rembert.
Os olhos dele se encontraram com os dela. “Você mentiu para mim!”
Arlinn engoliu seco “Sim.”
“Você os matou!”
“Sim”
“Eu não posso— Eu não vou—”
“Eu não sou mais uma escrava da maldição,” disse Arlinn. “Eu estou livre agora para ser uma protetora como eu deveria ser. Por favor. Você já me conheceu um dia, conheça-me novamente.”
Os olhos de Rembert refletiam lágrimas, enquanto o galho rachava sob seu peso.
Arlinn estendeu a mão novamente. “Pegue minha mão.”
Rembert se fortaleceu e levantou o braço. “Avacyn, me proteja”, ele sussurrou.
“Avacyn se foi,” disse Arlinn. “Temos que encontrar forças uns nos outros.”
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