Mtg Lore
Compêndio da Lore de Magic the Gathering
EPISÓDIO 01: A BRUXA NA FLORESTA
Não cace em Kessig, é o que dizem. Os cães vão te encontrar.
O pensamento arranca uma gargalhada do fundo de seu peito. Cada gota de seu sangue alquimicamente refinado clama pelo crepúsculo, e o crepúsculo finalmente respondeu. Um coral se ergue dentro dele, um culto implorando pela chegada de seu deus invisível, e ele sabe que a libertação está próxima.
A verdade é que ele nunca esteve realmente em perigo. Os cães podem incomodá-lo, os santos podem incomodá-lo, outros vampiros podem incomodá-lo – mas esses humanos não são problema algum. Falcões não tem medo de ratos – mesmo que os ratos tenham garras afiadas.
“Eu não sabia que tantos de vocês desejavam a morte,” ele grita por cima do ombro. O sangue do ancião o fez se sentir mais ousado do que nunca. Será que os aldeões algum dia dormirão de novo sabendo quão facilmente ele se infiltrou em seus corações? É provável que não, provavelmente não, mas isso não o impedirá de voltar em algumas semanas para descobrir. É importante acompanhar seus investimentos.
E semear o medo é sempre um investimento.
Em vez de responder, os caçadores disparam seus virotes, os dois maiores atravessando o ar, rápidos como um relâmpago e altos como um trovão. Ambos apontaram direto para sua cabeça. Eram bons tiros, mas ele não era nenhum cervo, urso, ou qualquer criatura simplória da floresta. Uma velocidade sobrenatural faz com que ele se esquive de um e agarre o outro direto do ar. Uma estaca? Que coisa, eles estavam ficando ousados, não é?
Mas Klaus, ele está de bom humor. Magnânimo até, abarrotado como está, o sangue ainda manchando os talismãs que ele vendeu aos aldeões despercebidos. Estaca na mão, ele salta para um galho pendente. Com seu peso firme sob seus pés, ele se vira para enfrentar os caçadores abaixo dele.
“Senhores, senhoras,” ele diz. “Devo agradecer pelo exercício. De verdade.”
Olho para eles. Vejo o medo estampado em seus rostos, as linhas profundas esculpidas pela preocupação. Lamentável.
“No entanto, pequenas porções, se vocês olharem para o céu vão perceber que horas são,” ele diz. Ele já podia sentir, seu corpo se tensionando sob o encanto, seus dentes ficando maiores e mais afiados. Em situações como estas, a forma humana é apenas um obstáculo. As outras linhagens vampíricas não parecem perceber aquilo, mas os Falkenrath percebem. Força é a única coisa que importa. Aquela força vem do sangue, e o sangue os separa para sempre da escória da vida humana. Não é melhor se aproveitar disso? Não é melhor ver aonde seu sangue pode levá-lo?
O dele está começando a ferver.
“Sol se pondo, caça acabando,” ele diz, mas sua boca já mudou, já se tornou algo desumano; seu corpo se alongando para uma forma mais monstruosa e assustadora do que qualquer outra vista pelos camponeses. Ela veio com um rosnado grave e faminto.
O medo deles é delicioso para ele. Suas pupilas dilatadas, sua respiração irregular ao vê-lo! A lua abre o véu das nuvens por um instante; sua luz prateada torna seu rosto ainda mais aterrorizante, mais aparente, ainda mais horrível. O ar está denso de expectativa.
Klaus mostra os dentes.
É algo natural.
E, talvez, também seja natural o que acontece a seguir – os caçadores compartilhando olhares intencionais, suas bocas crescendo em sorrisos tão horríveis quanto o de Klaus. Um por um, eles largam suas armas. O maior deles, um homem que mais se assemelha a uma placa de madeira do que um humano, ri em um tom tão grave quanto faminto.
Ele mal tem tempo de se preparar para isso: a carícia do luar sobre os caçadores à espera, seus corpos explodindo de suas limitações carnais para suas formas reais: feras imponentes, suas línguas lambendo seus focinhos, seu pelo nem tentava esconder as densas placas de músculos que compõem seus corpos selvagens. Os dois maiores são mais parecidos com o sonho de um suturador do que qualquer cão que ele já vira, seus peitorais eram como os barris de cerveja que ele montou uma vez com seu pai, seus braços grossos como o tronco da árvore sobre a qual ele se empoleirava.
Sua garganta fecha.
“Esse ditado,” rosna o líder, “só se aplica a humanos.”
Klaus sabe bem quando correr, quando fugir, quando subir aos céus como os falcões que tanto tenta emular. Ele salta do galho. Se ele conseguir mudar sua forma rápido o suficiente –
Mas ele não consegue.
Afinal, os cães podem arrancar qualquer coisa do ar se quiserem.
Mandíbulas esmagam seu peito. Ele está no chão antes de saber o que aconteceu, os lobos circulando, olhando para ele como se um vampiro de duzentos anos não fosse para eles mais do que um saco de carne.
“Você não pode fazer isso comigo,” ele gagueja. “Não é assim que funciona. A noite-”
“A noite pertence a quem a domina,” diz o líder pouco antes de sua boca se transformar em focinho.
É a última coisa que Klaus ouve.
“Sim?”
“A colheita não está longe,” Arlinn diz. “Você terá que repor os estoques, mas deve haver o suficiente para alimentar todos nesta temporada. Os caçadores podem cuidar do resto.”
“Nesta temporada,” Agatha repete. “E na próxima? E o que acontecerá quando todos os nossos caçadores estiverem…”
“Dizem que foi um vampiro. Você acredita nisso? Um vampiro aqui tão longe?” Agatha diz. “A guarda o rastreou. Eles me perguntaram se eu queria ver o coração. Disseram que foi fácil matar ele.”
“Acho que os vi no caminho para cá,” Arlinn diz. “Trabalhando em… parecia um pouco com um espantalho, mas muito maior. E com presas. Algum tipo de efígie.”
“Aqui,” ela diz. “Todas essas lágrimas vão te deixar com sede, quer você saiba disso ou não.”
“Não, não podemos,” diz Arlinn. Ela também se serve de uma xícara. “Então, tenho uma ideia. Enquanto estamos bebendo essas duas xícaras, falemos sobre nossas famílias. Eu vou te contar tudo sobre meus irmãos, e você pode me falar sobre Finneas.”
“Que bom,” diz Arlinn. “E depois, você pode me contar mais sobre essa bruxa.”
Arlinn conhece esses bosques e eles a conhecem. Em todos os lugares em que seu olho pousa, uma memória espera para saudá-la. Aqui – os arranhões em um carvalho de uma antiga caça. Por dois dias, ela e seus lobos rastrearam um cervo branco pela floresta. Você pensaria que seria mais fácil de encontrar do que era, mas havia algo sobre aquele cervo, algo que a enfeitiçava sempre que sentia seu cheiro. No momento em que ela e os lobos o encurralaram ao pé de um penhasco, eles o deixaram ir embora. Às vezes apenas colocar seus olhos em algo era sucesso o suficiente.
No entanto não era aquilo o que o lobo dizia a ela. Ela se lembra de ter visto aquilo diante dela: seus olhos rosa de sangue e água, seu pelo brilhante como a neve com que ela tantas vezes sonhou. Ela se lembra da fome crescendo na boca do estômago. Quando você está de quatro, é tão fácil provar algo, tão fácil morder, rasgar e agarrar. Os lobos da floresta ao seu lado revelaram suas intenções em rosnados baixos e ranger de dentes. Eles também estavam com fome.
Mas havia alguma coisa da lua sobre aquele cervo, algo que dizia a ela que não era para seus estômagos. A beleza inocente era uma coisa rara em Innistrad, tão rara quanto a inocência, e ela não seria a culpada por destruí-la. Arlinn voltou à sua forma humana. Os lobos sentaram-se, mal-humorados, e não disseram mais nada enquanto ela sussurrava uma bênção.
O cervo branco saiu correndo.
Os lobos voltaram à caça.
No fim das contas, encontrar outra refeição não foi tão difícil. Eles foram dormir, os cinco, enrolados uns nos outros com os estômagos cheios de uma carne menos sagrada.
E quando acordaram pela manhã, havia um crânio diante deles, descansando em cima de uma espada enfiada no chão. Pelo branco agarrado ao osso. Ela conhecia a espada, ela conhecia o cheiro que se agarrava à carne do cervo, ela entendeu a mensagem.
Tovolar nunca gostou de suas tendências suaves.
Onde quer que ele esteja e o que quer que esteja fazendo não é mais problema dela. Eles escolheram seus caminhos há muito tempo. Ele encontrou seu bando, e ela encontrou o dela.
Os lobos estão ansiosos para conhecê-la e para brincar. Encontrem as bruxas, ela disse a eles, e ficaram felizes em ajudar no que podiam. A cada minuto, enquanto ela corre pela floresta, ela ouve um chamado e corre para encontrar apenas um galho de formato estranho esperando por ela, e o lobo olhando para ela com expectativa. Ela agradece a eles, é claro; mesmo esses galhos estranhos tinham suas próprias pistas.
Ele pula para cima e para baixo e então dispara como um raio. Ela leva apenas um momento para se transformar e seguir atrás dele. Ele é o mais rápido da sua matilha. Lobos não têm nomes no sentido humano, mas parece errado passar tanto tempo com alguém sem nomeá-los. A listra branca na lateral dele, somada à sua impressionante velocidade levou-a a chamá-lo de Rajado. Sua companheira, Presa Vermelha, seguia atrás deles em um ritmo razoável, sempre alerta para qualquer potencial perigo. Paciência – assim batizada por esperar do lado de fora das portas da catedral diariamente por ela – competia com Presa Vermelha pelo terceiro lugar. Às vezes ela até passava na frente. Pedrada, o maior e mais amigável deles, vinha na retaguarda, sua língua batendo em todas as direções.
Agora que ela sabe o que procurar, seguir os símbolos é bastante fácil. Ela pode se entregar à caça – as folhas sob os pés, o ar frio da floresta, seus sentidos iluminados com a vida. Correr sobre quatro pés parece muito mais natural do que sobre dois. Às vezes, ela pensa que não poderia correr em sua forma humana.
O uivo empolgado de Pedrada é apenas o primeiro. Todos sentem aquilo, a emoção da selva indomada, os perigos de Innistrad afastados pela alegria do momento. Arlinn se junta a eles. Por enquanto, pelo menos, ela quer se sentir livre.
Mas assim que o uivo a deixou, ela o vê: um cervo, branco puro, embaixo de um galho enfeitado com prata esculpida. Seus olhos rosa pálidos fixam-se nos dela.
Arlinn pára de repente. Seus pelos se eriçam ao longo de suas costas; ela rosna para os outros pararem. Alguma coisa estava errada. Não pode haver dois deles, e encontrá-lo aqui entre todos os lugares possíveis… alguém deve estar tentando enganá-los.
Ela não será enganada. Uma inspiração profunda aumenta sua percepção – enquanto o cervo simplesmente fica andando em volta do grupo. Primeiro – não tem cheiro de cervo. Suor, sim; corante, sim; até mesmo o cheiro de magia, mas nada parecido a um cervo. Em segundo lugar, ele não está agindo como um cervo comum. Tudo na floresta corre de uma matilha de lobos. As únicas exceções são outros lobisomens. Mas também não é algo desse tipo.
O cervo anda em volta deles. Presa Vermelha abaixa o focinho e rosna quando ele se aproxima. O cervo se afasta, fixando os olhos mais uma vez em Arlinn. A maneira como ele inclina a cabeça era a última pista que ela precisava.
Arlinn grita uma ordem para os outros ficarem parados. Ela se esconde atrás de uma árvore e volta para sua forma humana. Paciência salta com sua mochila de couro – ela pega suas roupas.
“Katilda, não é?” ela diz. “Espero que você me dê um momento para ficar mais decente.”
A floresta ao seu redor parece rir – ela sente a risada contra suas costas enquanto se transforma. Apenas quando olha ao redor que ela percebe que eles estão sob um dos enormes arcos de pedra do Celestus. Alguma coisa na estrutura sempre a lembrava do funcionamento interno de um relógio. Às vezes, dizia-se que os ponteiros se moviam sobre a plataforma central – que por si só eram tão grandes quanto uma praça. Arlinn nunca tinha visto isso acontecer, mas ela tinha várias ideias sobre que tipos de rituais antigos deveriam usá-lo.
“Se você perdoar meu pequeno truque, eu vou te desculpar por esperar você se vestir,” veio a resposta. Sua voz era ao mesmo tempo encantadora e distante. Ela soa, Arlinn pensa, como uma matrona da aldeia que percebeu há muito tempo que era você que roubava as tortas dela. “Os lobos nesta floresta não são tipicamente tão bem-comportados. A maioria deles teria atacado.”
Arlinn dá a volta na árvore. Onde antes não havia nada além de árvores e arbustos, ela agora vê um enclave: galhos e peles transformados em tendas, decoradas com as mesmas meias-luas e esferas que ela tinha visto antes. Velas flutuantes dão ao lugar uma luz misteriosa, assim como os estranhos espantalhos espalhados. Arlinn franze a testa. Caminho iluminado – era como sua mãe costumava chamar. Há uma velha história sobre alguém salvando um menino perdido na floresta e caminhando com ele até o Festival da Colheita. Outra história é sobre caçadores espreitando por Ulvenwald em busca de peles. Uma vez, nenhum deles voltou. Em seguida, esses caminhos surgiram, nascidos das angústias de suas famílias. Ela nunca imaginou que veria um pessoalmente, muito menos tantos. Os sorrisos esculpidos em rostos de cera gotejante… só em Innistrad essas coisas poderiam ser reconfortantes.
Mas também há pessoas no enclave – talvez duas dúzias delas. Algumas mulheres, alguns homens, alguns parecendo evitar tais rótulos. Vestidos com cocares elaborados, eles murmuram feitiços diante dos caminhos iluminados. Um homem de pele escura esculpe uma abóbora sorridente, as pedras lunares balançando em seu cocar piscando na luz. Duas mulheres cercam um caldeirão borbulhando e fervendo. Talvez fosse o ar frio, mas Arlinn pôde ver a fumaça subindo a alguns metros de distância. E ela também pôde sentir o cheiro do delicioso ensopado.
E há uma mulher sentada diante deles em um toco musgoso com um cajado no colo. Seu cabelo branco enrolado em muitos ramos de seu cocar; a pálida meia-lua e a esfera pintadas em sua pele escura só serve para fazer seus traços se misturarem. É difícil dizer, exatamente, se os lobos ou a própria Arlinn chama mais a atenção dela – mas ela acha tudo isso muito divertido.
“Não somos como a maioria dos lobos,” Arlinn diz. Olhando para o enclave, ela estreita os olhos. “E eu imagino que vocês não são como a maioria das bruxas.”
Não podiam ser – Arlinn não sente o mal no ar daqui. Por mais assustadoras que fossem as sombras que seus cocares lhes emprestam, por mais estranho que a tinta torne suas feições, não há dúvida de que são humanos. Isso por si só já é um pouco confortável, mesmo que ela não tenha ideia do que eles estão fazendo. A magia aqui não tem o cheiro típico de magia. É como algo que foi deixado para fermentar, que tem o cheiro do tempo que passou.
“Isso depende de para quem você pergunta,” diz Katilda. “Antes da chegada do Arcanjo, éramos mais bruxas. Com a chegada, fomos para as sombras, e agora que ela partiu, estamos mais uma vez na Luz.”
Arlinn inclina a cabeça. “Você não parece tão anciã.”
“Não precisa ser nesta forma, nem com este nome,” Katilda diz. Ela aponta com seu cajado para a árvore perto de Arlinn. “Uma noz não é, em si mesma, um carvalho. Dado o tempo, a água, o sol – pode se tornar uma. Conosco é assim.”
“Então você está regenerando algo,” Arlinn diz. “Quem é Você?”
“Somos o que já foi e o que será. Somos o que a escuridão não pode matar. Somos o Conventículo do Cervo da Aurora.” A mulher fala com a voz de três, seus olhos brilhando a cada sílaba. A ponta de seu cajado brilha. Ela o bate na terra. A relva ao redor deles começa a desabrochar, crescendo rapidamente, adquirindo uma forma estranha. Em questão de segundos, Arlinn a reconhece: a orgulhosa cabeça do cervo branco. “Mas quem é você, loba?”
“Meu nome é Arlinn Kord,” ela responde. Ela não olha o cervo-de-galhos nos olhos, nem mesmo quando os olhos florescem. Ela conhece muito bem o cheiro de beladona. “Não haverá nenhum Conventículo do Cervo da Aurora se não houver nenhuma aurora – e neste ritmo, não haverá uma por muito tempo. Estou aqui para obter respostas.”
“Você não me deu uma resposta.” Outra batida do cajado – gavinhas fluem para preencher as lacunas da cabeça do cervo. O cervo dá dois passos e se curva para Katilda: um suplicante diante de um estranho soberano. “Mas vamos deixar isso de lado por enquanto. Minhas respostas para você são tão claras quanto a floresta ao seu redor e as batidas do seu coração humano.”
Rajado está batendo o rabo contra a terra. Arlinn também não está se sentindo muito paciente. Esta bruxa, essa tal de Katilda – qual o problema dessas pessoas que ficam enrolando as coisas? “Você poderia deixá-las um pouco mais claras?” ela diz. “Minha visão não é o que costumava ser.”
A bruxa encosta o cajado na cabeça do cervo. Dela, surge uma coroa de ramos e flores. “Existe um ritual específico para isso.”
Arlinn não assiste o cervo fugir – ela mantém os olhos em Katilda. “Se há alguma coisa que eu aprendi, é que os rituais nunca são fáceis.”
“É aí que reside o poder deles – um ritual centraliza a comunidade e suas tradições. Com o tempo, centenas adicionam sua fé ao seu poder, superando em muito qualquer coisa que um único mago possa sonhar em fazer,” diz Katilda. “O Arcanjo nos distraiu dessas tradições. Devemos voltar a elas – para a Colheita.”
Avacyn não distraiu ninguém de nada – mas agora não é o momento para aquela discussão. Não importa o quanto ela queimava no peito de Arlinn. “Colheita? Como nas lendas?”
“Exatamente,” responde Katilda.
“Chá picante e tortas?” diz Arlinn. O fogo ficava mais quente. Como uma sacerdotisa avacyniana, Arlinn sabia bem quão forte fora a proteção do Arcanjo. “Como é que eles vão nos salvar?”
“A Colheita é mais do que isso,” ela diz. “O sol e a lua têm sua vez no céu. A Colheita é a vez da humanidade – nossa celebração por viver mais um ano em resistência. Por muito tempo vivemos com medo, por muito tempo contamos com forças externas para nos salvar. Devemos salvar uns aos outros. Quando nos reunirmos-”
“Espere,” diz Arlinn, erguendo as mãos. “Você está planejando reunir quantas pessoas?”
“Todas que quiserem vir,” diz Katilda, com toda a paciência de um padre de aldeia. “Juntos nós podemos aproveitar nossa força coletiva sob o Celestus e, por meio dele, restaurar o equilíbrio.”
Arlinn balança a cabeça, irrompendo seu desespero. “É melhor enviar uma carta a cada perseguidor noturno de Innistrad. Colocar tantos humanos em um só lugar é implorar por um ataque. Nós já vimos morte suficiente; não precisamos arriscar mais vidas por alguma lenda que você leu em um livro por aí-”
“Não li em um livro,” responde Katilda. Agora ela também ficou incisiva, ficando de pé no tronco. Para surpresa de Arlinn, ela é uma mulher imponente – robusta como os carvalhos que ela elogiava. Um leve cheiro de marga atinge o nariz de Arlinn – mas não faz sentido. Katilda não é um carniçal. “Haverá proteções, Arlinn Kord. Guardiões, que agora podem trocar o que aprenderam fugindo para o escuro. Você quer trazer de volta a aurora? Tudo bem. Mas você não pode fazer isso sem trazer de volta a esperança que perdemos.”
Presa Vermelha rosna. Rajado também. Seus desconfortos ecoam no peito de Arlinn: não tem como isso acabar bem. No entanto, enquanto ela encara a velha bruxa, não há sinal de pausa.
“Você nem mesmo me disse como funciona esse ritual,” Arlinn disse, “presumindo que todos não morreremos primeiro.”
“Nós?” responde a bruxa – mas ela não se detém na farpa. Em vez disso, ela aponta com seu cajado para o arco do Celestus. “A resposta, como eu lhe disse, está bem aqui. Usamos o Celestus. Em seu centro está uma fechadura de ouro brilhante – precisamos da Chave de Prata Lunar para ativá-la. Você nunca se perguntou para que ele serve? Nossos ancestrais o usaram exatamente para isso – corrigir o equilíbrio do dia e da noite.”
“Nas Florestas de Kessig, cercados pelo inimigo.”
“Sim. Para atiçar as chamas-”
-da Esperança,” interrompe Arlinn. “E se não fizermos isso? Se encontrarmos outra maneira-”
“Não há outra maneira,” Katilda diz, com a mesma firmeza. “Se o Celestus não for ativado – e se não for ativado corretamente – então a noite ultrapassará o dia. Geists, carniçais, vampiros, lobisomens – vocês vão se banquetear de nós até-”
“Eu não-”
Mas um som cortando a floresta interrompe a voz em sua garganta. Um uivo, áspero e profundo. Um som que acende o lobo dentro dela. Sua matilha responde, e ela pode sentir sua alegria, sentir sua ânsia pela caçada.
Pois ela conhece bem aquele uivo. Ela o ouviu pela primeira vez anos atrás, aninhada em seu quarto, encarando o símbolo que deveria mantê-la segura. E ela havia sido arrancada da casa de sua família, pés e mãos na terra úmida da meia-noite, correndo em direção a ela com tudo o que tinha – porque falava de um mundo destemido.
A primeira vez que ela ouviu aquele uivo foi há vinte anos – a primeira noite em que ela sentiu o gosto de sangue, a primeira noite em que ela experimentou a liberdade.
Ainda a atiça, mesmo agora.
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